André Botelho (UFRJ)
Eneida Maria de Souza (UFMG)
Mariana Chaguri (Unicamp)
Maurício Hoelz (UFRRJ)
Pedro Meira Monteiro (Princeton University)
MinasMundo: o cosmopolitismo na cultura brasileira é uma rede em expansão de cooperação de cerca de cinquenta pesquisadoras e pesquisadores de diferentes instituições, áreas de formação e atuação acadêmica nucleada em cinco universidades: a UFRJ, a UFMG, a Universidade Princeton, a Unicamp e a UFRRJ. Constituída tendo em vista as comemorações do centenário da Semana de Arte Moderna em 2022, a rede propõe uma revisão dos sentidos do modernismo e dos seus legados na cultura brasileira.
Dialogando com críticas contemporâneas sobre o processo de nacionalização da cultura brasileira operado no século XX e as violências simbólicas e sociais aí implicadas, refletimos sobre o papel controverso do modernismo como repertório simbólico hegemônico na definição de condutas, sentimentos, imaginações e linguagens que seguem nos atravessando hoje.
Pretendemos, ainda, rever a questão do localismo/cosmopolitismo da cultura brasileira que vem informando modos específicos de ler a diferença cultural, e por meio dos quais artistas, intelectuais e agentes públicos organizaram práticas discursivas, institucionais, culturais e políticas que ajudaram a modular algumas das mais persistentes linhas de interpretação sobre o Brasil e seus dilemas.
Trata-se, assim, de provocar e chegar a uma nova compreensão do sentido do cosmopolitismo na cultura brasileira. Provisoriamente, estamos entendendo cosmopolitismo como o tipo de relação descentrada de convivência com o universal a partir da diferença local, que implica movimentos e aberturas em várias direções.
E por que Minas Gerais? Há vários indícios empíricos de que o cosmopolitismo não apenas se faz presente, como é crucial na definição de sentido nas culturas mineiras. Desde o gesto de Cláudio Manuel da Costa de fazer as musas árcades banharem-se no ribeirão do Carmo, que não precisa ser lido como protótipo de uma “comédia ideológica”, mas de uma experiência cosmopolita da “repetição com diferença”; passando pela poesia de Carlos Drummond, a prosa de Guimarães Rosa, a poesia e as traduções de Henriqueta Lisboa, ou mesmo a prosa adolescente de Helena Morley; até a música popular de Milton Nascimento, que cantou “sou do mundo, sou Minas Gerais” (de onde afinal retiramos o título do projeto). E sem esquecer a importante experiência migratória dos mineiros pelo Brasil e pelo mundo, de suas ciências sociais tão marcadas pela linguagem universalista matemática; de sua impressionante inovação museológica, de que Inhotim é apenas um dos melhores exemplos mais recentes; da racionalidade política de state-makers como Francisco Campos; do cosmopolitismo de suas rebeliões, como a Inconfidência mineira e a linguagem republicana que nela ganha corpo; da problemática inserção negra no quadro da cultura visual nas fotos de Chichico Alkmin; do planejamento urbano de sua atual capital e do próprio Barroco com seus ícones notáveis como Aleijadinho etc.
Mas por que destacar um caso mineiro de um brasileiro? Por certo, a questão é parte dos problemas a que somente as pesquisas da rede poderão responder. Ao distinguir um caso mineiro, porém, não temos em vista produzir um essencialismo, e sim, antes, questionar o paradigma da identidade nacional que domesticou, homogeneizando-a, a própria compreensão da formação da sociedade brasileira. Um questionamento tanto por “dentro”, uma vez que promoverá reconhecimento das diferenças “internas” no Brasil, quanto por “fora”, explorando suas articulações “externas”. Minas, mundo; Minas-mundo. Trazer à tona a questão do cosmopolitismo na cultura permite problematizar a própria ideia de “origem” por meio da afirmação da diferença como reescritura, suplemento, repetição deslocada no espaço e no tempo.
Trabalhar a categoria cosmopolitismo é urgente tanto do ponto de vista teórico, quanto político. Afinal, vivemos um momento de recrudescimento dos nacionalismos e das fronteiras nacionais na geopolítica acompanhado da constatação de que a chamada mundialização da cultura não parece estar, de fato, gerando relações exatamente multicêntricas ou mais equitativas, apesar da intensificação de trocas de todos os tipos garantidas pelos desenvolvimentos tecnológicos. Também na cultura persiste uma geopolítica com relações e trocas assimétricas que recria hierarquias de vários tipos.
O cosmopolitismo é, em suma, antes uma perspectiva a partir da qual se fala, e não apenas um tema sobre o qual se pode dizer algo. É essa ideia mestra que define as (maquin)ações coletivas da rede Minas Mundo que consistirão, principalmente, na realização de pesquisa acadêmica e comunicação pública da ciência, como seminários, exposições e publicações, bem como em ações artísticas, de memória e documentação. Até 2024, o ano-chave do modernismo visto desde as Minas Gerais, esperamos colocar o cosmopolitismo nas, a partir das, com as e até mesmo contra as Minas em debate acadêmico e público.
André Botelho (UFRJ)
Eneida Maria de Souza (UFMG)
Mariana Chaguri (Unicamp)
Maurício Hoelz (UFRRJ)
Pedro Meira Monteiro (Princeton University)