Skip to main content
Pessoas

Futuro do passado: modernismo e anacronia

Victor da Rosa

Futuro do passado: modernismo e anacronia

A respeito da célebre viagem dos modernistas às cidades históricas mineiras em 1924, Brito Broca se questiona como é possível que os nossos “homens do futuro”, ao receber um poeta de vanguarda em visita ao país, vão mostrar a ele justamente as velhas cidades mineiras, com suas igrejas do século XVIII, seus casarões coloniais e imperiais, uma “paisagem tristonha, onde tudo é evocação do passado” e onde tudo sugere ruínas? Se tal viagem, nesse sentido, parece um contrassenso, e não deixa de ser a seu modo, o historiador argumenta que havia uma espécie de lógica interior no caso, afinal a paisagem barroca de Minas surgia aos olhos dos modernistas “como qualquer coisa de novo e original, dentro, portanto, do quadro de novidade e originalidade que eles procuravam”. Mais do que isso, porém, tal “atitude paradoxal dos viajantes” talvez possa também abrir, ou ao menos sugerir, a possibilidade de conceber de uma nova maneira o problema do tempo no interior do modernismo brasileiro, não exatamente como ruptura, e sim como anacronismo, dinâmica singular em que distintas temporalidades convivem no mesmo lugar.

Daí que, a partir da intuição de Brito Broca,  a presente pesquisa tome o conceito de anacronismo tal qual elaborado por Georges Didi-Huberman para compreender não só a viagem dos modernistas a Minas, mas também outros momentos-chave do período: a noção de “bárbaro tecnicizado”, as técnicas de montagem oswaldianas, o profundo e genuíno interesse de Mário de Andrade pela tradição misturado a uma imaginação do futuro e finalmente a própria Semana de Arte Moderna, evento em que as experiências mais vanguardistas e passadistas conviveram de formas distintas e variadas. Nessa pequena história anacrônica do modernismo brasileiro, talvez a viagem a Minas seja um momento decisivo – eis uma hipótese – quando se reconhece que o futuro, na verdade, reside também na ruína, a exemplo dos casarões mal conservados de Ouro Preto, reconhecimento a que Oswald deu o nome de Pau Brasil, livro que em grande medida rearranja restos dos textos coloniais, e que provocou em Tarsila do Amaral o estranho desejo, naquele momento, em meio aos debates sobre a arte do futuro, de se dedicar à prática da conservação.

Leave a Reply

This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.