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Programação: Seminário “MinasMundo, Ouro Preto (2024-1924)”

Março 21, 2024

Programação: Seminário “MinasMundo, Ouro Preto (2024-1924)”

Programação: Seminário “MinasMundo, Ouro Preto (2024-1924)”

Rede composta, hoje, por mais de 70 pesquisadoras e pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento e de diversas instituições, no Brasil e no exterior, o MinasMundo se formou há quatro anos com alguns desafios de inovação da produção do conhecimento e da sua comunicação pública, como rediscutir o sentido cosmopolita que o modernismo também forjou, para além dos compromissos ideológicos em diferentes dimensões e em matizes políticos distintos, até mesmo antagônicos. Como uma viagem para o interior do Brasil o abre ao mundo – mais ainda, refunda a agenda estética e intelectual que mobilizará todo o século XX? Questões como original e cópia, centro e periferia, local e universal e dependência cultural não sairiam mais da pauta. Além da crítica à perspectiva eurocêntrica e esboços precários, com os recursos intelectuais e políticos disponíveis naquele tempo, de uma abordagem que hoje identificamos ao pós ou decolonial. A geopolítica do conhecimento – científico ou artístico – está aí para, infelizmente, não nos desmentir. Apesar das promessas de um mundo policêntrico, hierarquias e desigualdades duráveis persistem também no campo da cultura. Temos olhado, novamente, muito para “dentro”, mobilizados que estamos pelas lutas por reconhecimento, subalternidades e políticas de identidades. Tudo isso é sem dúvida premente, nossa dívida enquanto sociedade e Estado-nação com maiorias minorizadas é imensa. E não pode ficar mais pendurada, no fiado. Mas, até mesmo para enfrentá-la, é preciso uma perspectiva mais macro, a um só tempo política e academicamente inovadora, do processo social e suas interdependências, desafios e impasses em escala global, a começar pelo próprio capitalismo, sistema de produção e reprodução de desigualdades inimagináveis. Cosmopolita não é o modernista que viajou para Paris ou para Ouro Preto, mas aquele que entendeu e reorientou sua conduta em relação à diferença, ao outro. Aqueles e aquelas que criaram e criam ramais e caminhos de comunicação democrática. São muitos os deslocamentos estéticos, intelectuais, sociais e políticos que qualquer viagem, qualquer uma delas mesmo, mesmo ao redor de um livro, permite. E exige. Um gesto ritual: voltar a Ouro Preto cem anos depois de Mário, Oswald, Tarsila e outros modernistas para redescobrir um Brasil que não é uma cópia malfeita da Europa, nem por isso uma constelação autêntica. O “entre-lugar” em que estamos como sociedade há mais de 500 anos é um lugar político e não nos permite, simplesmente, ignorar esse legado. Ele o exige e muito mais: a lutar por outros legados que nos constituem sem, porém, contar com a providência e o conforto ontológico de uma “unidade” ou “pureza”, como nos tem ensinado também Silviano Santiago, esse carioca do mundo, nascido em Minas e uma das inspirações do MinasMundo. Cosmopolitismo: perigo por todos os lados.

MinasMundo, Ouro Preto (2024-1924) é uma parceria do projeto MinasMundo e da Prefeitura Municipal de Ouro Preto.

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O Leão de Essa, de Aleijadinho, Antônio Francisco Lisboa, criatura indefinida que mistura relatos de um escravizado africano e a circulação material dos milenares Cães de Fó chineses no império transatlântico luso; a escultura de Ulisses Pereira Chaves e as volutas várias que adotamos desde o início do nosso projeto expressam o MinasMundo em seu seminário de encerramento. Joana Lavôr, artista residente, imaginou ainda, numa fita verde, como que um filme com alguns momentos da nossa trajetória de 4 anos em movimento: a vizinhança de Nossa Senhora do Ó, em Sabará; os desenhos de Tarsila do Amaral na viagem de 1924; e o Atlante, também do Aleijadinho, também de Sabará, que sustenta o mundo e a nós. A paleta de cores está mais clara; as técnicas são muitas. Muitas também as texturas. Camadas e camadas de perguntas que a estética nos ajuda a deixar inacabadas.

Agradecimentos: Pesquisadoras e pesquisadores do MM; assistentes de pesquisa: João Mello, Rennan Pimentel e Lucas van Hombeeck. Prefeito Angelo Oswaldo de Araújo Santos, Secretário de Cultura Flavio Malta, Alex Sandro Calheiros de Moura (Museu da Inconfidência), Wanalyse Emery (Casa Guignard) e Kéle Cristina Coelho. Carlos Augusto Calil, Conceição Evaristo, Elisa Pereira Reis, Inés de Torres, Júnia Furtado, Leda Maria Martins, Mario Cámara, Paulo Nazareth, Ricardo Aleixo, Rubem Barboza Filho e Silviano Santiago. CAPES, CNPq, Prefeitura Muncipal de Ouro Preto, Faperj, Fapemig, PPGSA/IFCS/UFRJ, PPGH/UFMG, PPGAC/UFPOP.

André Botelho, Mariana Chaguri, Maurício Hoelz, Pedro Meira Monteiro e Wander Melo Miranda – coordenadores do MinasMundo

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Programação | MinasMundo, Ouro Preto (2024-1924)

1º dia – 25 de março (Segunda-feira)

10h00 Abertura oficial | Local: Casa da Ópera

Ângelo Oswaldo de Araújo Santos – Prefeito de Ouro Preto

Wander Melo Miranda (UFMG e Coordenação do projeto MinasMundo)

10h30  Miragens e redescobrimentos do Brasil | Local: Casa da Ópera

Lilia Moritz Schwarcz (Princeton)

Ângelo Oswaldo de Araújo Santos

Debate: André Botelho (UFRJ)

14h00  A viagem modernista de 1924: contextos e consequências | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

Elide Rugai Bastos (Unicamp)

Carlos Augusto Calil

Roberto Said (UFMG)

Maurício Hoelz (UFRRJ)

Debate: Victor da Rosa (UFOP)

Coordenação: Andrea Borges Leão (UFC)

17h00 Filme: “Acaba de chegar ao Brasil o bello poeta francez Blaise Cendrars” (47 min) | Conversa com o diretor Carlos Augusto Callil (USP) | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

Mediação: Pedro Meira Monteiro (Princeton)

 

2º dia – 26 de março (Terça-feira)

10h00 Minas e os mundos | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

Elisa Reis (UFRJ)

Júnia Furtado (UFMG)

Wander Melo Miranda (UFMG)

Ricardo Aleixo (UFBA)

Debate: José Newton Meneses (UFMG)

Coordenação: Celi Scalon (UFRJ)

14h00  Duas exposições em Ouro Preto | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

Romulo Pinheiro (Instituto Peck Pinheiro)

Edilson Pereira (ECO-UFRJ)

Mediação: Sabrina Parracho Sant’Anna (UFRRJ)

15h00  Minas, volutas, movimentos | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

Inés de Torres (Universidad de la Republica/Uruguay)

Joana Tavares (Unirio)

Andre Bittencourt (UFRJ) & Daniela Giovanna Siqueira (UFMT)

Manaíra Aires Athayde (University of California, Santa Barbara).

Debate: Myriam Ávila (UFMG)

Coordenação: Enio Passiani (UFRGS)

17h30 Cachaça e literatura, com Maurício Ayer | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

18h00 Lançamento do Glossário MinasMundo | Roda de conversa com pesquisadores e pesquisadores do projeto MinasMundo | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

 

3º dia – 27 de março (Quarta-feira)

 

11h00 Sessão especial com Paulo Nazareth | Local: Casa da Ópera

Conversa com Maria Angelica Melendi (UFMG)

Mediação: Denilson Lopes (UFRJ)

14h00  Cosmopolitismo: palavra perigo | Local: Auditório do Museu da Inconfidência

Mario Cámara (Universidad Nacional de las Artes/Argentina)

Rubem Barboza (UFJF)

Pedro Meira Monteiro (Princeton)

Heloisa Starling (UFMG)

Debate: Rodrigo Jorge Ribeiro Neves

Coordenação: João Pombo Barile (Suplemento Minas Gerais)

17h00 Encerramento. Cosmpoltícas: conversa com Conceição Evaristo e Silviano Santiago | Local: Casa da Ópera

Mediação: Leda Maria Martins (UFMG)

Minicursos MinasMundo – Casa Guignard (programação paralela)

1º dia – 25 de março (Segunda-feira)

14h00  | Mulheres mineiras e feminismos

Mariana Chaguri (Unicamp)

Rita Lages (UFMG)

2º dia – 26 de março (Terça-feira)

14h00 | Sou do mundo, sou Minas Gerais: Milton Nascimento

Bruno Viveiros Martins (Estácio-BH)

3º dia – 27 de março (Quarta-feira)

10h00 | No direction home: poesia e viagem, no modernismo e depois

Emílio Maciel (UFOP)

Rafael Lovisi Prado

14h00 | Guignard entre modernistas

Eduardo Dimitrov (UnB)

 

O cartaz do seminário é de autoria da artista Joana Lavôr

MinasMundo: casi un manifiesto

MinasMundo: casi un manifiesto

MinasMundo: el cosmopolitismo en la cultura brasileña es una red de cooperación en expansión de alrededor de cincuenta investigadores e investigadores de diferentes instituciones, áreas de formación y actividades académicas basada en cinco universidades: la Universidad Federal de Río de Janeiro (UFRJ), la Universidad Federal de Minas Gerais (UFMG), Princeton University, Unicamp y la Universidad Federal Rural de Río de Janeiro (UFRRJ). Creada con motivo de las celebraciones del centenario de la Semana de Arte Moderno, en 2022, la red propone una revisión de los significados del modernismo y sus legados en la cultura brasileña.

Manteniendo un diálogo con críticas contemporáneas sobre el proceso de nacionalización de la cultura brasileña llevado a cabo en el siglo XX y la violencia simbólica y social que implicó, reflexionamos sobre el papel controvertido del modernismo como repertorio simbólico hegemónico en la definición de conductas, sentimientos, imaginaciones y lenguajes que siguen vigentes hoy en día.

También pretendemos rever la cuestión del localismo/cosmopolitismo de la cultura brasileña que viene influenciando formas específicas de leer la diferencia cultural, y mediante la cual artistas, intelectuales y agentes públicos organizaron prácticas discursivas, institucionales, culturales y políticas que ayudaron a modular algunas de las líneas de interpretación más persistentes sobre Brasil y sus dilemas.

Se trata, por lo tanto, de provocar y alcanzar una nueva comprensión del significado del cosmopolitismo en la cultura brasileña. Entendemos provisionalmente el cosmopolitismo como el tipo de relación descentrada de la convivencia con el mundo a partir de la diferencia local, que implica movimientos y aperturas en diversas direcciones.

¿Y por qué Minas Gerais? Hay muchos indicios empíricos de que el cosmopolitismo no solo está presente, sino que incluso es crucial en la definición de sentido en las culturas de Minas Gerais. Desde el gesto de Cláudio Manuel da Costa de hacer que las musas arcadias se bañasen en el riacho do Carmo, que no tiene por qué interpretarse como un prototipo de “comedia ideológica”, sino más bien como una experiencia cosmopolita de “repetición con diferencia”; pasando por la poesía de Carlos Drummond, la prosa de Guimarães Rosa, la poesía y las traducciones de Henriqueta Lisboa, o incluso la prosa adolescente de Helena Morley; hasta la música popular de Milton Nascimento, que cantó “Sou do mundo, sou de Minas Gerais” (de donde, finalmente, se inspira el título del proyecto). Y sin olvidar la importante experiencia migratoria de los mineiros en Brasil y por todo el mundo, sus ciencias sociales tan marcadas por el lenguaje matemático universalista; su impresionante innovación museológica, de la cual Inhotim es solamente uno de los mejores ejemplos recientes; la racionalidad política de state makers como Francisco Campos; el cosmopolitismo de sus rebeliones, como la Inconfidência Mineira y el lenguaje republicano que se gesta en ella; la problemática inserción de los negros en el marco de la cultura visual en las fotos de Chichico Alkmin; el urbanismo de su capital actual y del propio Barroco, con sus íconos notables, como Aleijadinho etc.

Pero ¿por qué diferenciar el caso de Minas Gerais del caso brasileño? Por cierto, la pregunta es parte de los problemas que solo las investigaciones de la red podrán responder. Al distinguir un caso de Minas, sin embargo, no pretendemos producir un esencialismo, sino cuestionar el paradigma de la identidad nacional que domesticó la comprensión misma de la formación de la sociedad brasileña, homogeneizándola. Un cuestionamiento tanto por “dentro”, ya que promoverá el reconocimiento de las diferencias “internas” en Brasil, como por “fuera”, explorando sus articulaciones “externas”. Minas, mundo; Minas-mundo. Plantear el tema del cosmopolitismo en la cultura nos permite problematizar la idea misma de “origen” mediante la afirmación de la diferencia como reescritura, suplemento, repetición desplazada en el tiempo y en el espacio.

Trabajar en la categoría de cosmopolitismo es urgente, tanto desde el punto de vista teórico como político. Al fin y al cabo, vivimos un momento de recrudecimiento de los nacionalismos y las fronteras nacionales en la geopolítica, acompañado de la constatación de que la llamada mundialización de la cultura no parece, de hecho, generar relaciones precisamente multicéntricas o más equitativas, a pesar de la intensificación todo tipo de intercambios garantizados por los desarrollos tecnológicos. También en la cultura persiste una geopolítica con relaciones e intercambios asimétricos que recrean jerarquías de diversos tipos.

En suma, el cosmopolitismo es más una perspectiva desde la cual se habla, que simplemente un tema sobre el cual se puede decir algo. Esta es la idea maestra que define las maquinaciones/acciones colectivas de la Red MinasMundo, que consistirán, principalmente, en investigaciones académicas y comunicación pública de la ciencia, como seminarios, exposiciones y publicaciones, así como acciones artísticas, de memoria y documentación. Hasta 2024, el año clave del modernismo visto desde Minas Gerais, esperamos situar el cosmopolitismo en Minas, a partir de Minas, con Minas e incluso contra Minas en el debate académico y público.

André Botelho (UFRJ)
Eneida Maria de Souza (UFMG)
Mariana Chaguri (Unicamp)
Maurício Hoelz (UFRRJ)
Pedro Meira Monteiro (Princeton University)

Minas world: almost a manifesto

Minas world: almost a manifesto

Minas world: cosmopolitanism in Brazilian culture is an expanding network of cooperation involving around fifty researchers from diverse institutions, areas of academic training and work, centered on five universities: UFRJ, UFMG, Princeton University, Unicamp and UFRRJ. Constituted in anticipation of commemorations for the hundredth anniversary of Modern Art Week, set to be celebrated in 2022, the network proposes a review of the meanings of modernism and its legacies in Brazilian culture. 

Dialoguing with contemporary critiques of the nationalization of Brazilian culture in the twentieth century, along with the symbolic and social forms of violence implied in this process, we reflect on the controversial role of modernism as a hegemonic symbolic repertoire in the definition of conducts, feelings, imaginations and languages that continue to intersect us today

We also intend to revisit the question of the localism/cosmopolitanism of Brazilian culture that has been informing specific modes of reading cultural difference, and through which artists, intellectuals and public agents organized discursive, institutional, cultural and political practices that helped shape some of the most persistent interpretative approaches to Brazil and its dilemmas

The aim, therefore, is to provoke and attain a new understanding of the meaning of cosmopolitanism in Brazilian culture. Provisionally, we take cosmopolitanism as a decentered relation of conviviality with the universal based on local difference, an idea that implies movements and openings in various directions.

And why Minas Gerais? Various empirical signs tell us that cosmopolitanism is not just widely present in Minas Gerais’s cultures, it is crucial to defining their very meaning. From Cláudio Manuel da Costa’s gesture of making the Arcadian muses bathe in the Ribeirão do Carmo, which need not be read as a prototype of an “ideological comedy” but rather as a cosmopolitan experience of “repetition with difference,” passing through the poetry of Carlos Drummond, the prose of Guimarães Rosa, the poetry and translations of Henriqueta Lisboa, or even the adolescent prose of Helena Morley, to the popular music of Milton Nascimento, who sang “I’m from the world, I’m from Minas Gerais” (from which we take the name of the project). And without forgetting the important migratory experience of Mineiros within Brazil and throughout the world, its social sciences so heavily marked by the universal language of mathematics, its impressive museological innovations of which Inhotim is just one of the best most recent examples, the political rationality of state-makers like Francisco Campos, the cosmopolitanism of its rebellions like the Inconfidência Mineira and the Republican language that took shape within it, the problematic insertion of the black presence in the visual culture manifested in the photos of Chichico Alkmin, the urban planning of its current capital, and the Baroque period itself with its notable icons like Aleijadinho and so on.

But why emphasize a Minas case over a Brazilian one? Certainly the question is among the problems that only networked research can answer. In distinguishing a Minas case, though, we do not intend to produce an essentialism, but rather question the paradigm of national identity that domesticated it, homogenizing it, the very comprehension of the formation of Brazilian society. A questioning from both “inside,” since it will promote recognition of the differences “internal” to Brazil, and “outside,” exploring its “external” articulations. Minas, world; Minas-world. Highlighting the question of cosmopolitanism in culture enables a problematization of the very idea of “origin” through the affirmation of difference as rewriting, supplement, a repetition dislocated in space and time.

Reworking the category of cosmopolitanism is an urgent task both theoretically and politically. After all, we are living through a moment of regrowth in nationalisms and national borders in geopolitics, accompanied by the observation that the so-called globalization of culture does not, in fact, seem to be generating multicentric or more equitable relations, despite the intensification of exchanges of all kinds enabled by technological developments. In culture too there persists a geopolitics with asymmetric relations and exchanges that recreates various types of hierarchies. 

Cosmopolitanism is, in sum, a perspective from which one speaks, not just a theme about which one may say something. It is this master idea that defines the collective actions and machinations of the Minas World network, which will consist, primarily, of academic research and the public communication of science, including seminars, exhibitions and publications, as well as actions involving art, memory and documentation. By 2024, the key year of modernism as seen from Minas Gerais, we hope to put cosmopolitanism in, through, with and even against Minas in an academic and public debate.

André Botelho (UFRJ)
Eneida Maria de Souza (UFMG)
Mariana Chaguri (Unicamp)
Maurício Hoelz (UFRRJ)
Pedro Meira Monteiro (Princeton University)

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

José Newton Meneses

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

A série compreende discussões sobre a História de Minas Gerais no período colonial. Debatem-se perspectivas críticas a certa tradição de interpretar a Minas Gerais colonial como um espaço social caótico, lábil e centrado em uma economia mineradora exclusiva e progressivamente decadente. Desde os anos 1970, estudos historiográficos mostram uma enorme multiplicidade sociocultural, da população e da economia mineira. São análises que veem essa economia como diversificada e aberta, em uma sociedade de sertão-encruzilhada, questionando as narrativas da decadência.

Izabel Missagia de Mattos (UFRRJ), Moacir Maia (NPHED/UFMG) e Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti (UFRJ)

Junia Ferreira Furtado (UFMG), Carla Maria Carvalho de Almeida (UFJF) e Elide Rugai Bastos (Unicamp)

Ângelo Carrara (UFJF), Francisco Eduardo Andrade (UFOP) e José Newton C. Meneses (UFMG)

Rodrigo Almeida Bastos (UFSC), Sérgio Alcides (UFMG) e Sabrina Parracho Sant’Anna (UFRRJ)

Laura de Mello e Souza (USP e Sorbonne) e Lorena Fleury (UFRGS)

Imagens de Minas Gerais entre os séculos XVIII e XX

Talles Luiz de Faria e Sales

Imagens de Minas Gerais entre os séculos XVIII e XX

A proposta procura analisar a genealogia e o funcionamento poético de imagens recorrentes na literatura brasileira, com ênfase nas representações de Minas Gerais, tendo em vista que as primeiras imagens do Brasil são apresentadas por viajantes estrangeiros que têm como referente a comparação com os espaços europeus, do que decorre uma clivagem ambígua a ser enfrentada pelos escritores brasileiros que procuram descrever a natureza, os sujeitos e a sociedade brasileira formados a partir da feitura do Brasil como empreendimento colonial, do que deriva uma “discrepância”, em termos hegelianos, modulada reiteradamente ao longo da história cultural e intelectual brasileira, nas perspectivas pelas quais se procura perceber o país e o povo novo que se forma a partir dele. Desse modo, procede-se especialmente a um diálogo com a obra de Sérgio Buarque de Holanda, naquilo que enfatiza acerca das imagens do Brasil e do tema do desterro na própria terra com relação à experiência brasileira, bem como com a obra de Darcy Ribeiro, por sua teoria original sobre o caso brasileiro e pela resposta que oferece a tais impasses através do realce que confere à mestiçagem na formação do brasileiro como um povo novo. De modo a circunscrever o corpus de análise, optou-se pela abordagem da literatura produzida a partir do estado de Minas Gerais entre os séculos XVIII e XX, delineando um arco de longa duração que compreende uma geopoética do território mineiro ao partir dos mitos e lendas configuradores da geografia imaginativa dos “sertões ocidentais”, passando pelas primeiras obras escritas no século XVIII, como as de Antonil e Nuno Marques Pereira, pela poesia de Cláudio Manuel da Costa, pelos relatos dos viajantes científicos europeus que visitaram e pesquisaram o território de Minas Gerais nas primeiras décadas do século XIX, até a independência política brasileira e as produções literárias que se lhe seguem, como as de Bernardo Guimarães, Helena Morley, Cornélio Penna, Carlos Drummond de Andrade, Cyro dos Anjos, João Guimarães Rosa, dentre outros que, e evidentemente não de forma exaustiva, entretêm um diálogo literário acerca da configuração geopoética mineira. Dada a imersão a um só tempo geopoética e imagética da proposta, as formulações de Didi-Huberman acerca da forma do atlas em Aby Warburg possuem também função de destaque, bem como são operatórios conceitos mobilizados das obras de Walter Benjamin, Ernst Bloch, György Lukács, dentre outros, de modo a se observar em que medida as visões do Brasil por seus próprios escritores nacionais são consonantes e/ou dissonantes das visões estrangeiras a respeito deste mesmo país, aproximando-se e/ou desassociando-se de um teor imagológico, ao mesmo tempo em que formulam estratégias e mecanismos linguísticos e literários para tal.

Futuro do passado: modernismo e anacronia

Victor da Rosa

Futuro do passado: modernismo e anacronia

A respeito da célebre viagem dos modernistas às cidades históricas mineiras em 1924, Brito Broca se questiona como é possível que os nossos “homens do futuro”, ao receber um poeta de vanguarda em visita ao país, vão mostrar a ele justamente as velhas cidades mineiras, com suas igrejas do século XVIII, seus casarões coloniais e imperiais, uma “paisagem tristonha, onde tudo é evocação do passado” e onde tudo sugere ruínas? Se tal viagem, nesse sentido, parece um contrassenso, e não deixa de ser a seu modo, o historiador argumenta que havia uma espécie de lógica interior no caso, afinal a paisagem barroca de Minas surgia aos olhos dos modernistas “como qualquer coisa de novo e original, dentro, portanto, do quadro de novidade e originalidade que eles procuravam”. Mais do que isso, porém, tal “atitude paradoxal dos viajantes” talvez possa também abrir, ou ao menos sugerir, a possibilidade de conceber de uma nova maneira o problema do tempo no interior do modernismo brasileiro, não exatamente como ruptura, e sim como anacronismo, dinâmica singular em que distintas temporalidades convivem no mesmo lugar.

Daí que, a partir da intuição de Brito Broca,  a presente pesquisa tome o conceito de anacronismo tal qual elaborado por Georges Didi-Huberman para compreender não só a viagem dos modernistas a Minas, mas também outros momentos-chave do período: a noção de “bárbaro tecnicizado”, as técnicas de montagem oswaldianas, o profundo e genuíno interesse de Mário de Andrade pela tradição misturado a uma imaginação do futuro e finalmente a própria Semana de Arte Moderna, evento em que as experiências mais vanguardistas e passadistas conviveram de formas distintas e variadas. Nessa pequena história anacrônica do modernismo brasileiro, talvez a viagem a Minas seja um momento decisivo – eis uma hipótese – quando se reconhece que o futuro, na verdade, reside também na ruína, a exemplo dos casarões mal conservados de Ouro Preto, reconhecimento a que Oswald deu o nome de Pau Brasil, livro que em grande medida rearranja restos dos textos coloniais, e que provocou em Tarsila do Amaral o estranho desejo, naquele momento, em meio aos debates sobre a arte do futuro, de se dedicar à prática da conservação.

Dimensões e nomeações do Moderno nas Artes Visuais em Belo Horizonte nas primeiras décadas do século XX: mulheres artistas na cidade

Rita Lages Rodrigues

Dimensões e nomeações do Moderno nas Artes Visuais em Belo Horizonte nas primeiras décadas do século XX: mulheres artistas na cidade

Drummond, em seu poema As moças da Escola de Aperfeiçoamento, versa sobre a mudança nos ares da cidade nos anos 1930 trazida pela presença das modernas professorinhas oriundas de cidades do interior de Minas, a partir do projeto da Nova Escola efetivado pelo governo mineiro: “E são assim tão modernas/tão chegadas de Paris/par le dernier bateau”. A presença feminina moderna vem, também, do interior. Do interior de Minas trazem Paris. A pesquisa aqui apresentada busca analisar a presença de artistas mulheres na cidade de Belo Horizonte nas primeiras décadas da capital de Minas, perscrutando as dimensões presentes nos usos do adjetivo Moderno, como em  Arte Moderna, Cidade Moderna, dentre outros. Duas artistas são escolhidas como ponto de partida da reflexão: Zina Aita, belorizontina de nascimento, responsável pela primeira exposição de arte moderna na cidade em 1920 e participante da Semana de Arte Moderna de 1922, e Jeanne Louise Milde, que vem para Belo Horizonte em 1929 inserida no projeto de modernização de ensino, baseado na Escola Nova, proposto por Francisco Campos.

A presença destas duas mulheres, assim como a das jovens professoras apresentadas por Drummond, aponta novos caminhos para a existência feminina no espaço urbano, um espaço que se pretende moderno, cosmopolita, e dialeticamente mostra-se também repleto de tradições e de conservadorismos. Uma dimensão fundamental da pesquisa proposta é a análise das nomeações do que seria o moderno em Belo Horizonte. Seja na autonomeação da artista Jeanne Milde como “moderna, mas com uma base clássica”, seja na nomeação nas décadas aqui analisadas, seja nas nomeações a posteriori realizadas por estudiosos ao tratarem a exposição de Aita como sendo a primeira exposição de Arte Moderna na capital. O trânsito de pessoas, o trânsito de mulheres artistas entre o Brasil e a Europa, carrega a dimensão do moderno/cosmopolita em múltiplas direções. Assim, o objetivo da pesquisa é realizar um estudo sobre a presença feminina nas artes visuais da cidade de Belo Horizonte sob a chave do moderno, da modernidade, dos modernismos, pretensamente universais, do cosmopolitismo e ao mesmo tempo do significado local dado à palavra moderno pelos habitantes da urbe de 1900 a 1930. 

Corpos femininos no espaço da cidade, ocupando novas funções profissionais e transitando pelas ruas, trariam esta dimensão cosmopolita para o tecido urbano? A partir da pesquisa realizada em jornais publicados em Belo Horizonte de 1900 a 1930, busca-se o significado de moderno naquele momento. Estas duas personagens, mesmo que não tragam na totalidade de suas obras a marca do modernismo das vanguardas artísticas do início do século, como é o caso da produção de Jeanne Milde, trariam em si, em suas presenças, a marca do moderno.

O intercâmbio literário entre Minas, São Paulo e Rio de Janeiro nos anos 60, na correspondência de Maria Lysia Corrêa de Araújo

Myriam Ávila

O intercâmbio literário entre Minas, São Paulo e Rio de Janeiro nos anos 60, na correspondência de Maria Lysia Corrêa de Araújo

A escritora Maria Lysia Corrêa de Araújo (1922-2012), autora de Em silêncio (contos – prêmios Fernando Chinaglia e Adelino Magalhães, Sec. de Cultura RJ, 1974), Um tempo (novela, 1985), além de livros infantis e infanto-juvenis, é desconhecida de grande parte dos estudiosos da literatura no Brasil de hoje, apesar de ter obtido algum relevo na cena literária brasileira nos anos 70 e 80 do século passado e integrar o Dicionário crítico de escritoras brasileiras, organizado por Nelly Novaes Coelho, além da antologia Escritoras de ontem e de hoje, organizado, entre outras, por Constância Lima Duarte. O interesse mais amplo da pesquisa proposta passa menos pela ficção de Maria Lysia que por sua trajetória como postulante a escritora nos anos 60, período em que conviveu com alguns dos maiores nomes da cultura e da literatura brasileiras em São Paulo e no Rio de Janeiro, cidades onde viveu e trabalhou no serviço público federal, tendo como atividade colateral o teatro.  Formada pela Escola de Arte Dramática de São Paulo, fundada por Alfredo Mesquita, Maria Lysia teve como colegas de escola ou de palco alguns dos principais atores e dramaturgos brasileiros, como Plínio Marcos, Aracy Balabanian, Maria della Costa, Sérgio Cardoso, entre outros.  Trabalhou, entre outros, sob a direção de Henriette Morineau e José Celso Martinez Corrêa. No cinema, participou do filme São Paulo Sociedade Anônima, de Luís Sérgio Person, um ícone da cinematografia brasileira. Conheceu e foi amiga dos escritores Lígia Fagundes Telles e Carlos Drummond de Andrade. Com este último, teria mantido correspondência ainda não localizada. 

A abordagem assenta-se no interesse acadêmico em conhecer e interpretar uma década, a de 1960, de grande agitação e mudanças na história do Brasil e da sociedade brasileira. Culminando com os eventos de 1968, data marcante não só em nosso país, mas na Europa e Estados Unidos, a década de 60 trouxe novas perspectivas sociais e políticas, com destaque para a industrialização do país, a metropolização das cidades e a crescente importância do transporte aéreo. Nas artes, os avanços incluíam a arquitetura de Niemayer, a introdução de uma nova dramaturgia nos palcos e na recém criada televisão, a bossa nova e seus corolários na música popular, a consolidação de uma literatura de contornos inéditos, com Guimarães Rosa, Clarice Lispector e o sempre novo Carlos Drummond.  

Maria Lysia escolheu ter uma vida literária em São Paulo e Rio de Janeiro durante os anos 1960. Extrovertida e receptiva a críticas e conselhos dos pares, movimentou-se bem pelas duas capitais, como mostram as cartas, registros em que as condições e aspectos dessa movimentação pela cena cultural daquela década se revelam em cores vivas.

Poéticas dos corpos nas dramaturgias e nas cenas pretas

Marcos Alexandre

Poéticas dos corpos nas dramaturgias e nas cenas pretas

A proposta é um dos desdobramentos de meu projeto de pesquisa Poéticas dos corpos: encruzilhadas, identidades, memórias, movências na arte e na literatura fomentado com a bolsa de produtivamente do CNPq. O desenvolvimento da proposta me permitirá dar continuidade ao tema da investigação que venho realizando em relação às poéticas pretas no tocante às diversas formas de representação e de representatividade das personagens/personas estudadas e analisadas em obras de autores da literatura brasileira e latino-americana, mas, aqui, nesta proposta, enfatizando as áreas artísticas, por meio das práticas performáticas, focalizando, principalmente, os teatros negros desenvolvidos em Belo Horizonte e em alguns centros urbanos brasileiros. A proposta visa a contribuir, a partir de abordagens comparativas, para os estudos relacionados com as práticas das Alteridades em suas relações com o Outro, tendo as “poéticas dos corpos” como fonte primordial de pesquisa para analisar, ler e discutir obras – autobiográficas e ficcionais (dramaturgias, espetáculos, narrativas, poesias, performances) sobre temas voltados para meus interesses de investigação: afetividades, corporeidades, corpos e corpas dissidentes, identidades, memórias, mitos, performatividades, subjetividades, teatralidade, teatros negros, ritualidade. 

Acervo Sábato Magaldi: tratamento, inventariação e figurações do crítico

Elen de Medeiros

Acervo Sábato Magaldi: tratamento, inventariação e figurações do crítico

O crítico teatral mineiro Sábato Antônio Magaldi, um dos principais nomes da crítica teatral moderna no Brasil, possui vasta produção sobre os autores mais salientes de nossa historiografia teatral. Iniciou sua atuação como crítico no Rio de Janeiro, para posteriormente seguir para São Paulo, onde, além de crítico, tornou-se também professor da Escola de Comunicação e Artes da USP. Foi, também, Secretário de Cultura da cidade de São Paulo. Como pesquisador, foi responsável por estudos sobre a obra de Nelson Rodrigues, Oswald de Andrade, Jorge Andrade, Augusto Boal, Plínio Marcos, dentre outros. No campo da historiografia teatral, publicou obras que marcaram gerações. Seu acervo pessoal, doado à UFMG em 2017, destaca-se, portanto, como rico material de investigação teatral, tanto no que concerne o campo da crítica quanto da historiografia do teatro brasileiro e ocidental. Composto por sua biblioteca particular, diversos tipos documentais, além de mobiliário e outros itens, o Acervo Sábato Magaldi encontra-se atualmente em processo de inventariação, trabalho realizado sob a coordenação da profa. Elen de Medeiros, com a participação de diversos bolsistas e voluntários. A seguir, após a finalização da elaboração do arranjo total do Acervo Sábato Magaldi, todo material poderá ser disponibilizado para o público, a fim de alimentar pesquisas de caráter histórico-crítico do teatro brasileiro. 

Mobilidade e cosmopolitismo nos livros infantis de Ziraldo

Andréa Borges Leão

Mobilidade e cosmopolitismo nos livros infantis de Ziraldo

Não foi com as aventuras dos personagens do Sítio do Picapau Amarelo que sonhava o menino Ziraldo Alves Pinto na cidade de Caratinga dos anos de 1930. Filho de um comerciante e de uma costureira que também sabia fazer livros de papel, Ziraldo imaginava aventuras no espaço sideral, personagens astronautas e heróis de histórias em quadrinhos. Desenhando na escola e ilustrando os livros de casa, o menino tomou gosto pela escrita. Em 1969, Bacharel em Direito e morando no Rio de Janeiro, lança seu primeiro livro infantil, Flicts, o mais traduzido entre todos. A partir daí, conquista por meio da editora Melhoramentos um lugar importante no mercado editorial brasileiro. Na década de 1980, a literatura infantil se inscreve no desenvolvimento de uma indústria do livro produtora de padrões universais que justificam a sua exportação mundial − antes mesmo da telenovela. A indústria cultural trouxe com ela um nova geração de escritoras e escritores, José Mauro de Vasconcelos, Ana Maria Machado, Ruth Rocha e Ziraldo. Face à interdição dos espaços de produção intelectual pela censura, esse grupo passa a discutir o país, a política e a cultura no livro infantil. 

Para Ziraldo, os anos 1970 foram passando pelo humor e as charges políticas no jornal O Pasquim. O livro menino maluquinho, de 1980, expressa esse movimento. Não por acaso, o escritor diz ter feito do desenho narrativo arte aplicada, ligando a ponta da feitura à do entendimento. De mãos dadas com as crianças Ziraldo atravessou fronteiras nacionais, temporalidades e, até hoje, aos 90 anos, segue encantando gerações. 

Gostaria de testar a hipótese de que o cosmopolitismo do escritor como disposição íntima e relação social provoca identificações e assegura a mobilidade de seus personagens e livros. Para tanto, proponho o estudo da mobilidade dos livros infantis de Ziraldo, relacionando-a aos processos de sua formação e experiência profissional. As ondas de traduções do Flicts, assim como os destinos internacionais dos títulos das séries “meninos” e “meninos e planetas” são os objetos do estudo. A migração do texto por universos linguísticos implica novas autorias e, por conseguinte, transposições do significado. O desenho narrativo pode mostrar a intenção original sendo refeita em universos estéticos de recepção. Cabe saber de que modo a cultura visual de Ziraldo imaginada em um país de língua portuguesa, periférico e historicamente importador, favorece a ampliação do leitorado, alterando os sentidos dos textos. 

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Nosso primeiro encontro presencial será uma oportunidade de discussão e balanço das atividades do projeto em seu segundo ano de existência, que coincide com o centenário da Semana de Arte Moderna e o bicentenário da Independência. Além disso, fará parte do calendário de celebrações dos 95 anos da UFMG.

Visto desde Minas Gerais, o ano-chave do modernismo é 2024. Nele, comemoram-se cem anos da viagem dos modernistas paulistas às hoje chamadas cidades históricas do estado. Naquela ocasião, o encontro com as formas do barroco e com o que seria chamado de primitivismo estético, na linguagem das vanguardas daquele tempo, configurou um cosmopolitismo e uma sensibilidade específicas de desrecalque da cultura brasileira e reconhecimento da dignidade de formas culturais não eurocêntricas. 

No ano do centenário da Semana de Arte de Moderna, o objetivo principal do seminário é reunir pesquisadores e pesquisadoras da rede internacional MinasMundo: o cosmopolitismo na cultura brasileira para discutir resultados das pesquisas sobre legados do modernismo na literatura, artes, cultura e sociedade mineiras. Da mesma forma, estaremos refletindo sobre a inflexão que o fechamento desse ano representa, no sentido da rotação de perspectiva que vai de uma memória do modernismo centrada em discussões sobre identidade nacional a uma outra, preocupada com os temas do cosmopolitismo, do papel da cultura brasileira no mundo e da dependência cultural.

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

O projeto MinasMundo entra em seu terceiro ano dia 31 de outubro. Nossa meta é chegar a 2024 para as comemorações do centenário de um outro modernismo, o forjado na viagem de modernistas a Minas Gerais em 1924. Entrando Brasil adentro, o modernismo encontrou um ângulo de observação, paradoxalmente, cosmopolita, dando início a um processo de descentramento nacional e de relacionamento com a diferença que se multiplicou em muitas frentes. Afirmar o cosmopolitismo como uma relação dialógica com o outro no contexto político brasileiro atual se tornou um desafio a cada ano maior e cada vez mais urgente. O cosmopolitismo é uma linguagem da democracia. Por isso, na véspera do nosso aniversário, pesquisadores e pesquisadoras que formamos o projeto estamos com Lula e Alckmin, arregaçando as mangas para a reconstrução democrática do Brasil. Viva Minas e viva o mundo – o mundo das diferenças e do combate às desigualdades, da valorização da fala e da escuta, da liberdade e do bem comum, dos direitos igualitários e da solidariedade, da democratização da cultura e da cultura democrática cosmopolita.

 

Assinam:

Anderson Ricardo Trevisan (UNICAMP)

Andre Bittencourt (UFRJ)

André Botelho (UFRJ)

Angélica Adverse (UFMG)

Antonio Brasil Jr. (UFRJ)

Bernardo Ricupero (USP)

Carmen Felgueiras (UFF)

Celi Scalon (UFRJ, UERJ)

Denilson Lopes (UFRJ)

Eduardo Coelho (UFRJ)

Eduardo Dimitrov (UnB)

Elide Rugai Bastos (UNICAMP)

Enio Passiani (UFRGS)

Fernando Tavares Jr. (UFJF)

Gabriela Nunes Ferreira (UNIFESP)

Helena Bomeny (UERJ)

Helga Gahyva (UFRJ)

Heloisa Murgel Starling (UFMG)

Joana Lavôr

Joana Ribeiro da Silva Tavares (PPGAC/UNIRIO)

João Mello (PPGSA/UFRJ)

João Pombo Barile (SLMG)

José Newton Coelho Meneses (UFMG)

Karim Helayel (PPGSA/UFRJ)

Leonardo Belinelli (CEDEC)

Lilia Moritz Schwarcz (USP)

Lorena Cândido Fleury (UFRGS)

Lucas Carvalho (UFF)

Lucas van Hombeeck (PPGSA/UFRJ)

Luis Felipe Kojima Hirano (UFG)

Luiz Armando Bagolin (USP)

Marcelino Rodrigues da Silva (UFMG)

Marco Antonio Gonçalves (UFRJ)

Maria Angélica Melendi (UFMG)

Maria Laura Cavalcanti (UFRJ)

Mariana Chaguri (Unicamp)

Marília Librandi (Princeton University)

Maurício Ayer (USP)

Maurício Hoelz (UFRRJ)

Paulo Maciel (UFOP)

Pedro Meira Monteiro (Princeton University)

Reinaldo Martiniano Marques (UFMG)

Rennan Pimentel (PPGSA/UFRJ)

Roberto Said (UFMG)

Rodrigo Jorge Ribeiro Neves (UFRJ)

Rodrigo Salles Pereira dos Santos (UFRJ)

Roniere Menezes (CEFET-MG)

Sabrina Parracho Sant’Anna (UFRRJ)

Sérgio Bairon (USP)

Simone Kropf (Fiocruz)

Simone Meucci (UFPR)

Wander Melo Miranda (UFMG)

 

O selo comemorativo é de Joana Lavôr.

Onde mora o modernismo? A caderneta de endereços de Ronald de Carvalho

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

André Botelho

Onde mora o modernismo? A caderneta de endereços de Ronald de Carvalho

Vicente do Rego Monteiro, Retrato de Ronald de Carvalho, 1921, óleo sobre tela, Coleção Gilberto Chateaubriand – MAM/RJ

Foto do poeta e dramaturgo simbolista Maurice Maeterlinck (Nobel de literatura, 1911) colada na contracapa da caderneta.

O poeta, ensaísta e diplomata carioca Ronald de Carvalho (1893-1935) é um emblemático modernista brasileiro do Rio de Janeiro. O jogo entre local e nacional não é, em seu caso, casual. Como tampouco o é o jogo entre o nacional e o cosmopolita, o local e o universal num autor que, inclusive por profissão, atuou nas mediações culturais e políticas entre o Brasil e o mundo. E, quando foi necessário, entre o Rio de Janeiro e São Paulo.

Foi na casa de Ronald, na Rua Humaitá, no bairro carioca de Botafogo, que se tramou a adesão dos artistas e intelectuais estabelecidos na então Capital Federal à Semana de Arte Moderna realizada em São Paulo em 1922. E essa articulação foi crucial para dar à Semana não apenas mais densidade artística, como uma repercussão menos localista e um sentido mais abrangente, nacional e cosmopolita, do que se reunisse apenas a turma paulista. Foi ainda na casa de Ronald, em 1921, que Mário de Andrade conheceu Manuel Bandeira, com quem teria longeva amizade e uma das mais impressionantes relações epistolares da cultura brasileira e da língua portuguesa.

Anotações diversas e lista de palavras.

Nas suas credenciais para essa participação destacada nos anos 1920, contava, e muito, o fato de Ronald ter participado também do modernismo português em torno da revista Orpheu, em 1914-15, com jovens simbolistas portugueses como Raul Leal, Mário de Sá Carneiro, José de Almada Negreiros, Luís de Montalvor e Fernando Pessoa, sendo considerado por este último “um dos mais interessantes e nossos dos poetas brasileiros de hoje”.

Endereços de Mário de Andrade e de Guilherme de Almeida, além de anotações pessoais.

Em 1998 fiz contato com o Sr. Arthur Ronald de Carvalho, filho de Ronald. Fui muito bem recebido por ele e sua esposa, D. Myriam, em seu apartamento na Rua Voluntários da Pátria, no mesmo bairro paterno de Botafogo. Em uma das visitas, a terceira ou a quarta que fiz ao casal, recebi deles, como um presente pessoal, a caderneta de endereços, junto com outros dois cadernos de recortes e anotações. Arthur contou-me que, como seu pai falecera como Chefe da Casa Civil de Vargas, parte da biblioteca e do arquivo de documentos fora retirada da sua residência numa operação semioficial por agentes do Estado por se entender que poderiam conter materiais oficiais, de natureza sigilosa e circulação restrita. Ronald morrera repentinamente em decorrência de um acidente de automóvel em fevereiro de 1935.

Endereço de Manuel Bandeira.

Então, a caderneta de endereços sobre a qual estamos trabalhando nesta ação conjunta do Suplemento Pernambuco com o Projeto MinasMundo (embora eu já tenha feito citações dela em minha tese de doutorado Um ceticismo interessado: Ronald de Carvalho e sua obra dos anos 20, defendida em 2002, e noutras publicações posteriores) é, num certo sentido, uma sobrevivente dessa operação de sequestro. Talvez, tenha escapado por ser pessoal demais, mas, sobretudo, por ser de um período anterior, da juventude modernista cosmopolita de Ronald de Carvalho.

A caderneta nos fascina como um documento único em seu gênero, com anotações pessoais – como listas de palavras, citações, esboços de poemas etc. – e endereços que fazem dela um verdadeiro “quem é quem” do modernismo brasileiro. Seu período de uso pode ser apenas estimado. Na primeira página da letra A encontramos uma anotação com identificação de data, 1914, quando então Ronald tinha 21 anos de idade: “Escrevi ao Crès relembrando meus livros no dia 2 de fevereiro de MCMIV, assim, como fazendo a proposta do livro do Homero ‘Au jardin de la Beauté’”. A primeira informação do trecho, provavelmente, se refere à Casa Crés Et Cie., estabelecida em Paris, que no ano anterior editara o livro de estreia de poesias de Ronald, Luz Gloriosa. O que nos sugere que a caderneta foi usada pelo menos a partir de 1914.

Até quando a caderneta foi utilizada é muito mais difícil de saber. Mas também temos indicações. Por exemplo, na entrada “Bandeira (Manuel)”, aparece riscado o endereço do poeta na Rua do Curvelo, 43 (hoje Dias de Barros, no bairro carioca de Santa Teresa) Ao seu lado, um novo número de telefone. Sabemos que Bandeira morou na Rua do Curvelo por 13 anos a partir de 1920. Não sabemos o motivo pelo qual Ronald riscou o endereço de Bandeira; teria ele usado a caderneta depois de 1930? Muito improvável.

Endereço de Oswald de Andrade, em Paris, e de Olegário Mariano, no Rio.

Outros exemplos: na entrada “Andrade (Mário)”, consta o endereço Rua Lopes Chaves, 108, onde sabemos que Mário viveu a partir de 1921. Então, temos a indicação de mais um ano de uso da caderneta. “Freyre (Gilberto)” aparece com indicação do número 199 do cais do Imperador, Recife, onde Freyre terá vivido no máximo até 1930, quando acompanhou para o exílio em Portugal o então presidente de Pernambuco, deposto pela Revolução de 1930, Estácio Coimbra, de quem era secretário particular.. Sabemos que, antes disso, Freyre morava com o irmão Ulysses na casa do Carrapicho, localizada na Rua do Encanamento, onde escreveu Casa-grande & Senzala, publicado em 1933. Mais interessante é a indicação, logo abaixo do nome de Gilberto Freyre, do de Oliveira Lima, em Washington, onde veio a falecer como embaixador brasileiro em 1928.

Uma caderneta de endereços, convenhamos, entre muitas outras funções esperadas, guarda justamente os destinatários da correspondência que foi uma das principais formas de ação comunicativa entre os modernistas e deles com a sociedade brasileira. Um arquivo modernista, portanto. Como discuti recentemente no livro que escrevi com Maurício Hoelz, O modernismo como movimento cultural (Vozes, 2022), a mudança cultural que o modernismo objetiva operar na sociedade implica uma transformação nos próprios atores sociais que dele participam. Forja-se, assim, uma espécie de self modernista. Este, porém, não se completa em si mesmo, não constitui uma identidade fechada nem sequer estável. Antes, se repõe, a cada geração, na espiral formada pela relação sempre muito contingente entre a mudança pretendida pelo movimento e a sua modificação no processo. O modernismo é um tipo de movimento que enlaça gerações. Então, são muitos os seus lugares. Mas ele mora, sobretudo, no tempo da longa duração. Hoje, no centenário da Semana de Arte Moderna, com a participação da nossa ação Modernismo rede social, ele se recoloca no Facebook, Twitter, WhatsApp e Instagram e outras práticas comunicativas cotidianas, disputando ainda os significados da cultura brasileira – que não é apenas o espaço do consenso, mas do conflito.

Endereço de Gilberto Freyre, no Recife, ligado ao de Oliveira Lima, em Washington. Destaque também para Jackson de Figueiredo.

Cataguases-mundo: a revista Verde

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

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Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Luiz Ruffato, Enio Passiani e Roberto Said

Cataguases-mundo: a revista Verde

O MinasMundo recebe o escritor Luiz Ruffato após o lançamento do livro A revista Verde, de Cataguases: contribuição à história do modernismo (Autêntica, 2022). Autor de “Eles eram muitos cavalos”, “Inferno provisório” e “O verão tardio”, entre outros, seus livros ganharam os prêmios Machado de Assis, APCA, Jabuti e Casa de las Américas e estão publicados em 15 países. Em 2016 recebeu o Prêmio Internacional Hermann Hesse, na Alemanha. A mesa conta com mediação de Enio Passiani (UFRGS) e debate de Roberto Said (UFMG).

Uma voz em off, um depoimento

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

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Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Lena Bergstein e André Botelho

Uma voz em off, um depoimento

Neste encontro com a artista plástica Lena Bergstein, conversamos sobre seu trabalho e suas reflexões atuais sobre o exílio: Palestina.

Lançamento/conversa | O modernismo como movimento cultural: Mário de Andrade, um aprendizado

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

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Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Nísia Trindade Lima, Pedro Meira Monteiro, André Botelho e Maurício Hoelz

Lançamento/conversa | O modernismo como movimento cultural: Mário de Andrade, um aprendizado

2022 é um ano intenso: bicentenário da Independência política do Brasil, centenário da Semana de Arte Moderna de São Paulo e eleições presidenciais. Todos esses eventos, além do que estamos vivendo em escala nacional e internacional nos últimos anos, recolocam a democracia no centro da agenda brasileira. O modernismo como movimento cultural: Mário de Andrade, um aprendizado (Vozes, 2022) dos sociólogos André Botelho (UFRJ) e Maurício Hoelz (UFRRJ), traz o modernismo para este debate fundamental ao discutir os fracassos dos projetos de democratização da cultura de Mário de Andrade.

Não foram fracassos meramente pessoais, mas de todo um projeto de sociedade a que Mário deu vida em seus textos e ações, que esbarrou e foi redefinido tanto pelas estruturas autocráticas e autoritárias do Estado Novo (1937-1945), quanto pelas persistentes desigualdades sociais e cultura eurocêntrica na sociedade brasileira. O que eles têm a nos dizer num momento em que o conflito cultural, e não apenas político e econômico, volta à esfera pública da sociedade brasileira de modo tão violento e tão excludente? Como reconhecer um lugar de fala sem excluir um lugar de escuta? A comunicação democrática é ainda possível entre nós?
No livro que foi lançado numa [maquin]ação do MinasMundo, o modernismo passa a ser visto como um “movimento cultural”: uma forma de ação coletiva que disputa o controle cultural pela mudança da sociedade, enlaçando diferentes gerações.

Mais do que a tragédia da cultura modernista, O modernismo como movimento cultural reafirma a riqueza e a potência intelectual e política do legado de Mário de Andrade. Um legado que, por suas características próprias, especialmente o sentido aberto e inacabado da sua interpretação do Brasil, exige a interação permanente com o outro, com nós mesmos. E que tem muito a nos ensinar ainda sobre participação social, reconhecimento e democracia.

Inconfidências

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Heloisa Starling, Eliane Robert de Moraes e Sérgio Alcides

Inconfidências

A mesa “Inconfidências” abriu nossa programação de 2022.
Com tanto pela frente neste ano de desafios e promessas, revisitamos alguns dos eixos do projeto MinasMundo. “Inconfidências”, no plural, sugere como é complexo o universo das lealdades quando o cosmopolitismo está no horizonte. Lealdade a quê? A este lugar, ou a outro? Mas que lugares imaginários são esses que parecem exigir de nós uma resposta? Que futuros se escondem nas escolhas feitas e nos acidentes do passado? O que ficou pelo caminho, o que pode ser resgatado ou rechaçado? Que alianças se firmam ou se traem quando o desejo do indivíduo desponta em meio à comunidade? Poesia, filosofia e história dialogam nesta mesa cheia de implicações para um momento dividido e decisivo como o nosso.

Seminários de Trabalho 2022

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

MinasMundo e Sociedades Científicas em defesa da Serra do Curral

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

MinasMundo e Sociedades Científicas em defesa da Serra do Curral

Baixe aqui a nota em pdf.

MinasMundo, rede multidisciplinar que reúne cerca de 60 pesquisadores e pesquisadoras doutores/as de diferentes áreas e instituições, no Brasil e também no exterior, e as Associações abaixo signatárias, vem a público manifestar seu repúdio ao megaprojeto de mineração na Serra do Curral, em Nova Lima, região metropolitana de Belo Horizonte, aprovado pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM), em uma sessão remota encerrada na madrugada do dia 30 de abril de 2022.

A Serra do Curral, como atesta processo de tombamento em curso, é Patrimônio Cultural e Ambiental de Minas Gerais. Símbolo da capital mineira, suas montanhas envolvendo a cidade constituem parte da identidade da metrópole planejada para ser cosmopolita a seu modo singular.

Entregar a Serra do Curral à sanha da exploração mineral é aferrar o estado, suas terras e suas pessoas a uma “vocação mineral” que tem se demonstrado fartamente catastrófica. É aceitar que ela seja consumida em um empreendimento que terá 13 anos de vida útil.

Em apoio às manifestações dos movimentos sociais organizados, o MinasMundo entende, como eles, que a vida vegetal e animal, humana e não humana, é mais importante que a economia insustentável e irresponsável de projetos de mineração na Serra do Curral, em Nova Lima e Belo Horizonte, que põem em risco a vida e impactam negativamente a vivência, a cultura e o ambiente das duas cidades.

Os exemplos desastrosos e os estudos sobre os impactos socioambientais do projeto do Complexo Minerário Serra do Taquaril, da Taquaril Mineração S.A. – TAMISA, nos levam a apoiar o voto contrário dos representantes do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), da Associação PROMUTUCA, da Fundação Relictos e da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – ABES, na reunião do Conselho Estadual de Política Ambiental – COPAM, do último 29 de abril.

Conclamamos que o processo em curso de tombamento da Serra do Curral como Patrimônio Cultural e Ambiental do Estado seja continuado e terminado, ficando toda a área livre de projetos danosos à sociedade e ao ambiente. Lembramos que, além dos impactos ambientais que influenciarão a qualidade do ar de toda a área centro-sul de Belo Horizonte, o complexo se instalará em espaço com vegetação nativa de Mata Atlântica, considerado “Área Prioritária para conservação da Biodiversidade Especial”. Por fim, diante das flagrantes ilegalidades da autorização do empreendimento, reivindicamos sua suspensão, em conformidade com a ação do Ministério Público de Minas Gerais.

MinasMundo

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais – ANPOCS

Associação Brasileira de Antropologia – ABA

Associação Brasileira de Ciência Política – ABCP

Associação Brasileira de Literatura Comparada – ABRALIC

Associação Nacional de História – ANPUH

Sociedade Brasileira de Sociologia – SBS

Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC

 

Apoiam:

Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas – ABRACE

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPPED

Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação – COMPÓS

Associação Brasileira de Pesquisadores de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas – ABRAPCORP

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade – ANPPAS

Associação Brasileira de Relações Internacionais – ABRI

Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos – SBEC

Associação Brasileira dos Professores de Italiano – ABPI

Associação Brasileira de Professores de Língua Inglesa da Rede Federal de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico – ABRALITEC

Associação Brasileira de Pesquisadores em Cibercultura – ABCiber

Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências – ABRAPEC

Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional – ANPUR

Associação Brasileira de Hispanistas – ABH

Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Letras e Linguística – ANPOLL

Associação Brasileira de Ensino de Biologia – SBENBIO

Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo – ABEJ

Associação de Linguística Aplicada do Brasil – ALAB

Associação Brasileira de Estudos Sociais das Ciências e das Tecnologias – ESOCITE.BR

Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as – ABPN

Sociedade Brasileira de História da Ciência – SBHC

Sociedade Brasileira de Física – SBF

Sociedade Brasileira de Química – SBQ

Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional – ANPUR

Federação Brasileira de Associações Científicas e Acadêmicas da Comunicação – SOCICOM

Associação de Linguística Aplicada do Brasil – ALAB

Sociedade Botânica do Brasil – SBB

Associação Brasileira de Mutagênese e Genômica Ambiental – MutaGen-Brasil

Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Geografia – ANPEGE

Associação Brasileira de Linguística – ABRALIN

Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação – ABECO

Sociedade Brasileira de Educação Matemática – SBEM

Sociedade Brasileira de Economia Ecológica – SBEE

Sociedade Brasileira de Matemática Aplicada e Computacional – SBMAC

Sociedade Brasileira de Eletromagnetismo – SBMAG

Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual – Socine

Sociedade Brasileira de Ornitologia – SOB

Associação Brasileira de Estudos Populacionais – ABEP

Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia – ANPEPP

Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social – ABEPSS

Associação Brasileira de Psicologia Política – ABPP

Projeto literatura e biopolítica: os romances da decadência

Wander Melo Miranda

Projeto literatura e biopolítica: os romances da decadência

Uma das possibilidades de se entender a prosa moderna brasileira é o estudo da obra de Cornélio Penna, Lúcio Cardoso e Autran Dourado, autores voltados para a abordagem da decadência da família patriarcal brasileira, em nítida contraposição ao acelerado processo de modernização em curso nos anos 1950 e 1960. Ler esses autores a partir de uma perspectiva biopolítica se oferece como nova possibilidade de elucidação de questões literárias, históricas e políticas, apresentadas de maneira a dar uma forma original ao corpo social, tendo em vista, segundo Jean-Luc Nancy, que escrever é tocar o corpo com o incorpóreo do sentido, “tornando o incorpóreo tocante”. Ou ainda, segundo Roberto Esposito: “Não coincidindo nem com a pessoa nem com a coisa, o corpo humano abre um ângulo de visão externo que projeta uma sobre a outra”, abrindo-se, por sua vez, a possibilidades insuspeitadas de relação entre corpo e escrita.

Tome-se como exemplo a relação entre o corpo doente de Nina e a ruína da chácara dos Menezes em Crônica da Casa assassinada (1959), de Lúcio Cardoso, ou a presença fantasmagórica da personagem a que se refere o título A menina morta (1954), de Cornélio Penna, para ficar nos anos 1950, ou, se quisermos avançar um pouco no tempo, a figura solitária de Rosalina, em Ópera dos mortos (1967), de Autran Dourado. Nada mais inatual, artística, social e politicamente e, no entanto, nada é mais contemporâneo nosso, do que esses romances escritos e publicados a partir do decênio de 1950, no momento em que o país se empolga com a construção de Brasília no planalto central e com a abertura da moderníssima rodovia Transamazônica, ou se vê confrontado com o processo de modernização autoritária promovido pela ditadura civil-militar a partir de 1964.

Esses romances se apresentam como corpos significantes, voltados para uma cerrada introspecção que, paradoxalmente, deixa ver sua inscrição política: se a política é o que desloca um corpo do lugar ou que muda o destino de um lugar, ela faz então ver “o que não tinha razão para ser visto, faz escutar um discurso onde só o ruído tinha lugar”. Cabe então perguntar de que forma se constitui literariamente esse discurso, como se configura, nesses termos, a relação entre público e privado, como se configura o objeto verbal lhe dá forma. Para responder a essas e outras indagações, bem como retomar a relação entre literatura e biopolítica, pareceu um caminho pertinente e ainda pouco trilhado em se tratando das obras e autores citados, bem como de outras produções similares.

Modernismo rede social

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Maurício Hoelz e Rodrigo Jorge Ribeiro Neves

Modernismo rede social

Para rememorar os 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922, o projeto MinasMundo, em parceria com o Suplemento Pernambuco, promove durante o mês de fevereiro a ocupação virtual Modernismo rede social a partir de uma seleção de cartas de participantes desse movimento cultural que pretendeu dar um significado novo ao que entendia ser a cultura brasileira até então. Serão duas postagens por semana, às terças e quintas-feiras.

As cartas foram um dos principais meios de conexão entre os modernistas no dia a dia do movimento e de mobilização para uma luta coletiva, que enlaçaria futuras gerações, em prol da mudança da cultura e da sociedade brasileira. A correspondência permite ao leitor e à leitora de hoje acessar as redes sociais modernistas e conhecer os bastidores dos processos de criação, bem como das alianças, disputas e rupturas em torno dos rumos programáticos do movimento. Afinal, entre avatares e seguidores, foram muitos os modernistas e são muitos os modernismos, mesmo considerando apenas a sua matriz paulista, que, apesar de sua diversidade interna, acabou conseguindo tornar hegemônica sua autorrepresentação de protagonista dessa renovação, abafando a importância dos grupos do Rio de Janeiro, Pernambuco e Minas Gerais, por exemplo.

A carta é um gênero transgressor. Bem antes destes tempos de vida remota e virtual, se uma cidade, país ou oceano separava duas pessoas que sentiam falta e queriam ter notícias uma da outra, escrever uma mensagem, lacrar em um envelope e mandá-la pelos correios era uma forma de tentar atravessar esses limites físicos e geográficos. Mas a carta é também um texto híbrido e rebelde a qualquer tipo de classificação definitiva, que contribui tanto para a reconstituição histórica e (auto)biográfica, quanto para a compreensão das dinâmicas sociais, políticas e culturais em que essas vidas estão inseridas. Ao invadirmos, como voyeurs, a intimidade da correspondência modernista, nós também estamos cruzando as fronteiras entre o privado e o público e entrando num circuito de trocas guardado durante anos no segredo dos arquivos.

Como linkar passado e presente para nos aproximarmos (em e) de uma forma contemporânea do modernismo de 1922? Como experimentar hoje sua dimensão de movimento cultural em nosso próprio cotidiano? Com o intuito de furar a “bolha” acadêmica, adotamos como linguagem desta ocupação as estruturas e componentes das nossas redes sociais para pensar sobre o lugar do modernismo no mundo contemporâneo. Como o desenvolvimento da escrita epistolar se deu paralelamente ao da própria cultura escrita, não é difícil identificar seus elementos e sua economia discursiva nos meios de comunicação instantânea atuais, como Facebook, Twitter, WhatsApp e Instagram, já que são também práticas sociais cotidianas. Assim, inspirados na técnica da colagem/montagem cara aos modernistas, baralhamos cartas de diferentes datas, locais e missivistas, nem sempre confluentes e relacionados, a fim de provocar tensões deliberadamente anacrônicas entre temporalidades, sujeitos e discursos. O choque gerado por essa interpelação criativa busca romper com as expectativas de leituras consolidadas e abrir novas interpretações do modernismo e dos seus sentidos mais perenes para a cultura brasileira.

Embora Mário de Andrade ocupe o centro dessa rede alimentada por cartas, diversas figuras representativas do cenário intelectual e cultural brasileiro frequentarão também este espaço, seja por engajamento, proximidade ou oposição ao movimento. Alceu Amoroso Lima, Anita Malfatti, Câmara Cascudo, Carlos Lacerda, Carlos Drummond de Andrade, Graça Aranha, Henriqueta Lisboa, Manuel Bandeira, Pedro Nava, Tarsila do Amaral, entre outros/as, encenarão fofocas, tretas e cancelamentos, como se diria hoje, e nos farão companhia nessa caravana modernista de volta para o futuro.

Nossos recortes de cartas pretendem compor um repertório temático fundamental do modernismo, como se formassem peças de um quebra-cabeça, ou pistas de uma trama, que caberá ao leitor montar. A ocupação traz ainda a público, pela primeira vez, trechos da caderneta de endereços de Ronald de Carvalho, que foi um “influenciador” decisivo no engajamento dos artistas do Rio de Janeiro, então capital federal, na Semana de Arte Moderna, o que certamente lhe conferiu maior abrangência, impacto e repercussão. A caderneta é uma espécie de who’s who do movimento e constitui, nesta ação do MinasMundo, como as nossas atuais listas de contatos, o objeto-síntese da rede social modernista.

Graça Aranha X Mário de Andrade: “Cancelamento” modernista

O primeiro post da ocupação Modernismo rede social trata do escândalo – como uma “treta” dos dias atuais na internet – em torno do rompimento de Graça Aranha com a Academia Brasileira de Letras, instituição de que fora um dos fundadores e que representava, para os modernistas, a guardiã oficial do “passadismo” a ser combatido. O diplomata Graça Aranha foi o responsável por apresentar, aos jovens modernistas paulistas, Paulo Prado, “fautor verdadeiro da Semana”, segundo Mário de Andrade. Graça Aranha empresta ao evento seu prestígio de medalhão, articula a participação de figuras cariocas de peso, como Ronald de Carvalho e Heitor Villa-Lobos, e profere a conferência de abertura, A emoção estética na arte moderna, baseada nas ideias de seu livro A estética da vida, publicado em 1921. Em 19 de junho de 1924, faz outra conferência, desta vez a polêmica O Espírito Moderno na ABL, na qual decreta, entre aplausos e vaias, ter renunciado à imortalidade: “se a Academia não se renova, morra a Academia”. Se tal episódio representa o triunfo simbólico do modernismo sobre a tradição, ele é também um marco da contestação pública da liderança do movimento modernista que Graça Aranha arrogava para si, a qual culminará na ruptura – que hoje talvez chamássemos de “cancelamento” – por parte de Mário de Andrade. Para ler o post, clique aqui.

Influenciadores do modernismo: Manuel Bandeira e Mário de Andrade

No segundo post da ocupação, como um flashback do anterior, entramos na intimidade das cartas entre Mário de Andrade e seu amigo e principal correspondente, Manuel Bandeira – por ele considerado o “São João Batista” do modernismo –, para acompanharmos os bastidores do desgaste da figura de Graça Aranha, autoproclamado chefe, em meio a conflitos com outros modernistas que levaram a sua deposição, consumada na carta pública do líder paulista. O autor de Canaã lançou mão de sua influência institucional em determinados grupos para defender sua “narrativa” de protagonista do movimento. Mas não colou. Dois dos principais atores do modernismo, Mário e Bandeira, colocam em cena suas críticas a respeito e trazem para a rede outros “influenciadores”, estes, sim, fundamentais para os rumos desse movimento cultural, como Oswald de Andrade e Ronald de Carvalho. Para ler o post, clique aqui.

O preço da celebridade modernista

Em 1922, Anita Malfatti, Mário de Andrade, Menotti Del Picchia, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral formavam o chamado “Grupo dos cinco”, que poucos anos depois se dividiria em lados opostos (e outros lados), com o movimento Verde-Amarelo (depois rebatizado Grupo da Anta), a Antropofagia e Mário de Andrade, cada um em seu quadrado.

Naquela época, Menotti era o único escritor já consagrado, graças a seu fenômeno editorial Juca Mulato, publicado em 1917. Sob o pseudônimo Hélios, era também colunista do Correio Paulistano, onde faria a cobertura da Semana de Arte Moderna, autointitulando-se o “Gedeão” do movimento. Em carta de Mário de Andrade por ele publicada em 23 de fevereiro de 1922, acompanhamos ainda no calor do acontecimento a repercussão imediata da vitoriosa ocupação modernista do Teatro Municipal. O evento bombástico catapultou os modernistas à “celebridade”, mas não sem cobrar, de alguns deles, um alto preço, como foi o caso de Mário de Andrade. As vaias do público, no entanto, ecoaram neles por muito tempo, reforçando seu compromisso mútuo e impulsionando-as a seguir em frente, mesmo que por caminhos separados e em direções contrárias. Para ler o terceiro post da ocupação, clique aqui.

A cultura num campo aberto de luta

Nas palavras de Manuel Bandeira, Ribeiro Couto (na imagem acima) era um “farejador de novidades”. Se o poeta de Carnaval (1919) “era modernizante sem saber”, foi por influência de Couto, que lhe revelou “os italianos e os franceses mais novos, Cendrars e outros”. Assim como Bandeira, Ribeiro Couto também se recusou a participar da Semana de Arte Moderna, em São Paulo, embora reconhecesse a importância do evento e estivesse sintonizado com as principais tendências da arte moderna. Logo após o rompimento de Graça Aranha com a Academia Brasileira de Letras, Couto publicou artigo em O País, de 29 de junho de 1924, que defendia a construção de um novo presente, mas sem destruir o passado, da mesma forma que Manuel Bandeira ressaltara em cartas a Mário de Andrade e em seu Itinerário de Pasárgada. Já a relação com o poeta de Pauliceia desvairada era de profundas dissensões, que nunca se solucionaram. Para ler o quarto post, clique aqui.

A pedra angular do modernismo

Para “viralizar” na sociedade, o modernismo precisava engajar sempre novos seguidores e, movido à energia renovável e renovadora da juventude, enlaçar as gerações. Neste post rememoramos os princípios de uma das mais notáveis correspondências da cultura brasileira: aquela entre Mário de Andrade e Carlos Drummond de Andrade, então um jovem provinciano embriagado de literatura francesa que só estrearia em livro anos depois, em 1930, com Alguma poesia. No meio do caminho tinha uma pedra. A pedra angular do modernismo. Para ler, clique aqui.

Mário de Andrade: Uma geração diante do espelho

As cartas do então jovem esquerdista Carlos Lacerda a Mário de Andrade são de alta voltagem. Membro da Casa do Estudante do Brasil e cursando Direito na Universidade do Rio de Janeiro (atual UFRJ), Lacerda editava a revista rumo, voltada para temas como educação, política, literatura e cultura. O contato inicial com Mário de Andrade, em 1933, foi intermediado pelo mineiro Rosário Fusco e teve como ensejo a publicação, em rumo, de uma enquete sobre os “20 melhores livros brasileiros”. Depois disso, a relação entre eles se estenderia para além de outras colaborações e debates sobre temas candentes, como a tensão entre arte e engajamento político, se convertendo em uma sincera amizade. Para ler o post, clique aqui.

Meditação no exílio e o privilégio da amizade

O período vivido no Rio de Janeiro, entre 1938 e 1941, foi dos mais difíceis para Mário de Andrade, que havia deixado São Paulo extremamente abatido e magoado por seu afastamento involuntário do Departamento de Cultura e pelo que entendia ter sido o fracasso de sua gestão à frente dele. O autoexílio propiciou também a meditação prolongada e a realização de balanços sobre sua vida pessoal e o papel intelectual que vinha desempenhando, como aparece na avaliação bastante crítica e melancólica que acabou por fazer do modernismo e da contribuição de sua geração intelectual na conferência O movimento modernista proferida na Casa do Estudante do Brasil em 1942. Aqueles anos fortaleceram, acima de tudo, suas convicções sobre a responsabilidade e o compromisso social de artistas e intelectuais. Mas o Rio de Janeiro, afinal de contas, também propiciou a convivência de Mário de Andrade com jovens artistas e intelectuais procedentes de diferentes regiões do país para seu centro cosmopolita. Os debates quentes regados a chopes gelados na Taberna da Glória não foram esquecidos por seus alunos da Universidade do Distrito Federal e outros jovens, como os rapazes da Revista Acadêmica, entre os quais estava Moacir Werneck de Castro, jornalista engajado que era primo de Carlos Lacerda, com quem cursou a então Faculdade de Direito do Rio de Janeiro e militou politicamente na juventude. No xadrez modernista, a juventude era a rainha. Para ler o post, clique aqui.

A juventude como portadora da palavra modernista

No último post da ocupação virtual Modernismo rede social é como se chegássemos ao fim de uma volta decisiva numa espécie de corrida de revezamento, em que o bastão da liderança do modernismo é, enfim, passado ao próximo corredor. O modernismo se fez movimento irradiando-se em várias direções e sentidos, do Sul ao Norte, entre litoral e sertão, além da fronteira nacional. O chão de ferro de Minas Gerais, porém, se mostraria particularmente fecundo às sementes modernistas que Mário de Andrade vinha germinando em diferentes lugares. No entre-lugar das Minas se abriram as veredas tanto da nacionalização quanto da cosmopolitização do modernismo e seu legado. A força gravitacional de Mário em Minas alcançaria por cartas o círculo intelectual da revista Verde, de Cataguases, mediada por um Drummond àquela altura já inteiramente “curado” do mal de Nabuco e convertido em agente socializador do movimento. Entre rasuras e lapsos na (re)escritura das cartas, Mário seria prescrito como um phármakon na farmácia de Drummond, que no futuro faria publicar, num ato de inconfidência, as cartas que continham a “lição do amigo”, tornando-a de alguma forma perene e contemporânea a outras e futuras gerações. Afinal, bem compreendida a lição, a juventude seria a portadora social da potência da palavra modernista. Para ler o último post da ocupação, clique aqui.

Finale | Onde mora o modernismo? A caderneta de endereços de Ronald de Carvalho

A ocupação ainda traz a público, pela primeira vez, trechos da caderneta de endereços do poeta, ensaísta e diplomata carioca Ronald de Carvalho (1893-1935), aqui apresentada em primeira mão por André Botelho. A caderneta figura como dispositivo central da nossa ocupação virtual e ponto de fuga do movimento cultural. Afinal, entre muitas outras funções esperadas, ela guarda justamente os destinatários da correspondência que foi uma das principais formas de ação comunicativa entre os modernistas e deles com a sociedade brasileira. Trata-se, portanto, de um arquivo modernista, que sobreviveu a um expurgo feito pelo governo Vargas após a morte do poeta, e chega a nós com preciosas anotações pessoais – como listas de palavras, citações, esboços de poemas, entre outras – e endereços que fazem da caderneta um documento único do gênero e um verdadeiro “quem é quem” do modernismo brasileiro. Para ler o post, clique aqui.

Seminários de Trabalho 2021

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

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Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Seminários de trabalho 2021

Ao longo de seu primeiro ano, o projeto Minas Mundo propôs uma série de seminários de trabalho envolvendo diversos temas e grupos de pesquisadoras e pesquisadores da rede. As conversas fizeram parte das atividades internas do projeto, sem transmissão pública, para estimular a participação de todas e todos. É possível assistir uma dessas rodadas, no entanto, publicada nesta mesma seção do nosso portal, clicando aqui. Abaixo, a arte com a programação anual de 2021.

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

A roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’ aconteceu no oitavo dia do Festival de Inverno, e teve como participantes Sérgio Bairon, Roniere Menezes e Marília Librandi. O assunto foi o princípio da aproximação entre literatura e culturas de tradição oral, estabelecendo uma analogia entre as cantorias do ritual da Coroação de Reis Congo, em Minas Gerais, e a “escrita de ouvido” de João Guimarães Rosa em “O Recado do Morro” (1956).

Marília e Sérgio também foram responsáveis pela elaboração das “texturas sonoras” executadas durante o festival. São faixas de áudio que procuram aprofundar o encontro entre literatura e oralidade, superlativizando a escuta, ou seja, a escuta da escritura de Guimarães e a escuta da leitura de sua obra, somadas à escuta do Ritual Coroação de Reis Congo, que perpassa “O Recado do Morro”.

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

A roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’ aconteceu no sétimo dia do Festival de Inverno, e teve como participantes Wander Melo Miranda, Marília Rothier Cardoso e Eneida Maria de Souza. O assunto foi a obra memorialística de Pedro Nava e o livro de memórias Menino sem passado, de Silviano Santiago.

Lidos a partir de duas metáforas, respectivamente, restauração e enxertia, os livros revelam modalidades distintas de escrita, ora voltada para a ideia da reminiscência como complemento (Nava), ora suplemento (Santiago), delineando perspectivas discursivas distintas de elaboração da história pessoal do memorialista e da história social brasileira.

Além disso, no vídeo abaixo, você confere a textura sonora ‘Col a Col, Cantarol’ elaborada por Marília Librandi e Sérgio Bairon especialmente para o Festival.

00:00 – Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’ / 01:36:21 – Palestra Rever Makunaíma, por Jaider Esbell / 02:42:29 – Roda de conversa ‘Sertão Mundo: os desafios da montagem de uma exposição virtual’ / 03:38:32 – Textura sonora Col a Col, Cantarol

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

A roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’ aconteceu no sétimo dia do Festival de Inverno, e teve como participantes Alexandre Faria, Júlio Diniz e Roniere Menezes. O assunto foi a relação entre literatura e música popular, tendo como objeto as obras de escritores, poetas e cancionistas que trazem em seus trabalhos questões que dialogam com as temáticas da cultura popular, da modernidade brasileira e do cosmopolitismo.

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

A roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’ aconteceu no sexto dia do Festival de Inverno, e teve como participantes Maurício Hoelz, Paulo Maciel e Sabrina Parracho Sant’Anna. O assunto foi o Atlas Minas Mnemosyne Mundo, disponível no nosso portal: um espaço de interação visual para a construção coletiva de um repertório imagético das múltiplas conexões Minas–Mundo, a partir das vivências e perguntas das/dos pesquisadoras/es da rede Minas Mundo e do público.

Livremente inspirado no notável e inconcluso projeto de Aby Warburg, o Atlas pretende mapear o processo de mudança e permanência da cultura. Assim, criando um conjunto de painéis que combina imagens anacronicamente segundo uma lógica metonímica, revela a sobrevivência de gestos e motivos comuns na história da imaginação humana, rompendo com a linearidade que caracteriza a história da arte convencional.

Roda de conversa ‘A memória e o mundo: Arcadio Díaz-Quiñones, a brega e a memória rota’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘A memória e o mundo: Arcadio Díaz-Quiñones, a brega e a memória rota’

A roda de conversa ‘A memória e o mundo: Arcadio Díaz-Quiñones, a brega e a memória rota’ aconteceu no sexto dia do Festival de Inverno, e teve como participantes Arcadio Díaz-Quiñones, Andre Veiga Bittencourt e Pedro Meira Monteiro. O assunto foi o trabalho do crítico caribenho, em especial sobre os conceitos de “memória rota” e a “arte de bregar”. Num mundo imerso na comunicação incessante, o que se escolhe lembrar, e por quê? Como se negocia o espaço do sujeito diante da colonização da memória e do poder?

Além disso, no vídeo abaixo, você confere a textura sonora ‘Bem que o povo fala…’ elaborada por Marília Librandi e Sérgio Bairon especialmente para o Festival.

00:00 – Roda de conversa ‘A memória e o mundo: Arcadio Díaz-Quiñones, a brega e a memória rota’ / 01:40:54 – Roda de conversa ‘Epistemicídio’ / 02:40:27 – Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’ / 04:02:45 – Textura sonora ‘Bem que o povo fala…’ / 04:10:59 – Diálogos: Artista e Curador(a): ‘Alphabeto’, de Mário Zavagli

Roda de conversa ‘Exuzilhadas: uma conversa com Cidinha da Silva’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘Exuzilhadas: uma conversa com Cidinha da Silva’

A roda de conversa ‘Exuzilhadas: uma conversa com Cidinha da Silva’  aconteceu no quinto dia do Festival de Inverno, e teve como participantes Cidinha da Silva e Pedro Meira Monteiro. O assunto foi o trabalho da autora, passando por sua formação literária, atividades pedagógicas e editoriais à frente da Kuanza Produções, o amor pelas formas breves, a relação entre a crônica e a ficção, a estética das africanidades, orixalidades e ancestralidades, a noção do tempo espiralar de Leda Martins e a relação entre literatura e cidadania.

Além disso, no vídeo abaixo, você confere a textura sonora ‘Outros eram os outros’ elaborada por Marília Librandi e Sérgio Bairon especialmente para o Festival.

00:00 – Palestra ‘Literatura, raça e representação’, por Jeferson Tenório / 01:11:12 – Palestra ‘A cena – um lugar de acontecimentos e de confluência’, por Maria Thaís Lima Santos / 02:08:23 – Roda de conversa ‘Exuzilhadas: uma conversa com Cidinha da Silva’ / 03:35:59 – Textura sonora ‘Outros eram os outros’

Roda de conversa ‘A poesia, ninguém segura mais’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘A poesia, ninguém segura mais’

A roda de conversa ‘A poesia, ninguém segura mais’ aconteceu no quarto dia do Festival de Inverno, e teve como participantes André Botelho e Eduardo Coelho. O assunto foi o trabalho como antologista e crítica cultural de Heloisa Buarque de Hollanda, especialmente em torno do lançamento de As 29 poetas hoje (Companhia das Letras, 2021).

Além disso, no vídeo abaixo, você confere a textura sonora ‘Estrela Guia’ elaborada por Marília Librandi e Sérgio Bairon especialmente para o Festival.

00:00 – Roda de conversa ‘Memória 1972: comemorações dos 50 anos do Modernismo’ / 01:36:17 – Roda de conversa ‘A poesia, ninguém segura mais’ / 02:38:39 – Roda de conversa ‘Ecos e desvios do modernismo’ / 04:02:58 -Textura sonora ‘Estrela Guia’

Roda de conversa ‘Mário de Andrade, modernista mineiro’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Roda de conversa ‘Mário de Andrade, modernista mineiro’

A roda de conversa ‘Mário de Andrade, modernista mineiro’ aconteceu no terceiro dia do Festival de Inverno, e teve como participantes André Botelho, Helena Bomeny e Maurício Hoelz.

Além disso, no vídeo abaixo, você confere o curta MMM – Modernismo por Minas Mundo (também disponível na seção vídeos do portal) e duas Texturas sonoras elaboradas por Marília Librandi e Sérgio Bairon especialmente para o Festival.

00:00 – Roda de conversa ‘Poéticas Insurgentes’ / 01:37:27 – Performance de Jaider Esbell / 02:31:55 – Roda de conversa ‘Mário de Andrade, modernista mineiro’ / 04:02:32 – Filme ‘MMM – Modernismo por Minas Mundo’ / 04:12:42 – Textura sonora ‘Você Vai Lá pro Sertão’ / 04:14:26 – Textura sonora ‘Afinação na Encruzilhada’

Abertura Oficial e Palestra ‘Menino sem passado em pauta’, com Silviano Santiago e Eneida Maria de Souza

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Texturas sonoras: Guimarães Rosa e a cultura oral’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Restauração e enxertia: formas da memória em Pedro Nava e Silviano Santiago’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Literatura e música popular: Minas, modernidade e cosmopolitismo’

Novembro 10, 2021

Roda de conversa ‘Atlas Minas Mnemosyne Mundo’

Abertura Oficial e Palestra ‘Menino sem passado em pauta’, com Silviano Santiago e Eneida Maria de Souza

Solenidade Oficial de Abertura do 53º Festival de Inverno UFMG e, em seguida, a palestra ‘Menino sem passado em pauta’, com o escritor Silviano Santiago e a coordenadora do Minas Mundo Eneida Maria de Souza.

00:00 – Solenidade de Abertura Oficial do 53º Festival de Inverno UFMG / 51:16 – Palestra ‘Menino sem passado em pauta’ / 2:11:07 – ‘Passar poesia – encontro com Arnaldo Antunes’

MMM – Modernismo por Minas Mundo

Novembro 8, 2021

MMM – Modernismo por Minas Mundo

MMM – Modernismo por Minas Mundo

Um curta produzido especialmente para a 53a edição do Festival de Inverno da UFMG, de que o Minas Mundo participou como co-curador. O vídeo aborda o Modernismo como movimento cultural, com base nas falas de pesquisadoras e pesquisadores do projeto, captadas em gravações de videochamadas para o evento online. Viajando de São Paulo a Minas Gerais, se misturam passado, presente e futuro nas lutas por democratização da cultura e da sociedade brasileira.

Direção: Fábio Seixo / Argumento: André Botelho e Maurício Hoelz / Assistência de produção: Lucas van Hombeeck

XIX XX XXI 22: Independência, modernismo e futuro-passado do Brasil

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Bernardo Ricupero, Lilia Schwarcz e Roberto Said

XIX XX XXI 22: Independência, modernismo e futuro-passado do Brasil

Em comemoração ao aniversário de um ano do projeto Minas Mundo, propusemos a mesa XIX XX XXI 22: Independência, modernismo e futuro-passado do Brasil. O evento aconteceu no dia 29 de outubro de 2021 com a participação de Bernardo Ricupero (USP), Lilia Schwarcz (USP/Princeton) e Roberto Said (UFMG) e mediação de Fernando Mencarelli (DAC-UFMG).

Ao soprar as velinhas de aniversário do Minas Mundo, nosso desejo é incitar uma reflexão crítica sobre os legados de 1822 e 1922 – Independência e Semana de Arte Moderna – para os projetos de Brasil de 2022, compondo uma espiral histórica e encruzilhada da nossa sociedade.

O turista aprendiz

Pedro Jardim

O turista aprendiz

Esta galeria une as fotos tiradas por Mário de Andrade em sua viagem à Amazônia em 1927 às minhas, tiradas em 2015. “O turista aprendiz”, como Mário se intitula em seu relato de viagem à região, através de sua câmera, mais do que registrar, constrói um olhar sensível e artístico sobre “esse mundo de águas”, a Amazônia. O fotógrafo amador, seguindo o poeta, intelectual e homem público que foi Mário, não se interessa somente pelo colecionamento de elementos da cultura popular, mas acima de tudo, interessa-se por conferir dignidade e reconhecimento aos atores sociais. Minhas fotografias, também amadoras, buscam se relacionar com as tiradas pelo modernista a partir da categoria “sobrevivências”: o que insiste em sobreviver a despeito do desmantelamento crescente das políticas públicas de proteção à floresta e aos povos que nela habitam?

Enlace de gerações

Alexandre Pereira e João Mello

Enlace de gerações

O painel busca enlaçar romantismo, modernismo e a juventude com quem Mário de Andrade tanto dialogou em sua vida. O modernismo, assim como o romantismo brasileiro, toma como uma de suas tarefas pensar o Brasil. Entretanto, não busca repetir o exemplo do romantismo, mas aprender com suas lições e traçar seu próprio caminho, tendo em vista seu contexto e os problemas dali derivados. Um dos traços distintivos que marcam a pesquisa de Mário sobre o Brasil é sua ênfase em um projeto coletivo e colaborativo, embora não necessariamente consensual. Daí seu apelo à juventude e sua intensa atividade em estabelecer contato com os mais diversos artistas.
Nesse sentido, a composição busca enlaçar essas gerações, tornar evidente o que o tempo tornou disperso, unindo diferentes pontas. Dando forma, por meio de imagens, ao projeto coletivo – não consensual e com uma multiplicidade de sentidos – de expressar, formar e dar forma ao local do sentimento, tornando-o também lugar de pensamento.

Ouro Minas

Alice Ewbank

Ouro Minas

A riqueza do ouro das Minas Gerais na riqueza das formas, imagens e movimentos da arquitetura religiosa; dos entalhes, dos retábulos, dos altares, dos forros e dos santos do deslumbramento do barroco e do rococó mineiro. Pensar sobre as Minas Gerais é, para mim, novamente percorrer a viagem afetiva e histórica em família, conduzida pelas aulas do pai historiador da arte, pelas cidades da Estrada Real: Ouro Preto, Mariana, Sabará, Tiradentes, São João Del Rey e Congonhas. A montagem da galeria de imagens da memória reúne lado a lado as fachadas brancas das igrejas com seus relevos particulares de cantaria, com frontões que ora prenunciam, ora disfarçam os santuários de ouro que seus interiores descortinam. Galeria virtual que assoma tal um quadro de Guinard, outro viajante afetivo das Minas Gerais, onde as igrejas-pérolas se revelam múltiplas, brilhantes, no mar de morros das Minas/neblinas/nuvens/Gerais.

“Onde a luz guarda a sombra e comove”

Rennan Pimentel

“Onde a luz guarda a sombra e comove”

As esculturas forjadas em ferro mineiro de Amilcar de Castro levaram Minas para o mundo.

“A escultura é a descoberta da forma do silêncio onde a luz guarda a sombra e comove.”

– Amilcar de Castro.

 

A ideia dessa galeria surge a partir de um diálogo com o vídeo-manifesto do MinasMundo.  Nele uma fala do escultor mineiro sobre sua obra é lembrada: “A linha reta é como um corte da escultura, é um espaço da matéria na chapa de ferro; esse espaço, de certa maneira, introduz o espaço externo no material, ele atravessa a chapa”. Assim, o objetivo foi mostrar esse enlace da obra com o ambiente a partir de registros pessoais e imagens das esculturas na paisagem mundo afora e ao alcance dos olhos nas buscas na internet.

As esculturas aberturas em ferro mineiro e aço corten feitas em cortes e dobras fazem um jogo com o registro fotográfico a partir de cada ângulo que se vê, produzindo uma ilusão entre o fotógrafo, a câmera e a paisagem. Em certos momentos, há a sensação de que a obra incorporou a paisagem para si, uma vez que envelhecem com o tempo e acompanham a história do ambiente.

As esculturas, que lembram uma folha de papel cortada e dobrada, incorporam o vazio por onde a luz penetra, guardam a sombra e comovem o ambiente. Suas obras expõem seu caráter cosmopolita, dialogam com o ambiente, enferrujando e tornando-se um testemunho da ação da natureza e da sociedade.

Vago registro de peças artesanais acumuladas sem enredo em um canto de Minas

Alex Mazurec

Vago registro de peças artesanais acumuladas sem enredo em um canto de Minas

As imagens são de um breve instante na Oficina de Ourives Santíssima Trindade, em Tiradentes (MG).

Na fachada é uma loja de artesanato comum, contudo, atrás dos balcões turísticos, descobrem-se sucessivas salas de oficinas ou depósitos, onde dormem uma empoada exposição, docemente iluminada pelas claraboias, cuja lúdica atmosfera as câmeras pouco conseguem transmitir. Pilhas, estantes, varais, mesas e peças interpostas acabam por retratar sucessivas modas da decoração popular: madeira, lata, vidro, sucata, novos, infantis, caros, vulgares, industriais, todos convivendo em livre esquecimento, competindo aos gritos das cores brutas, por um lugar na memória.

Milhos Gerais – Cosmopolitismos Rurais

Joana Ramalho Ortigão Corrêa

Milhos Gerais – Cosmopolitismos Rurais

Cosmopolitismos Rurais. Milho Verde. Minas Verdes. Milhos Gerais. Minas das Águas. Milho das Águas Vertentes do Cerrado. Uma roça cosmopolita no alto das águas nascentes do Jequitinhonha, há 21 anos confluindo e vertendo culturas a partir dos encontros entre saberes tradicionais e linguagens artísticas criativas e autorais.

O Encontro Cultural de Milho Verde é um festival que dissolve fronteiras e sintetiza a cena contemporânea do mundo rural cosmopolita. É realizado há 21 anos, no distrito de Milho Verde, em Serro, no Alto Jequitinhonha. Milho Verde é um baú de riquezas culturais, históricas e naturais no Cerrado, repleto de cachoeiras. Terra de convergência de povos, guarda camadas densas de sonoridades, saberes e fundamentos tradicionais e quilombolas. Durante os encontros, artistas visitantes misturam suas artes às culturas locais ancestrais e à pulsante criação de artistas residentes, brasileiros e latino-americanos. São 21 anos de dedicação coletiva ao fazer cultural do interior – popular, tradicional, cosmopolita, mineiro, rural, quilombola, latino, contemporâneo – em reencontros de arte e amizade. A região vem sofrendo com a ameaça de entrada de projetos minerários predatórios. E os encontros culturais se tornaram também momentos de resistência em defesa das águas vertentes do Cerrado, das comunidades rurais e quilombolas, dos patrimônios culturais da região e das paisagens exuberantes.

Pequeno estudo para sobrevivência pagã no barroco

André Botelho

Pequeno estudo para sobrevivência pagã no barroco

Em memória de Maria Helena Coelho.

Caberia começar por Minas Gerais, por certo. Os Atlantes do Aleijadinho da Igreja da Ordem Terceira do Carmo de Sabará? Trago outros mundos. Parte de outro roteiro barroco, mundo vasto mundo. Do Recôncavo baiano à Costa do Malabar indiana, passando pelo Rio de Janeiro e pela doce Paraíba.

Primeiro, a papeleira indo-portuguesa cujos pés me pareceram “sereias indianas” – já que traziam caudas de peixes e o “bindi” – o ponto sagrado utilizado nas testas por mulheres indianas. Anos depois, casualmente, percebi figuras semelhantes esculpidas em madeira nos altares de templos católicos espalhados pelo Nordeste. Na minha cidade, com espanto, identifiquei as mesmas figuras. Na igreja de Santa Rita, na esquina da Rua Miguel Couto, ela aparece desenhada no mosaico de mármores que guarnece o lavabo da sacristia – para onde cariocas de outros tempos acorriam buscando curas milagrosas que as suas águas vertiam.

E os exemplos foram se multiplicando, mas, a partir daí, não mais casualmente, já que munido da câmera de celular passei a perseguir indícios e recorrências em templos católicos dentro e fora do Brasil. No Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa descobri seu nome: nagina. Figuras secundárias do panteão pagão hindu que habitam as águas e se relacionam com os deuses, nomeadamente Vishnu – o deus maior do hinduísmo.

Brasil e Índia foram partes de um mesmo império lusitano e os muitos sincretismos culturais operados pelos portugueses pareciam suficientes para explicar a recorrência aqui e lá dessas espécies de guardiãs de templos, com historiadores da arte apontando inclusive certa domesticação, com a cauda da serpente adquirindo a aparência mais familiar europeia da cauda de peixe/sereia entre os católicos. Todavia, quando por lá os portugueses chegaram, com seu cristianismo latino paulino, a cultura hindu já estava assentada no substrato religioso dos Cristãos de São Tomé, grupo etnorreligioso da Costa do Malabar, cujas origens remontariam também aos primórdios do cristianismo – eles são assim autonomeados por terem sido, segundo a tradição, evangelizados pessoalmente pelo apóstolo São Tomé no ano de 52.

Meu exercício warburguiano para o AtlasmnemosyneMinasMundo busca, assim, trazer sobrevivências imagéticas num jogo de recorrências, reminiscências, deslocamentos. Como sugere Aby Warburg em relação ao que o artista renascentista talvez buscasse na antiguidade pagã, desconfio que, também no caso das naginas, não se trata exatamente de “representar” serenidade e harmonia, mas antes de “exprimir” dor e movimento. Pathosformeln (“fórmulas de páthos”), padrões gestuais e simbólicos que dariam forma às experiências cruciais vividas nas mais diferentes épocas – e lugares.

* * *

Extrapolo. Pensando em naginas que habitam as águas, e no Rio de Janeiro são guardiãs de uma fonte barroca de águas milagrosas, lembro a “santa sem um dos pés” do romance O outro pé da sereia, de Mia Couto. A imagem encontrada na beira de um rio liga o passado e o presente de Moçambique: ela é a mesma que viajou, em 1560, com o jesuíta Gonçalo da Silveira, ao partir de Goa, do outro lado do Índico, para converter ao cristianismo o imperador do Reino do Ouro, ou Monomotapa. Nossa Senhora para os portugueses, a imagem era chamada de Kianda, uma divindade das águas, pelos escravos da nau; os africanos a tratariam por Nzuzu, rainha das águas doces. Claro, poderia chegar à sereia em Grande Sertão: Veredas, mas, não o farei. A voluta é uma espiral, não um círculo.

Afromnemosyne: o corpo, a dança, as mãos, o olhar

Roniere Menezes

Afromnemosine: o corpo, a dança, as mãos, o olhar

A ideia da montagem partiu da lembrança de trecho de carta de Mário de Andrade a Carlos Drummond em que Mário trata da dançarina que vira desfilar no carnaval do Rio de Janeiro, totalmente entregue aos movimentos. Procurei imagens que mostrassem artistas imersos em sua performance. Durante a pesquisa, percebi que diversas pinturas, fotografias, diversos desenhos mostravam artistas concentrados(as), alheios(as) ao mundo ao redor e, ao mesmo tempo, com os braços e os olhares dirigidos ao alto, como se os braços funcionassem como antenas, galhos de árvores a sustentar um céu que não pode cair, e os olhos pedissem, aos céus, bênçãos, inspiração e força para a continuidade da luta cotidiana. O corpo brinca, ginga, e os pés do artista, da artista pisam com delicadeza a terra, como bom sambista a acariciar o chão em que dança e de onde extrai energia vital. As imagens selecionadas são um recorte dos textos encontrados. A relação entre as imagens sugere sobrevivências da gestualidade ancestral aberta ao devir. Foram selecionados também alguns trechos de poemas, narrativas, quadras populares e sambas de autores mineiros. Em diálogo com as imagens, os textos de literatura e canção almejam ampliar nossa percepção sobre o tema tratado.

“Uns negros dançando o samba. Mas havia uma negra moça que dançava melhor que os outros. (…) Ela me ensinou a felicidade.”
(Mário de Andrade – Carta a Drummond)

“Deus me abandonou
no meio da orgia
entre uma baiana e uma egípcia.”
(Carlos Drummond)

“A alegria de meu povo explode
Em charamelas, trombetas e gaitas,
Rouqueiras de estrondo e júbilo,
Canções e danças pelas ruas.”
(Carlos Drummond)

“Na viola do urubu
O sapo chegou no céu.
Quanto pego na viola
O céu fica sendo meu.”
(Quadra de Sagarana – Guimarães Rosa)

“Dentro das alas, nações em festa
Reis e rainhas cantar
Ninguém se cala louvando as glórias
Que a história contou”
(Milton Nascimento)

“Era um, era dois, era cem
Mil tambores e as vozes do além”
(Milton Nascimento e Márcio Borges)

“Morro velho, senzala, casa cheia
Repinica, rebate, revolteia”
(Milton Nascimento e Márcio Borges)

“Na casa aberta
É noite de festa
Dançam Geralda, Helena, Flor
Na beira do rio
Escuto Ramiro
Dona Mercês toca tambor”
(Flávio Henrique e Chico Amaral)

“Sá rainha chamou ê viva, ê viva!
Com chicote na mão: ê viva, ê viva!
Eu não sou de apanhar, eu não sou nego dela
Eu não vou lá, eu não vou lá!”
(Maurício Tizumba)

“Baiana é aquela que entra no samba de qualquer maneira
Mexe, remexe, dá nó nas cadeiras
E deixa a moçada com água na boca”
(Geraldo Pereira)

“Quero morrer numa batucada de bamba
Na cadência bonita do samba”
(Ataulfo Alves)

“Minha vida é essa
Subir Bahia e descer Floresta”
(Rômulo Paes)

“Em Minas Gerais, tem ferro, tem ouro, tutu
Tem gado Zebu,
Tem também, umas toadas,
Alma sonora das quebradas
Encantos das noites de luar”
(Ary Barroso)

“Na Avenida da Paixão
Meu peito não desfila mais,
Tu serás porta-bandeira
Que eu vou pra Minas Gerais”
(Wander Lee)

“Diz um diz que viu e no balaio viu também
Um pega lá no toma-lá-dá-cá do samba”
(João Bosco)

“A multidão me revela, assim, que há coisas extraordinárias, vibrações estranhas, há um mundo diverso do meu e com o qual tentarei, em vão, comunicar-me.”
(Ciro dos Anjos)

“Quem foi que fez brasileiro bater
Tambor de jongo?
De onde é que sai quem batuca com o pé
Terno-de-Congo?
Quem é, me ensina quem foi
Que fez o povo dançar
Tambor-de-Mina, Bumba-meu-boi,
Boi-bumbá,
O bambaquerê,
O samba, o ijexá,
Quando o Brasil resolveu cantar?”
(Sérgio Santos e Paulo Sérgio Pinheiro)

Todos os rios levam a Minas

Paulo Maciel

Todos os rios levam a Minas

O painel deve ser visto como uma espécie de paráfrase do ditado: “Todas as estradas levam à Roma”.  Acredita-se que ele pode ser referido a um monumento erguido por volta de 20 A.C. chamado “Marco Dourado”, usado como ponto de referência para viajar por todo o Império Romano – ponto de partida/chegada. O marco dourado aqui é a nascente do Rio São Francisco. Dessa forma, o painel funciona como uma metáfora que apresenta certa semelhança com o fluxo de ideias, as trocas culturais, as diversas matrizes e encruzilhadas mundiais que caracterizam as Minas Gerais.

Sinuosidades: Pathosformel mineiro e suas replicações

Luis Felipe Hirano

Sinuosidades: Pathosformel mineiro e suas replicações

A palavra Minas
Carlos Drummond de Andrade

Minas não é palavra montanhosa
É palavra abissal
Minas é dentro e fundo
As montanhas escondem o que é Minas.
No alto mais celeste, subterrânea,
é galeria vertical varando o ferro
para chegar ninguém sabe onde.
Ninguém sabe Minas. A pedra
o buriti
a carranca
o nevoeiro
o raio
selam a verdade primeira,
sepultada em eras geológicas de sonho.
Só mineiros sabem.
E não dizem nem a si mesmos o
irrevelável segredo
chamado Minas.

As sinuosidades das montanhas, estradas, minas, relevos e gestos parecem constituir uma espécie de Pathosformel mineiro. Tais linhas curvas ganham replicações no cinema, na fotografia, nas artes plásticas e na arquitetura mineira e brasileira. Esse painel busca estabelecer montagens que expressam essas sinuosidades.

O modernismo de Mário Peixoto e a genealogia da decadência

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Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

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Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Denilson Lopes

O modernismo de Mário Peixoto e a genealogia da decadência

A partir de sua pesquisa em desenvolvimento sobre Mário Peixoto, Denilson persegue um modernismo da experiência da decadência, tanto do ouro em Minas Gerais quanto do café no vale do Paraíba. Essas ruínas, segundo ele, se juntam a um imaginário decadentista numa configuração moderna (e modernista) distinta do ethos vanguardista (e de valores como ruptura, transgressão, busca do novo estabelecido a partir de manifestos programáticos). E que, portanto, pouco ou nada tem a ver com o modernismo de 1922 e suas derivações históricas vencedoras, como a antropofagia.

A partir de uma perspectiva genealógica, sua hipótese é que poderíamos ter como chave de leitura um “outro modernismo”, marcado pela catástrofe ao invés da utopia; pela melancolia ao invés da alegria; pela sensação de fim do mundo, ou de “um” mundo, ao invés da inauguração de uma nova era; pela lentidão que advém depois do fim e de paisagens rurais devastadas e solitárias, em detrimento da velocidade e da hipersensorialidade das grandes cidades (em que o local se articula com o cosmopolitismo, mas não com projetos nacionais e interessados na consolidação de um campo intelectual). Nesse sentido, num diálogo entre cinema, artes visuais, teatro e literatura, biografia e vida cultural, a prosa vai passar por alguns artistas atuantes a partir dos anos 1930, como Cornelio Penna, Oswaldo Goeldi, Lucio Cardoso, Jorge de Andrade, bem como Autran Dourado, Farnese de Andrade, Paulo Cesar Saraceni, entre outros.

Três missivistas mineiros: modernismo, sociabilidades e arquivos da formação

Rodrigo Jorge Ribeiro Neves

Três missivistas mineiros: modernismo, sociabilidades e arquivos da formação

Em 15 de janeiro de 1926, Pedro Nava escreve carta a Mário de Andrade, em que lhe agradece o recebimento de fotografias dos quadros de Tarsila do Amaral que faziam parte do acervo do escritor paulista. Como parte de seu empenho pedagógico, voltado em especial aos moços, Mário remete ao então jovem poeta e desenhista mineiro alguns dos exemplares das tendências da arte moderna naquele tempo, discutindo outros procedimentos e referências estéticas ao longo da correspondência. Outro integrante dos “Intelectuais da Rua da Bahia”, ou “Grupo do Estrela”, Carlos Drummond de Andrade, pouco depois da passagem da Caravana Paulista por Minas Gerais, em 1924, resgata o contato com Mário, por meio de carta em outubro desse ano, a fim de “prolongar aquela furtiva hora de convívio com seu claro espírito”. Além da profunda e mútua relação intelectual e afetiva, o diálogo também ensejou a constituição do papel de Drummond como elemento difusor e aglutinador entre os outros jovens intelectuais mineiros. Por fim, destaco a figura de Rosário Fusco, em especial quando se muda de Cataguases, Minas Gerais, para o Rio de Janeiro e se torna membro da Casa do Estudante do Brasil (CEB), onde se aproxima do então esquerdista Carlos Lacerda. Fusco contribui decisivamente para a aproximação de Lacerda com Mário de Andrade e na organização de uma das primeiras conferências do escritor paulista na então capital federal.

A presença de Mário de Andrade como fator entre os três escritores se deve tanto pela sua representatividade no modernismo quanto na configuração das sociabilidades por meio dos missivistas mineiros. Entretanto, os diálogos epistolares expõem também a importância da mobilização dos mineiros em seus respectivos espaços de atuação intelectual e política, não apenas como agenciadores programáticos, mas também como proponentes de ideias e referências. Além de espaço de construção e encenação das personæ do sujeito, a carta se mostra, assim, como um “arquivo da formação”. Portanto, com este projeto pretendo discutir os modos como se articulam os papéis desses correspondentes no modernismo, considerando também, ao longo da pesquisa, outros missivistas, haja vista o caráter remissivo do gênero epistolar, de modo a contribuir para o debate sobre as relações entre o localismo e o cosmopolitismo na cultura brasileira.

“Para onde nos atrai o azul?”

Sabrina Parracho Sant’Anna

“Para onde nos atrai o azul?”

“Para onde nos atrai o azul?”, perguntava-se o narrador de Guimarães Rosa antes de calar-se diante da teoria da alma elaborada por Zito no quarto prefácio de Tutaméia. Elegi para este painel, a cor que habita os tetos das igrejas de Mestre Ataíde, mas também o céu contrastante na terra vermelha do ferro mineiro e a azulejaria de Portinari na Igreja da Pampulha. Não há apenas um, mas muitos páthos na arte contemporânea mineira. A tela sem moldura de Lygia Clark. A busca de Ana Pi pela ancestralidade africana no cosmopolitismo da dança contemporânea. O barroco perverso de Farnese de Andrade e Eder Santos. O azul é um convite para aproximações e afastamentos, continuidades e rupturas, memórias e matérias.

Ambiente, mineração e cultura em Minas Gerais: risco e resistência ao Projeto Serro

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Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Joana Corrêa, Lorena Fleury, Juliana Deprá e Rodrigo Santos

Ambiente, mineração e cultura em Minas Gerais: risco e resistência ao Projeto Serro

Mesa pública composta pelos pesquisadores Joana Corrêa (IMV/Serro, MG), Lorena Fleury (UFRGS) e Rodrigo Salles P. Santos (UFRJ), além da convidada Juliana Deprá (MAM-MG/ Movimento pela Soberania Popular na Mineração).

MinasMundo Negra

Agosto 18, 2023

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Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Flávio Gomes, Lilia Schwarcz e Daniela Siqueira

MinasMundo Negra

Conversa sobre a fundamental Enciclopédia Negra (Companhia das Letras, 2021) com os autores – e pesquisadores do projeto – Flávio Gomes (UFRJ) e Lilia Schwarcz (USP e Princeton), coordenada por Daniela Siqueira (UFMS). A live é parte da nossa ocupação virtual em maio com verbetes de personagens mineiras da Enciclopédia.

Seminário de Trabalho: Cultura popular e afro-mineiridade

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Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Joana Corrêa, Oswaldo Giovannini Jr. e Sérgio Bairon

Cultura popular e afro-mineiridade

Primeira sessão da agenda 2021 de Seminários de Trabalho do Projeto MinasMundo, realizada em 4 de maio, às 17h. Nela tivemos como expositores Joana Ramalho Ortigão Corrêa (IFNMG-Diamantina), Oswaldo Giovannini Jr. (UFPB) e Sérgio Bairon (USP); e como debatedores Maria Laura Cavalcanti (UFRJ) e Marília Librandi (Princeton University).

MinasMundoMulher: três aulas

Agosto 18, 2023

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Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Eneida Maria de Souza; Elide Rugai Bastos & Mariana Chaguri; Helena Bomeny

MinasMundoMulher: três aulas

Como parte das ações de março da frente MinasMundoMulher, publicamos três aulas ministradas no curso MinasMundo: o cosmopolitismo na cultura brasileira oferecido por André Botelho no PPGSA do IFCS/UFRJ: Modernismo tardio e cosmopolitismo, por Eneida Maria de Souza; Cosmopolitismo e gênero, por Elide Rugai Bastos e Mariana Chaguri; e Cidade, república, mineiridade, por Helena Bomeny.

Drummond residual

Clara Rowland

Drummond residual

Partindo de uma leitura das diferentes figurações e configurações do fantasma na obra de Drummond, esta proposta procura sondar a relevância da espectralidade para a poética do autor através da interrogação cruzada de duas linhas de investigação: 1) o vínculo entre infância, Minas, interpelação e enigma; 2) a articulação entre uma poética da catacrese, fundada sobre a interrogação de palavras incorrespondentes, e a inscrição de restos ou resíduos como formas espectrais (e resistentes) da poesia de Drummond.

MinasMundo Dados: A menina mineira que calculava

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Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Triangulação sobre o vídeo-manifesto

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Fabio Seixo, Marco Antonio
Gonçalves & Schneider Carpegianni

Triangulação sobre o vídeo-manifesto

Conversa triangulada entre Fábio Seixo, diretor do vídeo-manifesto, Marco Antonio Gonçalves (UFRJ), pesquisador do MinasMundo e especialista em antropologia do cinema e da imagem, e Schneider Carpeggiani, editor do Suplemento Pernambuco. A prosa passa pelo filme como produto e processo, discutindo a montagem de elementos da cultura mineira que incorporam o sentido cosmopolita dos “movimentos e aberturas em várias direções” destacado pelo projeto e suas [maquin]ações.

Henriqueta Lisboa: poesia e cosmopolitismo

Agosto 18, 2023

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Cataguases-mundo: a revista Verde

Elide Rugai Bastos, Renata Farhat Borges, Reinaldo Marques & Wander Melo Miranda

Henriqueta Lisboa: poesia e cosmopolitismo

Esta ação da série minasmundomulher do mês de março – que destaca o trabalho e a luta das mulheres em minas e no mundo – debate a prática de um cosmopolitismo feminino em Henriqueta Lisboa, focando sua trajetória biográfica, as múltiplas faces de sua atividade intelectual – poesia, tradução, ensaísmo teórico-crítico, magistério – e a recente edição de sua obra completa.

MinasMundoMulher: afluentes

Agosto 18, 2023

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MinasMundoMulher: afluentes

Há associações limitadas sobre possibilidades de representação. Percebo muitas imagens com simetrias perfeitas e a prática vinculada a técnicas fotográficas. Encontro essa perspectiva ou a busca pelo acabamento demasiado plástico e digital: o creme de tempos de replicação imagética. Nada disso me interessa. Penso que o desenho pode se colar no real à vontade, é poderoso capturar, mas limitar a prática corpo-papel a um mote de retrato é uma redução. Desenhar é justamente cortar e expandir; são movimentos quase circulares de permanência para enxergar e revisitar. Abandonar os grandes pedestais chama as formas ao encontro. E ao deixar a regência de referências e insistir na fazibilidade, definimos afinidades técnicas e o inacabado entra como corpo no mote da materialidade. Por isso muito me alegra estar no trem MinasMundo, que oferece releituras, revisões e revisitações a um marco durante quatro anos.

Dou sequência ao nosso sopro, engrenagens e volutas mineiras e cosmopolitas trazendo o primeiro desenho de uma série chamada afluentes. Curiosamente, trago ao projeto uma imagem de águas e linhas contínuas no dia internacional da mulher logo depois de gestar um filho em panorama pandêmico. É evidente que reposicionar os órgãos internos e criar novos relacionamentos com a espessura do tempo é feminino, mas é também um ato de abertura de antropofagias da antropofagia para trabalhar com o redimensionamento das membranas, das fibras, dos mapas e de uma série de funções; e isso certamente não é só da mulher, é do mundo. Acredito que trazer elementos como afluentes, além dessa conversa, para o nosso projeto em 2021 é importante não apenas no viés da imagem, mas no que se refere a diversos tipos de prática de corte e colagem, de redimensionamento e zoom, para a compreensão de possibilidades e para pensarmos imagens e cultura integradas e tensionadas ao que é circunstancial e totalizante. Alongamos os eixos do real e as linhas que os olhos agarram e entendemos o que alcançar no encontro com o outro. Os afluentes entram como permanência e deslocamento de signos, de maneira que investigar imagens torna-se uma forma de azeitar novos mapas, cortar e expandir outras coisas tantas.

08.03.2021

Joana Lavôr

Guimarães Rosa, a cachaça e os labirintos da língua-fera

Maurício Ayer

Guimarães Rosa, a cachaça e os labirintos da língua-fera

A cachaça está presente em todo o território brasileiro e se reconhece como um elemento de unidade cultural do país. Também se espalha pela obra de João Guimarães Rosa, a começar pelos contos de Sagarana. Ali, no Corpo de Baile e no Grande Sertão: Veredas, participa como um ingrediente na hospitalidade dos vaqueiros e demais sertanejos do Norte de Minas Gerais. Há pistas que ajudam a conhecer o papel da cidade de Januária, centro de uma tradição cachaceira peculiar que se irradia em vasta região. Uma de suas características, o uso da umburana no envelhecimento da aguardente, influencia hoje a cachaça de todo o Brasil e mesmo outras bebidas, como a cerveja, mundo afora. Guimarães Rosa documenta essa tradição desde os anos 1930, época em que escreveu seus primeiros relatos.

Mas a cachaça é também eixo que faz rodar um espectro simbólico de raio mais amplo. Por um lado, atualiza a tradição alquímica da aguardente – aqua ardens, que se modaliza em aqua vitae e quintessentia –  e da destilação do processo fundamental na produção da Obra – uma das interpretações possíveis para a “hora e vez” de Augusto Matraga, para citar apenas um exemplo. Dialoga, portanto, com a tradição helenística e neoplatônica, tão presente na obra do autor mineiro. Mas Guimarães Rosa também situa a cachaça no centro de um embate que é fundador do chamado processo civilizatório brasileiro. Em “Meu tio, o Iauaretê”, publicada no livro póstumo Estas Estórias, a cachaça é a “abrideira” do labirinto da linguagem, território em que as personagens são suscetíveis a revelações e metamorfoses. Recoloca-se a discussão sobre o papel da cachaça como elemento introduzido na cena da dominação pelo apropriador da terra. Minas é aqui o lugar de uma fronteira sempre recolocada, no sertão e na alma (ou na linguagem) do caboclo, entre o onceiro e a onça, ou entre a aliança precária que faz do caboclo um onceiro e o sistemático sacrifício que o reincorpora como parente da onça.

Imaginários sociotécnicos, vocação mineral e desastre em Minas Gerais

Lorena Cândido Fleury

Imaginários sociotécnicos, vocação mineral e desastre em Minas Gerais

O extrativismo para exportação, em especial a mineração, possui em Minas Gerais estatuto ontológico: do seu nome às relações ecológicas, políticas, econômicas e institucionais, o estado é definido por uma “vocação mineral” que ao mesmo tempo o inscreve no multiescalar mundo das corporações transnacionais e determina os mundos possíveis de serem vividos por seus habitantes locais. Contudo, esse aparente determinismo vocacional encobre disputas e conflitos socioambientais que, se sempre estiveram presentes, apresentam uma nova magnitude em decorrência dos desastres-crimes envolvendo barragens de mineração em Mariana e Brumadinho.

É nesse contexto que o presente projeto de pesquisa se propõe a investigar os imaginários sociotécnicos presentes no cotidiano de reparação ambiental nos municípios atingidos pelo rompimento de barragens de rejeitos de mineração em 2015 e em 2019 em Minas Gerais. Para além das dimensões trágicas dos eventos, que juntos somam cerca de 300 mortes e um dano ambiental que se estende por toda a bacia hidrográfica do Rio Doce, a experiência de rompimento das barragens impõe a rearticulação de setores e grupos sociais heterogêneos. Empresários, técnicos, cientistas, atingidos, militantes de movimentos sociais e ambientalistas, diante do imperativo de recuperação ambiental, disputam narrativas e materialidades a respeito do passado, bem como a produção de possíveis futuros.

Os imaginários sociotécnicos presentes nos projetos de recuperação e reparação ambiental, entendidos não somente como a forma pela qual os sujeitos imaginam o ordenamento da vida social, mas também como articulam dentro desse ordenamento a ciência e tecnologia em projetos e práticas no mundo, nos permitem acessar os mundos desejáveis disputados pelos diferentes grupos sociais. Rastrear tais imaginários nos processos de reparação presentes permitirá, propõe-se, analisar a coprodução de sociedade (arranjos institucionais, conhecimentos, valores) e natureza (paisagens, ambientes, recursos) em curso, e, a partir dela, as inscrições e traduções de mundos passíveis de existir e de coexistir nas Minas Gerais.

MinasMundo no Rio: Nava cosmopolita

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Eneida Maria de Souza & Andre Bittencourt

MinasMundo no Rio: Nava cosmopolita

Abrindo em grande estilo nossa agenda 2021, Eneida Maria de Souza, professora emérita da UFMG e madrinha do MinasMundo, conversa com Andre Bittencourt (UFRJ) sobre um dos, se não o, maior memorialista brasileiro, Pedro Nava. Mineiro no Rio, Nava representa uma das mais emblemáticas expressões do deslocamento e da entrega a uma conflituosa condição de cidadania. O que se insinua, pela leitura de sua obra, ao lado de indagações sobre origens e genealogias, é a inquieta tentativa de definição de mineiridade, ao lado da reflexão sobre a natureza do carioca, uma vez que o Rio de Janeiro tornou-se a cidade de sua eleição. Ao eleger a capital fluminense detentora de aspecto cosmopolita e de espírito alegre, o escritor sela o pacto de cumplicidade com o caminho do mar, da abertura para a “serra do Mar abaixo”, complementar ao interior de Minas, outra vertente do Caminho Novo. Assista aqui.

“O Aleijadinho” e sua recepção histórica e crítica

Luiz Armando Bagolin

“O Aleijadinho” e sua recepção histórica e crítica

“O Aleijadinho”, assim, entre aspas, expressa não mais do que um conjunto de representações que não necessariamente tem como origem um indivíduo chamado Antônio Francisco Lisboa, supostamente um artífice, mulato, forro, que viveu em Vila Rica e seus arredores, entre o final do século XVIII e o início do XIX. Como representação, entre outras representações, “o Aleijadinho” é um conceito que seguiu com vida própria à medida que foi se institucionalizando no Brasil, desde meados do século XIX, a par de interesses políticos nacionalistas, em primeiro lugar, mercadológicos, depois, não correspondendo nunca a uma unidade psicológica indecomponível. A invenção do Aleijadinho na persona do entalhador Antônio Francisco Lisboa, que provavelmente circulou pelas Minas Gerais do XVIII, coube a Rodrigo José Ferreira Bretas (1814-1866), tendo investido a composição de sua biografia do escultor em gênero epidítico, que encomia obras e louva vidas, emulando ao mesmo tempo a célebre novela de Victor Hugo, O corcunda de Notre-Dame, que era uma predileção nas leituras do imperador Dom Pedro 2º.

Bretas, professor de retórica, foi hábil em montar uma biografia que move o leitor em direção à dor, sublime, da vida, deformada e finita, em confronto com a arte bela e infinda, operando por disjunções, quanto ao ethos, a composição do personagem Aleijadinho. Reúne, com os procedimentos retóricos do gênero referido, a menção ao Livro de Registros de Fatos Notáveis da Cidade de Mariana do Vereador José Joaquim da Silva, que teria sido publicado em 1790, porém desaparecido (ou talvez nunca escrito), como recurso a conferir-lhe a verossimilhança como verdade de prova.

O discurso de Bretas, por sua vez, comove por oxímoro, como o belo-feio, ou o monstro que faz maravilhas. Retém-se também nessa oposição um dos critérios para as antigas coleções de mirabilia, as maravilhas, os maravilhosos, por exemplo, onde se compõem, de acordo com a ordo naturalis, os caprichos e grotescos, os fantásticos da natureza. Nasce desse modo outra representação, cujos desdobramentos tornaram-se evidentes em leituras posteriores, durante o século XX, como a do mito poético inventado por Lezama Lima, ou seja, o da arte da cultura criolla como arte de resistência ou “arte da contraconquista”, o que será, sobretudo, explorado pelos modernistas na defesa do nativismo e da identidade própria para a arte brasileira.

Drummond: primeira parada, Belo Horizonte

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Wander Melo Miranda & Schneider Carpeggiani

Drummond: primeira parada, Belo Horizonte

Primeira conferência – em forma de diálogo ou de típica prosa mineira – do projeto MinasMundo com o professor de literatura e escritor Wander Melo Miranda (UFMG) e o editor do Suplemento Pernambuco Schneider Carpeggiani sobre Drummond e a Belo Horizonte das décadas de 1920-30, em comemoração ao aniversário da cidade, no dia 12, e aos 300 anos de Minas Gerais. Drummond dizia que os anos vividos em Belo Horizonte eram a “idade mitológica” da sua vida, em razão da importância afetiva da cidade para sua formação literária e pessoal. Entre Itabira, onde nasceu, e o Rio de Janeiro, onde viveu a maior parte da sua vida, Belo Horizonte foi uma parada significativa: fez amigos, com os quais fundou uma revista, contribuiu regularmente para os jornais da época, tornou-se o cronista “mundano e grave” da cidade. Diante do novo espaço urbano projetado como signo dos novos tempos que a república prometia, seus textos em prosa e poesia misturam a “melancolia tupi com a placidez inglesa da anedota”, nas suas palavras, o que dá a eles uma dicção diferencial sobre o processo de modernização então em curso no país.” Assista aqui.

Cecília Meireles e a transfiguração da Inconfidência

Sérgio Alcides

Cecília Meireles e a transfiguração da Inconfidência

A atualidade do Romanceiro da Inconfidência chega a ser perturbadora: “Onde a fonte do ouro corre, / apodrece a flor da Lei”.

Cecília Meireles não foi a Minas Gerais em busca de origens da nacionalidade. Para ela, a visão do passado colonial mineiro inspirou antes uma reflexão sobre a frustração dos melhores ideais humanos e sua inevitável recorrência, no fluir da temporalidade que os engole. “Na mesma cova do tempo / cai o castigo e o perdão”, escreve ela. É verdade, mas “homens novos, multiplicados / de hereditárias, mudas revoltas, / bradam a todas as potências”. Isso assegura a permanência da poesia.

Os episódios da Inconfidência Mineira são – nesse livro de 1953 – o motivo da poesia: seu tema, não seu assunto. Este apenas parte das figuras desenhadas com base em pesquisa documental, os “Autos da devassa” e outros documentos históricos, mais o tesouro das tradições orais. O trabalho poético transfigura essas fontes, com as quais se impregna da experiência passada. E delas se solta, como a mão do herói que acena: “vaga forma, do tempo desprendida”.

O Romanceiro é por isso irredutível à história do Brasil. Prende-se à nacionalidade brasileira tanto quanto a Ilíada à grega ou a Divina comédia à italiana – ou seja: não de todo. Para esse livro, a controvérsia historiográfica sobre a Inconfidência importa pouco. O público não procura seus poemas a fim de verificar se correspondem ou não a supostos fatos históricos. Vai ali para contemplar como “amor, inveja, / ódio, inocência, / no imenso tempo / se estão lavando”.

A pesquisa e a composição da obra levaram dez anos. No meio tempo, Cecília manteve sua presença constante na imprensa, como cronista, e traduziu um punhado de autores cruciais para ela, como García Lorca, Virginia Woolf, Rilke e Tagore. As estadas em Ouro Preto e Belo Horizonte foram entremeadas por viagens à Europa, às vezes em missões de representação oficial. Em 1952, Cecília voltou ao Brasil trazendo seus Doze poemas da Holanda. E no ano seguinte, quando o Romanceiro chegava às livrarias, estava em congresso internacional na Índia. Até o fim da década, ainda visitaria Israel e os Estados Unidos, e retornaria à Europa um par de vezes.

O mergulho no passado convergia com tantas viagens a pontos fulcrais da contemporaneidade, a Leste e a Oeste, seja no velho continente, seja no mundo pós-colonial. A tarefa deste projeto é situar o Romanceiro nesse itinerário.

Disciplina: MinasMundo: o cosmopolitismo na cultura brasileira

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

André Botelho

Disciplina: MinasMundo: o cosmopolitismo na cultura brasileira

No próximo semestre letivo da UFRJ, que começa no dia 30 de novembro de 2020, o coordenador do minas mundo André Botelho oferece a disciplina “MinasMundo: O Cosmopolitismo na Cultura Brasileira” no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA-IFCS/UFRJ). O curso vai contar com uma série de convidadas e convidados, entre coordenadores e pesquisadores do projeto. As discussões programadas passarão pelo problema do Brasil como cópia; questões teóricas do cosmopolitismo brasileiro; crítica pós-colonial; o modernismo como movimento cultural; o problema do aprendizado social, além de outras. A inscrição é aberta a alunas e alunos de outros programas de pós-graduação, reservadas as limitações definidas pela secretaria e coordenação do PPGSA. Para mais informações, acesse o plano do curso clicando aqui.

Joana Lavôr, 2020

Teaser do projeto

Agosto 18, 2023

Qual Minas colonial? Uma visão historiográfica

Dezembro 6, 2022

Seminário MinasMundo: Cosmopolíticas

Outubro 27, 2022

Manifesto: Cosmopolitismo em defesa da democracia

Julho 10, 2022

Cataguases-mundo: a revista Verde

Fábio Seixo

Teaser do projeto

O teaser do projeto minas mundo foi uma prévia do vídeo-manifesto e um convite para o lançamento do projeto, que aconteceu no dia 31 de outubro (dia D – de Drummond!) de 2020. Com montagem de sons e imagens em torno da relação minas-mundo, o teaser tem direção de Fábio Seixo e intervenções gráficas de Lilian Doring.

Imagens estilhaçadas: a cena do comum e do outro

José Da Costa

Imagens estilhaçadas: a cena do comum e do outro

No centro de minha discussão, estarão dois espetáculos teatrais do Grupo Galpão sediado em Belo Horizonte – Nós (2016) e Outros (2018), ambos dirigidos por Márcio Abreu. A partir dessas criações, tentarei refletir sobre certas imagens dos âmbitos local e planetário, bem como buscarei circunscrever determinadas configurações cênicas (rítmicas, temporais, espaciais, sonoras etc.) de percepções, mais ou menos fragmentárias, das ideias de sujeito (eu, nós, ele, outros), de comunidade (familiar, nacional, humana) e do espaço público e suas fraturas (pertinência e não pertinência) no contexto contemporâneo.

Poderão ser feitas associações dos espetáculos do Galpão dirigidos por Márcio Abreu com outros trabalhos da trupe de Belo Horizonte e com produções de Márcio Abreu não realizadas pelo Galpão, bem como com espetáculos de outras companhias e artistas mineiros. Destacadamente, devo observar trabalhos de duas criadoras mineiras. Refiro-me à atriz, diretora e dramaturga Grace Passô (que realizou as versões finais de dramaturgias do Grupo Espanca, como Por Elise e Congresso Internacional do Medo, e criou obras como Vaga Carne e Preto, tendo sido essa última escrita em parceria com Márcio Abreu e Nadja Naira) e à bailarina e coreógrafa Denise Stutz (que integrou ao longo de muitos anos os espetáculos do Grupo Corpo em Belo Horizonte e da Lia Rodrigues Companhia de Dança no Rio de Janeiro). Denise Stutz – que, hoje, vive e trabalha no Rio de Janeiro – tem criado e encenado uma série de espetáculos solos que interessam particularmente à reflexão aqui proposta sobre a comunidade e o sujeito (individual e coletivo), entendidos tais termos não de forma substancialista, mas como problemas e como inquietações da imaginação artística.

É possível que certo debate do campo de filosofia ou dos estudos literários sobre a noção de comunidade seja mobilizado, por meio de autores como Jean-Luc Nancy (A comunidade inoperada), Giorgio Agamben (A comunidade que vem), Maurice Blanchot (La comumunauté inavouable), Tzvetan Todorov (A vida em comum: ensaio de uma antropologia geral) e Roberto Esposito (Communauté, immunité, biopolitique: repenser les termes de la politique),  mas também Roland Barthes (Como viver junto), além de Peter Pál Pelbart e Suely Rolnik, que poderão trazer contribuições para o delineamento de questões ligadas à subjetividade ou aos modos de subjetivação coletiva e individual.

Gustavo Capanema e os dilemas entre unidade e diversidade

Simone Meucci

Gustavo Capanema e os dilemas entre unidade e diversidade

Esta proposta visa analisar discursos do mineiro Gustavo Capanema (Pitangui, 1900-1985) relativos ao tema da educação no Brasil entre os anos de 1945 e 1959, quando era deputado federal de Minas Gerais pelo Partido Social Democrático. Nesse período, o ex-ministro da educação de Getúlio Vargas, enquanto membro da Comissão de Educação, foi atuante na Assembleia Nacional Constituinte e na definição do curso de tramitação do anteprojeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

A quarta constituição republicana, a de 1946, foi delineada após a queda de Vargas e exigia definição da Lei de Diretrizes e Bases da Educação como matéria a ser apreciada pelo Congresso Nacional. A Lei de Diretrizes e Bases foi, pois, aprovada apenas em 1961 e impôs a Capanema a derrota de seus argumentos em favor da centralização política do sistema educacional.

A lentidão pode ser considerada reveladora da dificuldade de solucionar dilemas acerca da natureza do pacto federativo ou do que Clemente Mariani (também deputado pela Bahia, representante do partido União Democrática Nacional e relator do projeto) chamou de impasses “entre unidade e variedade”.

Considera-se que a ação parlamentar de Capanema tem valor heurístico para se entender o modo como a experiência democrática pós-1945 exigiu nova elaboração da especificidade do Brasil, que, nos anos de 1930, justificava, ao modo da interpretação de Oliveira Viana, o autoritarismo e o protagonismo do Estado. Capanema entendia ser necessária a manutenção da “ação pedagógica” da União para se opor às oligarquias articulando um nexo de sentido entre atraso e descentralização.

Pretendemos verificar as combinações entre os binômios descentralização/centralização, atraso/modernidade, democracia/autoritarismo considerando a hipótese de que vigorou, durante todo o período de redemocratização, uma perspectiva que opõe descentralização e desenvolvimento com base no argumento de que o localismo não contribui para a autonomia, mas para o insolidarismo. Nesse sentido, um sistema nacional de educação deveria ter a baliza da União para defesa dos parâmetros de uma modernidade de significação universal.

Sertões mineiros e ciência-mundo: a doença de Chagas entre o local e o global

Simone Kropf

Sertões mineiros e ciência-mundo: a doença de Chagas entre o local e o global

Em 1909, o médico e pesquisador Carlos Chagas descreveu, num vilarejo à beira do rio das Velhas, uma nova enfermidade dos trópicos. O parasita que a causava (batizado por ele de Trypanosoma cruzi) era transmitido pelo inseto conhecido localmente como “barbeiro” ou “chupão”, por sugar o sangue dos moradores das miseráveis choupanas de pau-a-pique da região. A descoberta e os estudos sobre a tripanossomíase americana ou doença de Chagas se tornaram a vitrine do recém-criado Instituto de Manguinhos, que Oswaldo Cruz pretendia equiparar aos institutos de medicina tropical europeus, legitimando assim a identidade social dos cientistas que pretendiam conduzir a modernização republicana.

Era uma doença “mineira” em vários sentidos: pelo local de sua descoberta, pela naturalidade de seu descobridor, pelos enfermos que lhe davam carne e osso, pelas paisagens dos “sertões doentes” materializados nas cafuas. A nova tripanossomíase, que se pretendia “americana”, estendia-se, contudo, para muito além das gerais. No deslizamento discursivo pelo qual as “endemias dos sertões” se faziam a versão local das “doenças tropicais”, a enfermidade descoberta e estudada em Minas se tornou a “doença do Brasil” em sentidos diversos. Evocava a nação marcada pelo atraso e pela pobreza de seus sertões, mas também a nação que se inseria nas rotas dos saberes, pessoas, instrumentos e espécimes que marcavam a agenda nascente da medicina tropical europeia.

Nosso objetivo é refletir sobre como a doença de Chagas ganhou contornos como objeto médico e social mediante os circuitos entre distintas (e assimétricas) latitudes geográficas, culturais e sociais, a conectar Minas, Rio de Janeiro e Europa. No trânsito entre o local e o global, a doença dos sertões mineiros trouxe “glórias” para a ciência brasileira, mas também motivou resistências. Seus críticos, incomodados com sua caracterização como emblema de atraso e “degeneração”, afirmavam tratar-se não de um problema nacional ou americano, mas do “mal de Lassance”, restrito aos rincões mineiros, e que só faria estigmatizar o país no exterior. Trata-se, portanto, de pensar os sentidos polifônicos e contraditórios pelos quais Minas Gerais, espaço natural e social da “doença do Brasil”, projetou a nação em uma ciência-mundo que se desenhava entre muitas idas e vindas entre a Europa e os trópicos americanos.

Jequitibá, Brejinho, Beco do Repolho, Lagoa Trindade, Matuto, Cordisburgo, Calabouço, Povoado do Souza e Serra do Cipó: O mundo sem capital e a oralidade que produz sem capitalizar

Sérgio Bairon

Jequitibá, Brejinho, Beco do Repolho, Lagoa Trindade, Matuto, Cordisburgo, Calabouço, Povoado do Souza e Serra do Cipó: O mundo sem capital e a oralidade que produz sem capitalizar

O princípio de transferência da capital de Minas Gerais de Ouro Preto para outra localidade circulava pelo Brasil Colônia desde a época da Conjuração Mineira de 1789. Somente em 1867, no entanto, o deputado Padre Agostinho de Souza Paraíso apresentou na Assembleia Legislativa Provincial (MG) um projeto (que foi aprovado) que transferia a capital de Ouro Preto para a cidade de Jequitibá. Seu argumento central estava baseado na importância econômica e de mobilidade do Rio das Velhas que banhava toda região, sendo o principal afluente do Rio São Francisco. O projeto, porém, não se efetivou em função da reação contrária ouro-pretana e acabou contando com o veto do Presidente da Província. O resultado foi que grande parte da região em torno do Rio das Velhas, por um lado, acabou ficando isolada do desenvolvimento econômico e urbano contemporâneos. Por outro lado, quiçá justamente por isso, preservou e expandiu muitas formas de vida do saber oral. Quase 150 anos após a apresentação do projeto do Deputado Padre Paraíso, encontramos na região, vivas e latentes, as seguintes manifestações culturais: Grupo de Rezadeiras, Incelência de Chuva, Boi da Manta, Catopé, Folia do Divino, Folia de São Sebastião, Folia de São Geraldo, Batuque de Viola, Dança de Roda, Encomendação das Almas, Fim de Capina, Candombe, Moçambique, Caboclo, Marujos, Vilão e Guarda de Congo.

Esse universo de visões de mundo, ainda hoje fortemente presente na região, expressa um grande e dinâmico hibridismo cultural, fruto do encontro entre as culturas portuguesa e africana, que teve como resultado a formação de localidades culturais (de tradição oral) profundamente complexas em terras brasileiras.

Junto de comunidades dessa região, entre 2005 e 2011, tive a oportunidade de acompanhar e pesquisar inúmeros rituais (espirituais ou não), com ênfase no ritual Coroação de Reis Congo, cuja origem data do final do século XV, simbolizando o momento inaugural do encontro entre os portugueses e os africanos do Reino do Congo. Estar imerso nesse contexto geográfico significa compreender que esse mundo se revela, concomitantemente, como a origem reticular do encontro luso-afro-brasileiro e como fundamento que (re)inaugura o mundo, dinâmica e frequentemente, em transveredas da oralidade em que se produz cultura sem capitalizar. Esse mundo que se formou de maneira totalmente paralela aos sistemas econômicos sobreviveu, por um lado, por não ter se tornado a região da capital mineira e, por outro, porque em nada representa (ou representou) um valor de mercadoria.

Perguntar pela mundanidade desse mundo implica refletir o quanto ele pode ser compreendido a partir de uma rede de ontologias primordiais que, em grande parte, são imperceptíveis às teorizações das temáticas identitárias. Sobretudo, porque essas formas de vida híbridas carregam suas tradições incrustadas em raízes rizomáticas e familiares, cuja profundidade espraia-se geograficamente por toda região do Vale do Rio das Velhas, sua temporalidade podendo retroagir até o século XVI.

Esse mundo é trazido à tona, por exemplo, toda vez que um grupo de Guarda de Congo clama com seus tambores, sob o comando de seu Capitão, em homenagem ao seu Rei e a sua Rainha negros. Desvela-se assim aquele encontro da expedição portuguesa de 1483, quando Diogo Cão, a mando de João II de Portugal, chegou à foz do rio Zaire, inaugurando o universo simbólico do contato primordial entre os portugueses e os africanos do Reino do Congo.

Falar desse mundo, portanto, é falar de uma ontologia sempre grávida de um princípio cronotópico, no qual geografia e temporalidade se entrecruzam, tecendo uma rede infindável de associações culturais entre Portugal, Reino do Congo e Brasil. O mundo está nesse devir de um cronotopos definido primordialmente pelo saber oral. Uma historicidade umbilical terra-mundo, fruto da afeição presente no co-pertencimento entre Terra e Mundo. Só assim o mundo se mundifica, por exemplo, na Coroação de Reis Negros, que carrega séculos de oralidade nas inúmeras localidades mineiras e, ao mesmo tempo, numa obra como “O Recado do Morro” de Guimarães Rosa.

Defenderei o princípio de que essa compreensão clama por um aprofundamento por meio da vivência com essas culturas, tornando a experiência in loco a grande fonte de sentido. Fizemos mais de 10 filmes (contando com a interlocução de princípios da Antropologia Visual); várias comunidades do Moçambique, do Candombe e da Guarda de Congo foram grandes parceiros na produção e finalização desses registros audiovisuais. No entanto, não há (e não houve) conclusão a respeito de toda essa experiência. O que existiu (e existe) é a necessidade de demonstrar que é justamente a presença de uma experiência inacabada e inacabável com essa terra-mundo que possibilita a compreensão de seu fundamento cronotópico.

Paz e Inhotim

Sabrina Parracho Sant’Anna

Paz e Inhotim

Na narrativa oficial, o Instituto Inhotim começou a ser concebido por Bernardo de Mello Paz a partir de meados da década de 1980. Construída dentro fazenda do colecionador como Jardim Botânico e instituição sem fins lucrativos, a fundação foi aberta para o grande público em 2006 e apresenta hoje uma das mais importantes coleções privadas de arte contemporânea em âmbito internacional.

Como em outras instituições privadas, a criação do museu constrói para seu mecenas uma imagem pública que confunde patrono e coleção, fazendo aderir projetos museais a narrativas de histórias de vida. Na dialética Minas/mundo, Inhotim parece se constituir como metáfora privilegiada de personalidades autorreflexivas cujo destino é o cosmopolitismo. Construindo fortuna pessoal a partir da mineração, Bernardo Paz narra sua infância em Belo Horizonte e o desejo de acumulação, a partir da memória do menino que ouvia o canto das galinhas e corria para acumular os ovos. Na dura relação com a família, diz saltar da introspecção para o reconhecimento da sociedade. Do prosaísmo de Brumadinho, vislumbra o futuro de Inhotim como “uma Disney World pós-contemporânea cultural”. Se, dentre os espaços que suscitam sonhos, já Benjamin aproximava museus, exposições universais, estâncias hidrominerais e – por que não? – parques temáticos, que metáfora melhor para pensar Minas e o mundo? Museu que se quer o salto da experiência individual e ensimesmada da contemplação estética para a democratização de espaços expositivos que povoam de imagens as redes sociais. Minas. Mundo.

Do ponto de vista do projeto, importa, portanto, entender como é possível constituir uma fina relação entre o projeto de instituição internacional e uma fazenda encravada numa cidade de 38 mil habitantes, espaço simbolicamente marcado pela experiência local. Mais do que isso, no entanto, importa também entender o tensionamento entre experiências locais marcadas pela relação com a mineração, pela produção de commodities para o mercado internacional, pelo passado escravista presente na incorporação de mão de obra quilombola, e pela presença de uma arte internacional que passa a se produzir como economia criativa capaz de mediar relações. Proponho aqui entender tanto a imagem construída pelo museu, como pelos discursos críticos que o informam e que são crescentemente incorporados pela instituição.

Mundo vasto mundo: migrações mineiras

Rossana Rocha Reis

Mundo vasto mundo: migrações mineiras

Na década de 1990, os cientistas sociais foram surpreendidos pela constatação de que pela primeira vez em sua história o Brasil tinha se tornado um país de emigração. No começo daquela década proliferavam as notícias de jornal especialmente sobre o grande fluxo de valadarenses para os Estados Unidos, em particular para a cidade de Boston. Naquele tempo, a professora Teresa Sales realizou um estudo pioneiro sobre esse fluxo, desvelando razões, processos e efeitos dessa mobilidade nas localidades de origem e destino dos migrantes.

Posteriormente, os fluxos do Brasil para o exterior foram se diversificando. Em alguns momentos, diminuíram, mas nunca mais deixaram de existir. Minas Gerais segue sendo um estado importante na composição do estoque de brasileiros no exterior, o que não chega a ser surpreendente para quem conhece o dito “se todos os mineiros voltassem para Minas, não caberia todo mundo em pé”.

Ganhar o mundo para ganhar a vida sempre foi uma opção para os mineiros alijados de possibilidades nos seus locais de origem. Nas últimas décadas, a falta de perspectivas no estado somada ao “encolhimento do mundo” provocado pelo processo de globalização levou os mineiros ainda mais longe, promovendo aquilo que Silvano Santiago chamou de “cosmopolitismo do pobre”: uma inserção subalterna na “aldeia global”, e que ainda assim, como já mostrava Teresa Sales, lhes dá um sentido de cidadania e pertencimento que a desigualdade social na origem sempre lhes negou.

O objetivo dessa pesquisa é retomar essa ideia desenvolvida por Teresa Sales daquele migrante que se sente mais “gente” como imigrante, muitas vezes clandestino, e investigar se ela continua sendo importante para entender a experiência do migrante hoje. Além disso, considerando que a migração é um processo muitas vezes pendular, que modifica não apenas pessoas, mas deixa suas marcas nos territórios que conecta, gostaríamos de entender se e como esse sentido de “cidadania global” se expressa nos locais de origem dos migrantes.

Vozes e tambores de Minas: figurações da cultura popular e do barroco em Drummond, Rosa e Milton

Roniere Menezes

Vozes e tambores de Minas: figurações da cultura popular e do barroco em Drummond, Rosa e Milton

O presente trabalho visa a investigar a presença de elementos da cultura popular, principalmente musical e negra, da arte barroca e da contemporaneidade, na obra de três importantes nomes da poesia, prosa e música mineira: Carlos Drummond de Andrade, Guimarães Rosa e Milton Nascimento. Buscaremos encontrar nas imagens de Minas Gerais presentes em suas produções elementos ao mesmo tempo locais e cosmopolitas. A criação dos autores apresenta características que revelam sobrevivências da cultura colonial afro-brasileira na Minas Gerais moderna e contemporânea. Muitos desses elementos remetem-nos a um aspecto mais popular e periférico do período barroco. Na poesia drummondiana e na prosa rosiana aparecem manifestações ligadas a cantos religiosos, profanos, a cantos de trabalho, dados que se evidenciam nas composições (muitas em parceria) e interpretações de Milton Nascimento. Reflexos do barroco mineiro surgem nas criações por meio dos jogos de contrários, da conjugação entre o excesso e a síntese, do trabalho de montagem. A pesquisa relaciona-se à perspectiva pós-colonial. Investigações de Aires da Mata Machado Filho sobre o negro em Minas, de José Miguel Wisnik sobre música, de Affonso Ávila sobre o barroco mineiro e de Didi-Huberman sobre os conceitos – desenvolvidos por Aby Warburg – de sobrevivência e montagem contribuirão com o estudo. A noção de estética do inacabado, pensada por Mário de Andrade, pode ser notada principalmente em Milton, a partir da reelaboração da produção popular tradicional visando a uma linguagem inovadora que se firmasse diferencialmente no “Concerto das Nações”. A ideia de arte de exportação, presente no Manifesto Pau Brasil, de Oswald de Andrade, aparece em algumas produções. Nos textos, a imagem de Minas Gerais constrói-se por meio de um pensamento que coloca o “interior” em diálogo com diversas referências “exteriores”, visando a um contato com o “fora”. Esse “fora” relaciona-se tanto a outros países, culturas, linguagens e à modernidade tecnológica, quanto à desconstrução dos lugares engessados do patriarcalismo, do regionalismo, do racismo, da religiosidade canônica. Drummond escreveu, sob o olhar do presente, a respeito do “espírito de Minas” popular, negro, barroco, conservador, festivo. Nas narrativas rosianas, há a presença de quilombos, de imaginários e figuras vindas do mundo da escravidão, de elementos populares, barrocos associados a uma escritura diferencial. Milton Nascimento mescla, em suas composições, o Barroco, o Arcadismo, a música latina, norte-americana, europeia, africana, indígena. Nos textos, percebemos, relacionados ao sentido de Minas Gerais, traços arcaicos, ancestrais, amalgamados por uma linguagem e uma perspectiva inovadora, em sintonia com importantes criações artístico-literárias mundiais, com arrojados projetos político-culturais da modernidade e da contemporaneidade.

Minas de Ferro: articulando local e global

Rodrigo Salles Pereira dos Santos

Minas de Ferro: articulando local e global

A importância econômica, política e social da indústria extrativa mineral se consolidou nas últimas duas décadas no Brasil, se traduzindo em ampliação de conflitos, impactos e desastres socioambientais. À medida que a exploração de minério de ferro constitui sua viga mestra, o estado de Minas Gerais deve ser compreendido como seu epicentro, permitindo observar a reorientação do investimento privado de corporações, transnacionais e nacionais; a transição na estratégia de desenvolvimento neoextrativista; assim como os regimes de governança de recursos naturais e seu efeitos sobre a sociedade civil. Essa transformação paradigmática vem sendo operada, fundamentalmente, através da integração de frações territoriais do estado em redes globais de produção (RGPs), isto é, nexos corporativos estratégicos funcionalmente integrados, ainda que fragmentados geograficamente, de operações de exploração, extrativas, produtivas, logísticas, e de consumo e descarte. A despeito da centralidade da firma, tais redes compreendem indissociavelmente agentes e estratégias não econômicos (políticos e sociais) cruciais para suas pretensões de acumulação. As RGPs do minério de ferro integram, assim, agentes e operações em múltiplas escalas, vinculando territórios e suas dotações de bens naturais e trabalho em termos profundamente impactantes para seu bem-estar.

Nesse sentido, apoiando-se em resultados de pesquisa prévia que buscou mapear a rede global extrativa de ferro no estado de Minas Gerais e os conflitos socioambientais a ela associados, pretende-se tematizar as formas de “relação descentrada de convivência” entre particular e universal que emergiram da intensificação da integração socioeconômica de municípios extrativos de ferro no estado de Minas Gerais em RGPs extrativas. Mais especificamente, resultados de pesquisa derivados de três estudos de caso representativos devem ser mobilizados. Em primeiro lugar, o caso da depleção da extração no complexo da Vale S.A., em Itabira, que caracteriza um cenário consolidado e declinante. Em segundo lugar, os conflitos em torno da mina Casa de Pedra, da Companhia Siderúrgica Nacional S.A. (CSN), em Congonhas, que caracterizaram um cenário em expansão até 2011. Por fim, o projeto Minas-Rio da Anglo American S.A., em Conceição do Mato Dentro, que constituiu um cenário de implante em uma região do estado sem histórico de exploração de ferro.

Confissões de Minas: a poesia na praça de convites

Roberto Said

Confissões de Minas: a poesia na praça de convites

A autobiografia é uma das linhas constitutivas da trajetória drummondiana. O sujeito que assina o texto parece atravessá-lo, a ponto de fazer do poético um espaço de prospecção do ser. De uma extremidade a outra da obra, a escrita se realiza sob a vigência de uma genealogia, com a qual o poeta fabula sua própria história, individual e familiar. No entanto, esse gesto autobiográfico não se realiza de modo transparente, posto que o problema colocado pelo poeta não é o de buscar a forma mais legítima ou a mais verdadeira de expressão ou de representação de si. Ao contrário, ele se inscreve no campo das práticas e das formações discursivas da modernidade, pautado pela crítica da subjetividade e pelo questionamento das categorias relativas ao sujeito e à sua interioridade. O elemento autobiográfico, embora esteja disseminado de um canto a outro de sua poesia, não atua senão para colocar em xeque a presença de uma subjetividade ou de uma identidade previamente constituídas.

Moderno por excelência e desdobrado ao longo de quase todo o século 20, esse processo de subjetivação deflagrado pelo poeta itabirano revela uma dimensão eminentemente reflexiva e filosófica, com a qual se desenvolve e se abre ao mundo, de modo a expandir, para um universo de interesses coletivo e histórico, o campo individual da experiência. Talvez resida nesse movimento paradoxal a grande virada efetuada por Drummond: ele define as margens de um novo território para a tradição poética brasileira, à medida que subverte a tendência intimista e introspectiva, “o gosto pela confidência” – característica destacada por Antonio Candido ao tratar da formação de nossa literatura – dando-lhe, sob laboriosa busca estética, uma dimensão meta-subjetiva. Pode-se notar, na esteira dessa revolução do discurso poético, a presença de um outro sujeito textual – outro inclusive em relação ao próprio modernismo – imbuído de novas ordenadas e tarefas.

É com esse complexo arranjo poético que a escrituralização da subjetividade literária é deslocada por Drummond, alcançando o estatuto de pensamento filosófico sobre o sujeito, abordado em sua contingência histórica. Sua obra, ao explorar as ambivalências existentes entre uma história pessoal e particular e as disjunções mais amplas de sua inserção histórica e política, parece desviar a poesia brasileira e, sobretudo, a mineira, dos bastidores da confidência, conduzindo-a como atitude existencial até o palco público e cosmopolita de reflexões.

Com Drummond, a poesia confessional e autobiográfica já não mais decorre da maturação ou do reconhecimento de uma interioridade em sua experiência expansiva frente à realidade. Já não se trata de encontrar forma adequada de expressão para uma “alma” atormentada, em descompasso com o mundo, nem de lhe revelar as contradições intrínsecas, mas sim de pensar tais tormentos e contradições no palco da modernidade nacional, atualizando-os, recriando-os esteticamente.

Este projeto de pesquisa visa a estudar a subjetivação engendrada na poesia drummondiana, a fim de analisar: a) as linhas de força que definem essa revolução subjetiva do discurso poético, com suas tensões intrínsecas; b) o modo como essa tradição por ele criada se desdobra, na condição de interlocução necessária e privilegiada, nas poéticas de escritores mineiros, modernos e contemporâneos, entre os quais se destacam Henriqueta Lisboa, Afonso Ávila, Ricardo Aleixo e Ana Martins Marques; e c) o viés político presente nessa tradição poética, situada nas encruzilhadas entre história e literatura, casa e mundo, entre as Minas e o vasto mundo.

Arquivos literários em Minas Gerais

Reinaldo Marques

Arquivos literários em Minas Gerais

Como contribuição ao estudo das articulações entre o cosmopolitismo e a cultura brasileira a partir da diferença local das culturas mineiras, propõe-se aqui o levantamento e a exploração dos fundos documentais de arquivos literários e culturais existentes em Minas Gerais, com ramificações em outros espaços. Trata-se de arquivos constituídos por uma documentação heterogênea: textual, iconográfica, sonora e tridimensional, que fazem deles, em alguns casos, uma mescla de arquivo, biblioteca e museu. Nos rastros documentais contidos nesses arquivos, será possível apreender as relações de forças que se cruzam e se chocam no espaço cultural das Minas Gerais, configurando certa orientação cosmopolita. Inclinação marcada, contudo, pelo embate entre forças territorializantes e arbóreas, alimentadas por uma libido de pertencimento e isolamento, e forças desterritorializantes, nômades, rizomáticas, abertas ao devir outro, ao diverso, ao estrangeiro, de que podem dar testemunhos textos, objetos e símbolos preservados nos arquivos literários.

Cabe ter em conta, em termos de uma Minas colonial, a fornida biblioteca do cônego Luís Vieira da Silva, pavoneando o imaginário dos inconfidentes com tintas iluministas, ou a biblioteca do Colégio do Caraça, que formou gerações de intelectuais mineiros. Considerem-se ainda os museus-casa de Alphonsus de Guimaraens e Guimarães Rosa, o Arquivo da Academia Mineira de Letras, o arquivo de Murilo Mendes na UFJF e o Acervo de Escritores Mineiros na UFMG. E também esse grande arquivo de arte moderna e contemporânea que é Inhotim.

Constituídos tanto de coisas quanto de discursos, há neles estratos sedimentares configurando zonas de visibilidade e campos de legibilidade, compondo camadas diversas, atravessadas por relações de forças, de poder. Tais forças compõem o lado de fora do arquivo literário e se definem pelo poder de afetar e de serem afetadas. Dizem respeito a forças no homem – o imaginar, o inventar, o recordar, o querer – e também às forças da vida, do trabalho, da linguagem. Enquanto tal, pode-se indagar: o que esses arquivos literários nos dão a ver sobre os complexos agenciamentos entre o cosmopolita e o local, sobre certo cosmopolitismo mineiro e suas relações com a cultura brasileira? O que eles nos permitem enunciar a esse respeito, desestabilizando sentidos já oficializados?

Metodologicamente, pretende-se abordar a documentação desses arquivos a partir de uma perspectiva transdisciplinar e comparatista, valendo-se de visitas e entrevistas com seus responsáveis e pesquisadores desses acervos. Trata-se de abordagem a ser feita segundo um olhar anarquivista, desconfiado das solenidades das origens e capaz de desconstruir a montagem e ordem arquivísticas instituídas nesses arquivos. De modo a ler seus documentos segundo outras (des)ordens possíveis, a fim de produzir narrativas múltiplas e alternativas que nos permitam contar outras histórias sobre Minas, modernismo e cosmopolitismo no Brasil.

Cosmominas: estado(s) em expansão na poética de Drummond

Rafael Lovisi Prado

Cosmominas: estado(s) em expansão na poética de Drummond

A proposta é investigar na extensa produção poética de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) diálogos, apropriações, construções de imagens e outros procedimentos que sinalizem o trânsito e a contaminação entre elementos (territoriais, simbólicos, linguísticos etc.) próprios ao universo de Minas Gerais e aqueles advindos de países e continentes estrangeiros. Como fio teórico a ser traçado, a noção de estado(s) em expansão perpassará os poemas abordados em sua ambivalência, quer dizer, referindo-se não só ao alargamento das fronteiras da cultura mineira (seu cosmos), como também à dilatação dos estados sensíveis e das subjetividades em jogo nos escritos, ambos os sentidos/efeitos desencadeados pela experiência daquilo que o filósofo grego Kostas Axelos chamou de “poeticidade do mundo”. Sendo assim, buscar-se-á destacar uma dimensão na qual os versos do poeta de muitas faces irmanam poética e vida para além de institucionalizações redutoras, sejam estas promovidas por instâncias externas ou internas à literatura. A ultrapassagem em questão diz de invenções na linguagem que têm como destino um mundo que não se restringe nem a individualidades/idiossincrasias nem a generalidades (sociais, estéticas, culturais). Sem ser um dado prévio e acabado, o mundo conjugado à poeticidade, que no caso da presente pesquisa nomeio de cosmominas, consiste numa abertura que nos lança à errância planetária: rasurados os limites impostos pelo imaginário ou pela geopolítica, teríamos através dos inventos drummondianos a figuração de lugares não topológicos e instantes não cronológicos. Trata-se, em suma, de dar a ler na poesia em foco uma disponibilidade para com o mundo em versões reinventadas, disponibilidade esta que apesar de ter se manifestado de maneiras distintas nos traços de historicidade da obra, não se esgota, permanece intempestiva.

O prosseguir em Minas: encontro no desencontro

Pedro Meira Monteiro

O prosseguir em Minas: encontro no desencontro

Como se vê o mundo a partir de Minas Gerais? Como o elabora o estrangeiro e o local? Como o sente quem vê de baixo, e quem olha de cima? Como o longínquo se faz próximo, no desencontro dos lugares sociais? Quem fala de dentro, quem de fora?

De um lado, Elizabeth Bishop, cuja imaginação poética tardia é marcada pelas montanhas de Minas, às quais ela transfere o que vivera em Petrópolis, onde viu, como poucos de seu meio, a iniquidade da formação social brasileira. Os comentários racistas e reacionários complicam a imagem dessa mulher que se apaixonou pela prosa de Clarice Lispector, e cujo poema “Manuelzinho” pode ser lido como a contrafação poética da crônica “Mineirinho”: ambos personagens agonizantes, vistos por mulheres brancas e estrangeiras movidas pelo susto diante do abismo das classes sociais. Há também a relação com Helena Morley, a “leading girl of Diamantina” que Bishop traduziu, e cujo encontro mereceu uma descrição que transforma o Rio de Janeiro num espelho do Deep South.

De outro lado, Conceição Evaristo, para quem o aguilhão da condição social é também motor, mas em ordem inversa: de baixo para cima, de dentro para fora, de uma classe a outra. Em batalha surda contra o esquecimento da ancestralidade, ela povoa o universo com personagens mágicas, ancoradas na memória que se expande pelo domínio da letra, que mal oculta a violência histórica da escravidão, como no caso de Ponciá Vicêncio. Ou então, em “Inquisição”, sente-se interrogada pelo Outro que “nega o negrume/ do meu corpo-letra/ na semântica/ da minha escrita”. Mas o eu-lírico insiste: “Prossigo e persigo/ outras falas,/ aquelas ainda úmidas,/ vozes afogadas,/ da viagem negreira.” O prosseguir engloba, no Minas Mundo de Conceição, um poema em que Clarice é levada até Carolina, “a que na cópia das palavras,/ faz de si a própria inventiva”. Em outro poema, que serve de espelho àquele, Carolina percorre cada canto da obra clariciana, “com os olhos fundos,/ macabeando todas as dores do mundo…”

O encontro improvável de Bishop e Conceição (mediado pela presença oblíqua de Clarice) se dá no ponto tenso em que as contradições da sociedade se tornam mais agudas, seja na clave estetizante, ou sentida na própria pele. No caso de Conceição Evaristo, uma constelação se arma, sugerindo uma linhagem de escritoras que se estende, para fora e para cima, a partir de Minas Gerais.

Teatralidade e cosmopolitismo do Triunfo Eucarístico na Vila Rica do século XVIII

Paulo Maciel

Teatralidade e cosmopolitismo do Triunfo Eucarístico na Vila Rica do século XVIII

A reflexão proposta sobre a relação entre urbanidade, teatralidade e cosmopolitismo, na Vila Rica do século XVIII, parte do comentário de Gilda de Mello e Souza, em Teatro ao Sul, a respeito da escolha do meio artístico para o tratamento da questão da decadência da sociedade patriarcal no Norte e no Sul do Brasil. Conforme argumentou a ensaísta, no Norte, o romance teria sido a forma privilegiada de tratamento do tema, enquanto, no Sul, o teatro se mostrou o meio mais adequado a sua retratação. Distinção que se baseia na duração do fenômeno, mais lento no Norte e mais veloz no Sul, como também no fato de que o teatro, ao contrário do romance, exigia uma sociedade mais urbana capaz de garantir o desenvolvimento de uma arte mais coletiva que individual. Não foi por acaso, então, que as primeiras manifestações teatrais no Brasil surgiram ligadas aos núcleos de povoamento, as vilas e as cidades, fundados ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII.

Nos últimos tempos, a noção de teatralidade tem sido empregada também para dar conta de eventos ou ações que demarcam as formas urbanas de sociabilidade nas cidades. Nesse sentido, através do estudo das festas barrocas mineiras, busco compreender que forma de teatralidade com a urbanidade e ou o espaço urbano emergente na Vila Rica do século XVIII. Urbanidade ou espaço urbano que, por sua vez, surge configurado publicamente por uma determinada teatralidade articulada pelas festas, uma vez que ambos os fenômenos parecem interligados naquele contexto.

A pesquisa pretende se debruçar sobre o chamado Triunfo Eucarístico (1733) a fim de descortinar os fios que, no passado, uniam teatralidade, urbanidade e cosmopolitismo mineiro a um determinado sistema das artes dominante no século XVIII. Sistema que remonta à noção de circularidade cultural, desenvolvida por Affonso Ávila em seus diversos estudos sobre o barroco, como uma espécie de complexo cultural e ou civilizacional articulado na Minas Gerais colonial.

Do ponto de vista crítico, o significado político-social das festas barrocas costuma oscilar entre a obediência ao universo da contrarreforma e do absolutismo europeu e a carnavalização dos valores e símbolos dessa ordem estabelecida, arte da contraconquista; ora integrariam os mecanismos de controle e domínio da metrópole sob a colônia, ora seriam meios possíveis de insurgência dos colonos, espaço-tempo de manobra, de sincretismo e ou de congraçamento sócio racial. Essa dupla perspectiva ideológica sobre as festas barrocas não marcaria, então, a própria lógica cultural do cosmopolitismo mineiro enquanto complexo civilizacional? Dessa forma, buscamos dar continuidade à reflexão em torno dos significados assumidos pelo barroco mineiro, especialmente em torno da teatralidade das festas, mas atento, especificamente, à sua contribuição para a constituição de uma lógica cultural nascida no interior desse emergente contexto colonial e urbano.

A mineiridade no modernismo: Aires da Mata e o registro dos vissungos

Oswaldo Giovannini Jr.

A mineiridade no modernismo: Aires da Mata e o registro dos vissungos

Aires da Mata Machado Filho (1909-1985) foi filólogo, escritor e folclorista mineiro. Registrou um dialeto falado por descendentes de escravos em São João da Chapada, Diamantina, MG, juntamente com 65 cantos vissungos (letra e partitura) usados pelos negros no garimpo de diamantes. Tais cantos eram compostos por uma mistura de palavras em português e outras de origem africana, formando o que ele nomeou como “dialeto crioulo”. Eram cantos de trabalho, fúnebres, festivos e, como seu significado não era compreendido pelos homens brancos daquela sociedade, também funcionavam como uma “língua com segredo”.

Seu livro O negro no garimpo em Minas Gerais (sua primeira publicação ocorreu na Revista do Arquivo Municipal em 1939) marcou seu lugar no pensamento social brasileiro, inserindo o autor no meio dos modernistas mineiros, no Movimento Folclórico Brasileiro e no meio intelectual nacional. O livro, publicado em 1943, obteve intensa recepção, nacional e internacional, tanto nas ciências humanas quanto no meio musical e artístico, fazendo com que as categorias culturais presentes no pensamento do seu autor alcançassem “ressonância” ao longo das décadas, ecoando até os dias atuais e permitindo a essa expressão cultural do garimpo mineiro participar da história social e cultural brasileira.

O movimento modernista em Minas formou um importante ambiente intelectual no qual Aires se inseria e que foi o primeiro meio consumidor em que sua obra ganharia ressonância. A abertura ao que se passava no mundo poderia caracterizar esse “espírito moderno” que tomava conta daqueles jovens mineiros ao qual se aliava também um “sentimento de Minas”, ou seja, procuravam integrar essa nova visão do mundo com uma tradição mineira. Epara Aires da Mata era fundamental a inclusão nessa tradição do “elemento negro”, do “dialeto crioulo”, dos cantos vissungos.

Circulação de ideias e alianças transnacionais no mundo negro insurgente (1960-1986)

Mário Augusto Medeiros da Silva

Circulação de ideias e alianças transnacionais no mundo negro insurgente (1960-1986)

Intento, principalmente por meio da trajetória de Américo Orlando da Costa (1932-1997) e Terezinha Maria Orlando da Costa (1926-2009), casal de ativistas negros ligados à Associação Cultural do Negro de um lado; e também por meio de Osvaldo Orlando da Costa (1938-1974), guerrilheiro que ficou conhecido como Osvaldão, comandante assassinado da Guerrilha do Araguaia, apresentar e discutir um circuito de circulação de ideias e projetos políticos, coletivos e individuais, presentes no ativismo político e cultural negro, permeado pelas questões anticoloniais, antirracistas, comunistas e pelo terceiro mundismo.

Américo e Osvaldo eram irmãos, oriundos de uma extensa família negra, ambos nascidos na cidade de Passa Quatro (MG), tendo iniciado suas vidas de militantes ligados à esquerda e ao Partido Comunista naquela cidade. Os caminhos trilhados levaram Américo para São Paulo e Osvaldo para o Rio de Janeiro, ambos estudantes e militantes, ainda no final dos anos 1950 (circa 1957 e 1958, respectivamente). E por meio de conexões internacionais do PC, os dois foram direcionados para países da União Soviética ainda na década de 1960. Américo foi para a Rússia, estudar na Universidade da Amizade dos Povos Patrice Lumumba (Moscou) e Osvaldo para Universidade Praga, na Tchecoslováquia. Os irmãos se formariam em Engenharia de Minas. O irmão mais velho permaneceu em Moscou de 1960 até 1970. O mais novo retornou ao Brasil em 1966 e tornou-se militante do PcdoB, posteriormente rumando para o Araguaia, onde seria morto. Terezinha Orlando da Costa era paulistana, com grau de instrução de nível secundário, e sua história é mais difusa, mormente atrelada ao marido. Seguiu com ele para Moscou e de lá ambos, depois de um breve período no Brasil (1970-1974), foram para Lisboa, Luanda e finalmente Maputo, permanecendo em Moçambique entre 1975 e 1986, trabalhando na reconstrução do país pós Guerra Colonial.

O cosmopolitismo de nenhum e a cosmopoética do múltiplo. João Guimarães Rosa e o pensamento transamericano

Marília Librandi

O cosmopolitismo de nenhum e a cosmopoética do múltiplo. João Guimarães Rosa e o pensamento transamericano

O projeto Minas Mundo, que propõe pensar o cosmopolitismo mineiro e a cultura brasileira em chave comparativa, vai me permitir retomar dois estudos sobre Guimarães Rosa, em preparação. No primeiro, um verso de Wallace Stevens, “all/one ear”, oferece ocasião para pensar a unidade e a comunidade do Um (“all+one”) e do individualismo (“alone”), na cultura norte-americana anglófona, em contraste com o “nenhum, nenhuma”, o “nonada”, o “coisinha nenhuma”, que aparecem contínuas vezes na obra de Rosa. A função paterna (presente no poema de Stevens, que remete ao rio no qual seu pai ia pescar), explícita na nação dos “Founding Fathers”, será contrastada com a função paterna problematizada, afastada, no meio do rio, na orfandade, e no enigma da “terceira margem do rio”. Como pensar o local-universal, ou qual noção de comunidade se depreende dessas expressões em contraste: “todos um” (que não é o mesmo que “todo mundo”) e “nem um/nonada”? Na sequência, a intenção é avançar o paralelo em relação ao México, através da noção de “nenhumamos”, que aparece em El labirinto de la soledad, de Octavio Paz, em relação ao campo fantasmático das classes subalternas. O livro de Silviano Santiago, As raízes e o labirinto da América Latina, que contrasta as imagens de Octavio Paz e Sérgio Buarque de Holanda, será fundamental para completar o estudo com uma abordagem de Diadorim, personagem que é também ela/ele/ “nenhum, nenhuma”/ e que, em leituras recentes aparece como o primeiro personagem “trans” na literatura brasileira. Por fim, o “all/one ear” de Stevens é contraposto ao símbolo do infinito, a lemniscata, que encerra/abre Grande sertão: veredas, a partir de anotação feita pelo próprio escritor, e que demarca: “∞ = par de orelhas”. No segundo estudo, a intenção é avançar uma análise da estrutura enunciativa de A queda do céu, no diálogo entre Davi Kopenawa e o antropólogo Bruce Albert, e a estrutura de diálogo-monólogo entre Riobaldo e o doutor da cidade, descrevendo a estrutura da escuta na escrita de ambas as obras. No caso, a cosmopolítica ameríndia, e sua diplomacia inter-espécies, nos ajudará a pensar o detalhe minucioso das frases de Rosa, que nos apresenta um mundo perspectivista no qual “tudo era falante”. Como entender (ouvir) a presença de um pensamento ameríndio no Mundo Minas de Guimarães Rosa?

Viagem e etnografia em Mário de Andrade

Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti

Viagem e etnografia em Mário de Andrade

Desde Argonautas do Pacífico Ocidental, de Bronislaw Malinowski (1922), a antropologia redefiniu o entendimento da etnografia, elegendo-o como novo ideal de produção do conhecimento ao longo do século XX. Combinaram-se então a pesquisa de campo de imersão com a construção de um estilo autoral individualizado que associa a apresentação dos dados de pesquisa ao apelo à imaginação do leitor. A autoconsciência mais plena das implicações dessa novidade emergiu, entretanto, apenas nos anos 1970, quando Clifford Geertz trouxe com clareza a escrita etnográfica e seus aspectos textuais e narrativos como partes decisivas da expressão e produção do conhecimento antropológico. Um significativo conjunto de autores, entre eles James Clifford com a discussão da autoridade etnográfica, desdobraria nos anos 1980 o assunto. Com isso, sem abrir mão da objetividade – a ideia de um mundo real a ser conhecido –, aceitou-se a subjetividade e a intersubjetividade como mediadores essenciais do processo da pesquisa.

O escopo semântico da noção de etnografia – que integra escopo teórico, pesquisa de campo, análise de dados a seu resultado escrito – tornou-se multifacetado, pois remete ao mesmo tempo à autenticidade da experiência vivida, às exigências de apresentação fidedigna de dados, à imaginação do leitor e à construção do estilo autoral. Isso tornou a prática antropológica a um só tempo um ofício especializado (supõe a cientificidade de métodos e teorias) e uma arte narrativa sempre associada de algum modo à experiência da viagem como dispositivo de descentramento do sujeito e apreensão de alteridades. Esses significativos deslocamentos metodológicos e epistemológicos trazidos por essa acepção ampla da etnografia nos aproximam com novos olhos do passado e permitem, quando o arsenal crítico pós-moderno é usado construtivamente, renovar o interesse por autores clássicos em que a liberdade narrativa se associa ao desejo de produção de conhecimento.

Trago a conversa para o solo brasileiro, situando-a entre os anos 1920-1940, quando as próprias ciências sociais universitárias se encontravam em processo de institucionalização. Nesse contexto, levando em conta o grande bricoleur e artista que foi Mário de Andrade (1893-1945), a proposta enfoca em sua obra textos que iluminam formas diversas da experiência e do entendimento da etnografia sempre associadas a diferentes modalidades e projetos de viagem.

Penso especialmente em dois textos exemplares do interesse de Mário de Andrade em registrar e conhecer o folclore brasileiro: “Música de feitiçaria” (a conferência de 1932) e “O samba rural paulista” (1937). Tais textos indicam com clareza a transição do autor entre os contextos intelectuais pré-modernista e o modernista, adotando aqui os termos utilizados por Marylin Strathern, ao referir-se aos deslocamentos sofridos pelo entendimento antropológico da etnografia. A alteridade buscada e narrada apresenta-se aqui como diferença interna encontrada no povo que não só provê fontes de originalidade criativa como liga a cultura brasileira contemporânea ao autor a dimensões universais. Em discussão com a ampla fortuna crítica do autor, venho elaborando o assunto abordado em textos publicados ao longo dos anos e pertinentes à proposta em pauta.

Penso também em textos em que a alteridade é buscada no desejo de conhecimento do passado, como Modinhas imperiais (1930) e, especialmente, o texto que inclui reflexão sobre o escultor Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1737-1814). O texto se destaca como elaboração (1935) oriunda da célebre viagem a Minas Gerais de 1924, a “viagem de descoberta do Brasil”, da qual o autor participou junto com Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Blaise Cendrars, Olívia Guedes Penteado entre outros. Deve-se lembrar aqui da viagem anterior de Mário de Andrade a Minas que, realizada em 1919, resultou também em texto sobre a arte religiosa no Brasil (1920).

O enfoque desses textos e respectivos contextos norteia o estudo dos lugares e sentidos da etnografia experimentados por Mário de Andrade, em associação ao tema da viagem/excursão, idealizada ou realizada, mais distante ou mais próxima. Tais viagens emergem como dispositivos de deslocamento do olhar de partida que fundam a possibilidade do contato renovador com alteridades temporais e espaciais e propiciam na obra de Mário de Andrade arranjos narrativos e regimes de escrita diversos.

Uma arte da rasura: apagamentos, reescritas e aparições na arte brasileira atual

Maria Angélica Melendi

Uma arte da rasura: apagamentos, reescritas e aparições na arte brasileira atual

No projeto Cara de Índio (2011) – realizado durante sua viagem entre os extremos sul e norte da América –, o artista Paulo Nazareth se propõe a identificar índios urbanos e se fotografar ao lado de outros homens e mulheres com cara de índio para que se possa estabelecer uma comparação entre os rostos de ambos.. O projeto se materializa em uma série de flyers impressos em papel de jornal e faz parte de outro mais abrangente intitulado Notícias de América (que pode ser apreciado no blog http://artecontemporanealtda.blogspot.com/, na seção homônima). No texto do flyer, meramente informativo, aparece uma afirmação inesperada: o artista evoca o mestiço: “comparar a cara mestiça à cara do outro”. Mas quem é o mestiço? Quem é o outro? O índio urbano? Paulo?

Os índios urbanos seriam aqueles indivíduos desarraigados da tribo, seja porque se afastaram dela, seja porque ela já não existe. Em todas as populações da América Latina existem índios urbanos, na sua maior parte descendentes de grupos extintos e de brancos. Muitos deles perderam não somente a língua natal, mas também a religião e as formas de sociabilidade.

No Brasil, não costumamos reconhecer essa mestiçagem, cegados pela evangelização e pelo processo de branqueamento impulsionado durante vários séculos. Ao reconhecer essa mestiçagem, Paulo Nazareth está se debruçando sobre um dos múltiplos passados inexplorados ou esquecidos da nação.

Paulo Nazareth, que nasceu em Governador Valadares, interior de Minas Gerais, e viveu sempre na periferia, é um artista de notável projeção no sistema da arte ocidental. Em Nova York Miami, Lyon ou Veneza, ele mostra suas obras singelas e grandiosas, feitas de carne de porco salgada, banha, carvão, polvilho e sal. Exibe seus papéis de jornal impressos em tipografia, nos quais narra com imagens e palavras as histórias que foram apagadas e que agora aparecem reescritas: as histórias roubadas da alma do Brasil. Uma “ação de retaguarda” (rearguard action) como queria, em 1987, o artista Peter Halley. Uma ação através da qual se realimenta a cultura com seus próprios restos, com aquilo que foi descartado na hora de determinar o que tem valor.

Contagem de mundos: o singular cosmopolita cinema mineiro – Filmes de Plástico + Affonso Uchôa

Marco Antonio Gonçalves

Contagem de mundos: o singular cosmopolita cinema mineiro – Filmes de Plástico + Affonso Uchôa

Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais é de onde partem as narrativas dos 18 filmes da produtora Filmes de Plástico (André Novais Oliveira, Gabriel Martins, Maurílio Martins, Thiago Correia) e dos 3 filmes do diretor Affonso Uchoa – A vizinhança do tigreArábia Sete anos em maio. Filmes que se estruturam a partir da vontade de conhecer mais seu próprio bairro, sua cidade, seus personagens, fazer novos amigos e, ao mesmo tempo, descobrir seus sonhos, suas frustrações, suas perspectivas que têm como pano de fundo o trânsito entre narrativas existenciais e construções reflexivas sobre a exclusão social, o mundo do trabalho e suas agruras. Filmes que partem de Contagem para o mundo: Cannes, Roterdã, Nova Iorque, Lisboa.

Filmes em que ecoam problemas e questões capazes de redesenhar uma imagem do Brasil em que se inserem, agora, temas incontornáveis, como raça, classe, gênero, produzindo novas conexões, apontando para outras configurações socioculturais da sociedade brasileira contemporânea. A força dessa produção cinematográfica é que ao se afastar, definitivamente, de um modo de narrar a história da colonização brasileira, atualiza o presente através de “elementos soltos”, fragmentos, descortinando os conflitos, as batalhas, a guerra do dia a dia. Essa figuração imagética sitia lugares e espaços naturalizados, dessubstancializa conceitos como os de localidade, periferia, identidade, memória, finitude, história, ficção, documentário. Evoca diálogos fecundos através de reconfigurações da alteridade e da distopia. Ao propor temas insurgentes repensa o cinema enquanto lócus de contestação e crítica a projetos, tão redentores quanto autoritários, sobre o Brasil.

Cinema que se realiza, fortemente, como produção colaborativa construída na vizinhança e na partilha. Essa capacidade imaginativa elaborada por processos de intimidade, conflito, contradições é o que nos reenvia à cena etnográfica produzida por esses filmes. Investem numa narrativa sobre e de Contagem, que é aqui, literalmente, contagem de mundos, histórias vividas, intimidades, diários de vidas que, ao confrontarem mundos reais e imaginados, produzem imagens contraditórias que esgarçam as fronteiras entre o periférico, o cosmopolita, o singular e o universal.

Arte, cultura e esporte na Belo Horizonte modernista

Marcelino Rodrigues da Silva

Arte, cultura e esporte na Belo Horizonte modernista

O objetivo da pesquisa é investigar as relações entre arte, literatura e cultura nos contextos brasileiro e mineiro de meados do século XX, com especial atenção ao estudo das dimensões culturais do movimento modernista e das repercussões de seus projetos estéticos e político-culturais no cenário artístico e na cultura esportiva da cidade de Belo Horizonte, durante as décadas de 1930 e 1940. Para a realização desse objetivo, portanto, deverão ser desenvolvidas duas frentes de trabalho. Na primeira, serão estudados textos dedicados à história, às propostas e às diferentes manifestações do modernismo brasileiro, desde o seu surgimento, em São Paulo e no Rio de Janeiro, nos anos 1910 e 1920, a partir dos quais seja possível colocar em foco a dimensão cultural das ideias e dos projetos estéticos e políticos desse movimento. Na segunda frente de trabalho, deverão ser analisadas diferentes produções artísticas e culturais efetivadas na cidade de Belo Horizonte durante o período em foco, especialmente as publicações do jornalismo esportivo, que viveu nessa época uma fase particularmente fértil e criativa, com a constituição de uma mitologia esportiva diferenciada da que vinha se desenvolvendo nas duas principais metrópoles do país. Entre essas publicações, destaca-se o trabalho do cartunista, artista plástico e escritor Fernando Pieruccetti, personagem importante na introdução do modernismo e das tendências modernas nas artes plásticas mineiras, durante a década de 1930, e responsável pela criação, em charges produzidas a partir dos anos 1940, das mascotes que ainda hoje representam os principais clubes de futebol do estado, como o Galo, a Raposa e o Coelho, símbolos respectivamente do Atlético, do Cruzeiro e do América. O que se pretende, nessa análise, é tomar a produção do jornalismo esportivo belo-horizontino e a trajetória criativa de Fernando Pieruccetti como pontos de partida para uma investigação sobre as interações, trocas e atravessamentos entre as artes, a literatura e a cultura, assim como entre as tendências e projetos artísticos que circulavam no Brasil e no mundo naquele momento e elementos das tradições e da cultura popular local e regional.

Minas, imagens do mundo: Joaquim Pedro de Andrade entre duas gerações

Luis Felipe Kojima Hirano

Minas, imagens do mundo: Joaquim Pedro de Andrade entre duas gerações

Filho de dois mineiros, Graciema e Rodrigo Melo Franco de Andrade, Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988), cineasta carioca, dedicou grande parte de sua cinematografia à releitura do modernismo paulista – através de filmes como Macunaíma (1969) e O homem do pau brasil (1982) – e à constituição cinematográfica de um certo patrimônio mineiro – o que se torna aparente nas películas O padre e a moça (1965), inspirado no poema homônimo de Carlos Drummond de Andrade, Os inconfidentes (1972), que revê a Inconfidência Mineira, e no curta-metragem O Alejadinho (1978).

O presente projeto visa investigar melhor essas duas vertentes da produção cinematográfica de Joaquim Pedro, duas dimensões, por assim dizer, que podem ser lidas em conjunto, como eixos que giram em torno do pêndulo local/universal. Por um lado, esse conjunto de filmes tece intensos diálogos com os projetos culturais e artísticos da geração de seu pai – fundador do IPHAN e amigo de Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Gilberto Freyre, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Pedro Nava, entre outros. Por outro lado, essa série de filmes se relaciona com os ideais do Cinema Novo, do qual o diretor fez parte, e dialoga especialmente com o legado da cinematografia de Humberto Mauro, que tem as cidades mineiras como locação e, a partir dos fins da década de 1960, com o cinema popular carioca dos decênios de 1940 e 1950.

Seu cinema, ao mesmo tempo que tecia uma relação umbilical com o legado paterno, respondia fortemente ao contexto da ditadura militar e aos impasses do cinema brasileiro daquela época. Assim, é possível dizer, a pesquisa irá se aprofundar nesse ponto, buscando entender em que medida Joaquim Pedro, ao filmar obras e figuras que se tornaram marcantes na produção artística e cultural do Brasil, está sempre a falar de si mesmo e da sua geração. Há, nessa característica, guardadas as devidas proporções entre o cinema e a literatura, uma possível conexão entre o modo com que Joaquim Pedro narra seu tempo e uma característica forte da literatura mineira, qual seja, a de articular o universal ao particular como reminiscência em primeira pessoa. Penso, a partir disso, que esse conjunto de filmes permite aquilatar uma certa leitura que conecta Minas Gerais ao modernismo da Semana de 22, a partir de um ponto de vista de um diretor que não deixa esconder a experiência visceral de viver intensamente a geração de seu pai e a sua própria.

Futebol e atuação pública: o caso de Minas Gerais

Lucas Correia Carvalho

Futebol e atuação pública: o caso de Minas Gerais

A pesquisa se concentra nas trajetórias particulares de alguns dos mais importantes jogadores mineiros da história do futebol brasileiro, sobretudo Tostão (Eduardo Gonçalves de Andrade) e Reinaldo (José Reinaldo de Lima). Trajetórias distintas, mas reveladoras de uma ambiência em que o futebol despontava como esporte de massa e se integrava à dinâmica urbana de Belo Horizonte. Fundada em 1897, logo após a Proclamação da República Primeira, Belo Horizonte foi a primeira cidade projetada do Brasil. Seus traços retos e avenidas largas seguiam os modelos urbanísticos europeus, incluindo parques e jardins como elementos fundamentais da paisagem urbana. Contudo, o desenho essencialmente urbano e moderno contido no plano piloto em contraste com a antiga e decadente capital de Minas Gerais, Ouro Preto, não era o que as circunstâncias sociais permitiam. O rápido crescimento populacional extrapolou os limites criados pelo cinturão formado pela Avenida do Contorno, e os traços da cidade rapidamente assumiram contornos tortuosos, à revelia da racionalidade que se queria primeiramente imprimir. Características modernas e tradicionais conviviam intensamente e sociabilidades provincianas se imiscuíam ou mesmo sobrepujavam aquelas mais cosmopolitas, as quais, na cabeça dos engenheiros, deveriam ser a base do movimento da cidade. Projetada para a dinamicidade e velocidade de uma sociedade de massas, Belo Horizonte manteria vivo seu provincialismo e ruralidade, esvaziando seus espaços públicos. O futebol e os clubes se tornaram formas intensas de convívio e mesmo de associativismo dessa sociedade que se massificava. Como ademais revela sua relação com o espaço urbano em diversas paragens, no futebol o espírito coletivo de uma sociabilidade tradicional em decadência é reavivado, mas em um contexto social em que não o é mais possível da mesma maneira, dada a crescente impessoalização e massificação dos contatos.

As trajetórias de jogadores como Tostão e Reinaldo são reveladoras dessa ambiência social, sobretudo porque, cada um à sua maneira, fizeram do futebol um espaço público. Tostão, tímido, com perfil intelectual-acadêmico, com vasta publicação em jornais sobre futebol, seus dilemas contemporâneos e a relação com a política. Reinaldo, ao contrário, extrovertido, sempre teve como marca as polêmicas e as opiniões fortes, como deixa clara a famosa comemoração logo após o gol, com o punho cerrado para cima. Em campo, ambos são reconhecidos pela técnica aprumada, embora com estilos distintos: Tostão, pela sua leitura do jogo, como se guardasse milimetricamente todas as coordenadas do campo e medisse os passes de acordo com elas; Reinaldo, veloz, driblador, tinha as características do que para muitos é a essência do futebol brasileiro, aquilatada pela presença na pequena área e a destreza do chute a gol. Os dois jogadores, ídolos dos dois maiores clubes de Minas, Cruzeiro e Atlético-MG, sofreriam com as constantes lesões e se aposentariam precocemente. Outro mineiro, o maior futebolista de todos os tempos, Pelé, serve aqui de contraponto, menos pela técnica (incrivelmente refinada e de criatividade única) e mais pela trajetória: nascido em Três Corações, logo quando menino migra para Santos, onde encanta e desponta como revelação. Seu engajamento em questões públicas seria parco, em contraste com a projeção mundial que teve, o que é expresso inclusive pela diferenciação, espécie de bordão, entre o Edson e o Pelé. Há ponto de comparação interessante ao caso “mineiro” aqui destacado: a denominada “democracia corintiana” dos anos 1980, liderado por um grupo de futebolistas politizados como Sócrates, Wladimir, Casagrande e Zenon no maior clube de São Paulo, o Corinthians.

O objetivo da pesquisa, portanto, é investigar o modo como a interseção entre urbanidade, espaço público, atuação pública é revelada no futebol e na trajetória desses jogadores e como ela se revela sobretudo no “caso mineiro” em um contexto de crescente politização nos anos 1970 e 1980.

Ciência e política nos pensamentos de Simon Schwartzman e Bolívar Lamounier

Leonardo Belinelli

Ciência e política nos pensamentos de Simon Schwartzman e Bolívar Lamounier

No seu primeiro plano, a pesquisa pretende examinar, em perspectiva comparada, as interpretações de Simon Schwartzman e Bolívar Lamounier sobre a formação histórica brasileira, ambas centradas na identificação do Estado como fator impeditivo do desenvolvimento social, econômico e político da sociedade brasileira. Nesse nível, trata-se de procurar compreender as especificidades das ideias produzidas pelos dois intelectuais e suas relações com seus posicionamentos políticos, conhecidamente liberais. Trata-se, pois, de investigar as relações entre ciência e política nos pensamentos de ambos os autores.

Em outra dimensão da pesquisa, procuraremos compreender como o nexo entre ciência e política se relaciona com elementos comuns às trajetórias acadêmicas e políticas de Schwartzman e Lamounier, como, por exemplo, a formação em Sociologia e Política na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) nos anos 1960, a passagem pela academia norte-americana em seus estudos doutorais e a institucionalização de novas agendas paras as ciências sociais brasileiras. Desse ângulo, o que está em jogo é a relação entre trajetórias intelectuais e ideias.

Os dois planos da pesquisa (ciência/política e intelectuais/ideias) serão conectados e problematizados a partir da noção de cosmopolitismo nas ciências sociais brasileiras – nas acepções compartilhadas pelo “quase manifesto” que articula as pesquisas do Minas Mundo. Se o cosmopolitismo pode ser entendido como uma forma de convivência descentrada com o universal a partir do local – e, nesse sentido, é tomado como um ponto de vista a partir do qual se vive e pensa –, o que está em jogo é a tematização do que poderíamos talvez chamar, muito sumariamente e apenas como hipótese introdutória, de recusa de Schwartzman e Lamounier em tomar o “local” como fonte de reconstrução da sociabilidade brasileira, uma vez que ambos identificariam a formação histórica brasileira como ancorada em práticas de dominação iliberais. Recusa, talvez – e isso apenas a pesquisa poderá dizer –, já expressa nos próprios pontos de vista a partir dos quais procuram compreendê-las, inspirados em teorias mainstream da ciência política norte-americana dos anos 1960.

A partir da problematização dos eixos mencionados, o projeto procurará tanto contribuir para a interpretação dos pensamentos e das trajetórias de dois cientistas sociais importantes no processo de consolidação das disciplinas em que se inserem profissionalmente, como, em sentido mais amplo, refletir sobre as complexas relações entre liberalismo e cosmopolitismo.

Cosmopolitismo e dependência: Theotônio dos Santos

Karim Helayël

Cosmopolitismo e dependência: Theotônio dos Santos

Levando em consideração a proposta mais ampla de discutir a relação entre o cosmopolitismo e a cultura mineira, afigura-se incontornável tratar da obra do economista mineiro Theotônio dos Santos (1936-2018). Ao experienciar o exílio, Santos forja uma potente interpretação do tipo de capitalismo que se constituiu na América Latina, cujas formulações sobre a dependência lograram forte ressonância no contexto intelectual da região nos anos 1960-1970. No entanto, sua capacidade de interpelação cognitiva não parece ter se esgotado em seu contexto imediato, uma vez que suas proposições vêm sendo mobilizadas pela teoria sociológica produzida contemporaneamente. Nesse sentido, a pesquisa a ser desenvolvida girará em torno da produção e circulação de repertórios intelectuais, tomando como objeto de estudo o modo pelo qual o diagnóstico da dependência, formalizado pelo intelectual mineiro, tem sido incorporado pelo debate sociológico contemporâneo a respeito da geopolítica do conhecimento e da “dependência acadêmica”. Levarei em conta ainda a sua recepção em trabalhos que têm como objetivo pensar a produção das ciências sociais na América Latina em oposição a perspectivas eurocentradas. O empreendimento proposto procurará mensurar, desse modo, a maneira pela qual as formulações de Theotônio dos Santos contribuíram para a construção de diagnósticos que vêm ressaltando as assimetrias entre países comumente entendidos como produtores de teorias – no caso, os países centrais – e aqueles que seriam os países consumidores de repertórios teóricos – mais especificamente, os periféricos.

Sendo assim, a minha hipótese é a de que, a despeito da ampla repercussão do famoso livro Dependência e desenvolvimento econômico na América Latina, de 1969, escrito em parceria por Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto, a perspectiva de Theotônio dos Santos sobre a dependência parece ter interpelado de modo muito mais contundente a vertente sociológica contemporânea vinculada ao debate da geopolítica do conhecimento e da “dependência acadêmica”. Ou seja, os trabalhos de Santos, ao articularem as dimensões local e global do capitalismo dependente, podem ter desempenhado importante papel em reflexões relativamente recentes que visam problematizar o processo de produção e circulação do conhecimento sociológico.

A Causa da Patrimônio: civilização, subjetividade e autenticidade em Rodrigo Melo Franco de Andrade (1898-1969)

José Reginaldo Santos Gonçalves

A Causa da Patrimônio: civilização, subjetividade e autenticidade em Rodrigo Melo Franco de Andrade (1898-1969)

Rodrigo Melo Franco de Andrade (1898-1969) integra uma constelação de intelectuais mineiros associados ao modernismo nos anos 20, o conhecido “grupo da Rua Bahia” em Belo Horizonte. Em estudo produzido nos anos 90 sobre modernistas mineiros, destaca-se o perfil intelectual do grupo pelo seu compromisso com a razão e a universalidade, um compromisso com a “civilização”, assumindo como tarefa primordial inserir o Brasil “no concerto das nações”. Nessa constelação, RMFA virá a ocupar uma posição singular. Sua carreira intelectual e profissional vai estar existencialmente associada à criação e à direção do SPHAN – o então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que ele, sob indicação de Mário de Andrade (1993-1945) e do então Ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema (1900-1985), vai dirigir a partir do ano de 1937 até 1967, pouco antes de sua morte em 1969.

A proposta é descrever e analisar essa posição, tal como ela se articula intelectualmente nos artigos, pareceres, discursos, livros e na performance pública de RMFA ao longo dos trinta anos em que esteve à frente dessa instituição. Em sua produção intelectual e em sua atuação administrativa ressoa o ideário dos intelectuais mineiros de sua geração, notadamente seu compromisso com a ideia de “civilização”. Em resumo, para RMFA, a “causa do patrimônio” era primeiramente a causa da civilização.

No entanto, um aspecto importante nas concepções daquele grupo de intelectuais modernistas consiste na mediação sensível entre o ideário universalista contido na ideia de civilização e a valorização de uma cultura autenticamente nacional. Distinguindo a singularidade do patrimônio brasileiro em relação à herança clássica das “nações civilizadas”, diz ele em 1936: “A poesia de uma igreja brasileira do período colonial é, para nós, mais comovente do que a do Parthenon. E qualquer das estátuas que o Aleijadinho recortou na pedra-sabão para o adro do santuário de Congonhas nos fala mais à imaginação que o Moisés de Miguel Ângelo”.

No contexto de um processo universal de civilização, o Brasil é oposto a nações “mais maduras” ou “mais civilizadas”. Isso, no entanto, não traz como consequência uma visão negativa, pessimista da cultura brasileira, mas o sentido de que se tornará uma nação plenamente moderna, civilizada e madura, na medida em que os brasileiros venham a reconhecer, assumir e defender sua cultura ou “tradição”, como parte da civilização universal.

A mesa dos mineiros narra Minas

José Newton Meneses

A mesa dos mineiros narra Minas

A proposta de pesquisa objetiva refletir sobre práticas e gostos alimentares no âmbito de uma construção cultural mais ampliada em um território específico, as Minas Gerais. Quer ver a comida a partir de uma perspectiva de seus fazeres e de seus discursos. A comida é linguagem e nesse sentido narra uma cultura. Parte-se de um viés crítico à tradição ensaística sobre os regionalismos estanques das cozinhas e abre-se, como propõe o projeto Minas Mundo, para considerar diálogos amplos de uma construção cultural atenta ao outro, cosmopolita, descentrada, mas buscando vasculhar o seu próprio quintal, um mundo anexo à cozinha. A pesquisa se apoia em uma trajetória de análises de inventários post mortem e de documentos camarários do universo dos mais de 300 anos de conformação do espaço administrativo de Minas e das narrativas de estrangeiros cientistas-viajantes que se interessaram em conhecer, ordenar e registrar as paisagens dessa capitania, província e estado; paisagens natural e humana narradas a partir de vivências e memórias. Esse percurso de crítica a documentos cartorários, administrativos e a narrativas de viajantes ilumina uma leitura nova, de narrativas literárias que não apenas perscrutam os quintais, as mesas e os fogões, mas, com verticalidade, desvelam as memórias de gente cuidadosa com o gosto alimentar dos mineiros. A literatura tem se apegado, geralmente, a memórias afetivas dos autores encarnadas em seus personagens. Embora essas categorias de interpretações possam ser inventariadas e tipificadas, a pesquisa quer ir além: almeja confrontar o narrado e a transmissão da prática alimentar no tempo, ou seja, a tradição da comida, que incorpora mais mudanças que permanências, mais valores que preceitos, mais gostos que necessidades. Incorpora mais diálogos que apego a raízes. Indica um ethos.

Nesse sentido, a investigação perscruta os textos literários vendo-os como fatos sociais a perceberem uma Minas que, desde seu tempo colonial, “é portuguesa, mas não é Portugal”; tem na herança lusa um eixo importante, mas não rígido; na raiz ameríndia um alicerce aberto às levezas das sazonalidades; nas culturas africanas um baluarte essencial de cerne moldável, seguindo as várias culturas da África, que também nos colonizam e nos edificam. São culturas de saberes plurais, maleáveis e diversos. Sobretudo, em sua cozinha e práticas, Minas acrescenta a interrelação das regiões do Brasil, das migrações fronteiriças em busca da construção de riquezas. O processo histórico da cozinha mineira é marcado pelo trânsito inter-regional e pela receptividade fácil e comedida do outro.

A mesa dos mineiros narra Minas! Narra a construção de um gosto e conduz a inúmeros relatos que buscam sua compreensão. Compreendê-las – a mesa, a cozinha, a comida e suas narrativas – exige confrontar contradições, juntar texturas, aventurar-se sem a prioris, com argúcia crítica e desapego a modelos dados.

A confabulação mineira

José Miguel Wisnik

A confabulação mineira

O projeto Minas Mundo nos desafia a abordar as relações íntimas e avessas entre indivíduo e sociedade, sujeito e família, cultura e meio físico, localidade e nação, circunstância e universo, que se tramam em Minas Gerais.

N’ “O colóquio das estátuas”, Drummond vislumbra nos profetas do Aleijadinho uma espécie de figuração emblemática do modo mineiro de estar-no-mundo. Poder-se-ia conceber em outro lugar, pergunta ele, essa “reunião fantástica” em que profetas confabulam sem palavras, “entre cones de hematita”, mantendo “com o universo uma larga e filosófica interconexão”, senão nessa terra paradoxal em que “a febre grosseira” da mineração se transmuta em atmosferas místicas, e na qual a sabedoria pastoril converte-se na “loucura organizada, explosiva e contagiosa” das revoluções liberais?

Estão envolvidas nessa confabulação silenciosa a economia mineradora e agrária, a religião, a política, a arte e a indagação metafísica. Escrevi, em Maquinação do mundo – Drummond e a mineração, que esse texto pode ser lido considerando suas afinidades com “A máquina do mundo” e “Relógio do Rosário”, poemas escritos na mesma época que a crônica. E sugeri existir um diálogo de recados não intencionado entre “A máquina do mundo” e “O recado do morro” de Guimarães Rosa, textos em que os morros confabulam silenciosamente, e nos quais a geografia física e a geografia humana se mostram inseparáveis.

Confabular é “trocar ideias”, mas “em tom suspeito, misterioso ou secreto” além de “combinar, maquinar, tramar” (Houaiss). Ao mesmo tempo, “contar histórias fantasiosas como se verdadeiras fossem”. De algum modo, a trama semântica da palavra inclui o exercício político e a fabulação, no sentido mesmo de ficcionalização. Em outros termos, um rebatimento entre o político e o literário que não deixa de ser significativo do lugar simbólico ocupado por Minas no Brasil. A expressão “confabulação mineira” ecoa propositalmente “inconfidência mineira” – acontecimento histórico-político no qual o bastidor da “confidência”, isto é, do segredo e da intimidade, está latente. A propósito, é o poeta da “Confidência do itabirano” que diz expressamente que “só mineiros sabem”, e que “não dizem / nem a si mesmos o irrevelável segredo / chamado Minas”. Trata-se de procurar correspondentes histórico-sociais para essa costura de confabulação, in/confidência, segredo e recado, na sondagem das múltiplas dimensões que levaram à construção – aliás convincente – de Minas Gerais enquanto mundo.

Quando eu penso no futuro, não esqueço o meu passado: uma história do Suplemento Literário de Minas Gerais

João Pombo Barile

Quando eu penso no futuro, não esqueço o meu passado: uma história do Suplemento Literário de Minas Gerais

Este projeto tem como objetivo contar parte da história do Suplemento Literário de Minas Gerais (1966-1991) e sua relação com Murilo Rubião, fundador do jornal. Ao unir nomes já consagrados a autores iniciantes, Murilo conseguiu estabelecer um diálogo entre tradição e vanguarda. A ideia deste ensaio surgiu depois de muitas conversas com o escritor Silviano Santiago. E de um texto seu chamado “A permanência do discurso da tradição no modernismo”. A pesquisa se dividirá nas seguintes etapas:

I) A criação do Suplemento Literário

O SLMG, surgido em setembro de 1966, retomou uma antiga tradição do Diário Oficial do Minas Gerais, que sempre teve uma seção noticiosa de literatura. Vou contar um pouco dessa história e do surgimento da chamada Geração Suplemento. Esta parte irá de setembro de 1966, quando o jornal é fundado, até a perseguição que o escritor e crítico Rui Mourão sofreu dos militares, em 1970.

II) O velho e o novo

Esta parte vai compilar a série de depoimentos, “O escritor mineiro quando jovem”, que mais tarde teria matérias para escritores de outros estados. Além disso, serão listadas, e analisadas, as traduções feitas no período por escritores como Sérgio Sant’Anna e Jaime Prado Gouvêa. Esta parte da pesquisa conta como Ângelo Oswaldo, com apenas 23 anos de idade, se tornaria diretor de redação e abriria o jornal para outras áreas além da literatura: música, cinema e artes plásticas.

III) A censura no Suplemento

Aqui vou analisar o período em que o escritor Mário Garcia de Paiva dirigiu a redação. Junto com a crítica literária Maria Luiza Ramos, analisarei o episódio de censura sofrido pelo periódico quando um número especial, uma amostra do Conto Brasileiro Atual (24 textos de ficção), foi mutilado pela censura. Vamos mostrar como jornalistas se mobilizaram para denunciar a censura que o Suplemento estava sofrendo.

IV) A abertura política

Na última etapa analisarei o período em que Wander Piroli esteve no comando e sua renúncia. Vou mostrar como Wander inovou na diagramação e parte visual do jornal, publicando literatura de cordel e abrindo espaço aos escritores que eram abertamente contra o regime militar.

Por fim, pretendo estudar o período final da vida de Murilo Rubião, quando o contista, ao ser nomeado diretor de Imprensa Oficial por Tancredo Neves em 1982, irá promover uma nova revolução no jornal.

Trajetória Vianna: caminhos de Klauss e Angel Vianna na dança brasileira

Joana Ribeiro da Silva Tavares

Trajetória Vianna: caminhos de Klauss e Angel Vianna na dança brasileira

Iniciada no meio do balé clássico e da dança moderna, nos anos 1950, em Belo Horizonte, Minas Gerais, a trajetória do casal de bailarinos mineiros Angel (1928) e Klauss Vianna (1928-1992) expandiu-se para diversos terrenos como a dança contemporânea, o teatro, a música, a educação somática e o campo da saúde. A partir de uma frase que Klauss Vianna costumava dizer em seus cursos, ao se referir ao ato de dançar – “não decore passos, aprenda um caminho” – seguiremos a trajetória do casal Vianna percorrendo as capitais em que estabeleceram moradia: Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo (com um breve período em Salvador). Nos dias de hoje, o trabalho corporal dos Vianna figura tanto na Escola e Faculdade Angel Vianna, no Rio de Janeiro, quanto através de obras artísticas, práticas corporais, cursos e publicações no Brasil e no estrangeiro. Mapear a trajetória da obra capital de Klauss e Angel Vianna, destacar seus principais pontos de ancoragem e identificar suas reverberações traz para o centro da discussão um projeto pioneiro, originalmente moderno e interdisciplinar, cujas raízes mineiras emergem em contínuo movimento na história da dança brasileira.

Mário de Andrade e narrativas sobre Reis e Rainhas de uma África mineira

Joana Ramalho Ortigão Corrêa

Mário de Andrade e narrativas sobre Reis e Rainhas de uma África mineira

A paixão de Mário de Andrade pela cultura popular e pelo folclore, e também seu ímpeto em viajar ao encontro de suas fontes primárias, constituíram traços marcantes dos desdobramentos do modernismo brasileiro. A mata-virgem, onde nasceu seu herói Macunaíma em 1928, tornou-se, nos anos seguintes, protagonista de um cuidadoso labor de decifração, estimulado pela certeza do vigor original que confrontava a desbotada condição colonial. Neste estudo, proponho elucidar as perspectivas de Mário de Andrade na busca de traços da presença africana no Brasil, diluídos e ressignificados no bojo da nacionalidade tupiniquim, a partir de suas pesquisas sobre os Congos e as narrativas míticas e históricas dramatizadas pelas cortes festivas de reis e rainhas negras, especialmente em Minas Gerais, onde descendentes de um grande contingente de povos centro-africanos escravizados perpetuaram uma extensa tradição de Festas de Reinado.

Proponho percorrer os caminhos investigativos de Mário de Andrade sobre os Reinados negros e a presença de sua obra nos estudos que o seguiram para compreender o cosmopolitismo mineiro a partir das narrativas literárias e orais sobre a africanidade e os heróis negros que desafiam a temporalidade histórica. O estudo inaugural de Mário de Andrade sobre os Congos – uma série de cinco artigos em sua coluna de música no Diário de S. Paulo publicados em 1934 posteriormente integrados em texto único e incluídos postumamente por Oneyda Alvarenga na edição de Danças dramáticas do Brasil – é uma chave fundamental para compreendermos na tradição narrativa literária, nos estudos de folclore e na oralidade popular afro-mineira o papel simbólico de heróis míticos como a Rainha Ginga de Angola e o africano Rei Galanga, consagrado como Chico Rei de Ouro Preto. Se a moderna tradição mineira é constituída por relações indissolúveis entre presente e passado, à afro-mineiridade acrescenta-se a continuidade espacial entre terras guardadas por montanhas e uma África atemporal, magicamente conectadas por travessias calungas. Reis Congos e Rainhas Gingas das embaixadas e danças populares são elos de continuidade que borram o tempo, criando um nebuloso conjunto dramático de personagens míticas, literárias e históricas.

Três poetas árcades

Heloisa Starling

Três poetas árcades

A proposta tem por objetivo formular um tema diretamente vinculado ao conceito de cosmopolitismo em Minas Gerais para investigação e debate no grupo de pesquisa Minas Mundo. O tipo de trabalho que pretendo desenvolver busca analisar a questão do localismo/cosmopolitismo da cultura em Minas retomando a atuação política e a produção literária de três poetas que alteraram de maneira decisiva a linguagem política e literária na América portuguesa, durante a segunda metade do século XVIII: Manoel Inácio da Silva Alvarenga, Cláudio Manoel da Costa e Tomás Antonio Gonzaga. O cosmopolitismo é a matéria de composição desse repertório e decorre tanto da atração para o local quando da sua combinação com o que veio de fora. As ideias circulavam, foram submetidas a considerações de ordem prática, e puderam ser selecionadas, reinterpretadas e transformadas em uma linguagem política. No limite, três poetas acenderam o pavio da Conjuração – nas Minas, em 1789; no Rio de Janeiro, em 1794.

Um mineiro d’além mar: D. Antônio Ferreira Viçoso

Helga Gahyva

Um mineiro d’além mar: D. Antônio Ferreira Viçoso

Os estudos sobre o processo de reforma da Igreja Católica durante o Segundo Império concedem lugar de destaque a D. Viçoso. Afinal, ordenado bispo de Mariana, transformou o Colégio do Caraça em novo modelo de seminário episcopal. Sob orientação dos moldes tridentinos, tanto funcionou como inspiração para a fundação de outras instituições religiosas, quanto formou importantes nomes do clero ultramontano brasileiro.

Nascido na península portuguesa de Peniche, em 1787, o vicentino Antônio Ferreira Viçoso chegou ao país em 1819, junto com o padre Leandro Rebelo e Castro, atendendo a convite de D. João VI para missionar entre indígenas do Mato Grosso. Essa tarefa, contudo, acabou a cargo dos capuchinhos, e novos planos o levaram, inicialmente, à breve período no Caraça, de onde foi deslocado para o Seminário do Jacuecanga, no Rio de Janeiro. Na aurora dos anos 1840, estava já o futuro conde da Conceição de volta ao seminário mineiro. Alçado ao bispado de Mariana em 1844, ele permaneceu no cargo até sua morte, em 1875.

Durante esse período, empenhou-se ativamente em conferir feições ultramontanas a um clero outrora majoritariamente regalista. Mas, se não é contestada sua relevância para o movimento reformador, pode-se discernir pelo menos três conjuntos de interpretações sobre a sua obra.

Em primeiro lugar, aquela produzida por membros da Igreja, caracterizada por teor marcadamente apologético. Destaca-se, dentre tais obras, a primeira biografia de D. Viçoso, escrita por D. Silvério Pimenta, seu sucessor, em 1876.

A partir dos anos 1970, solidificou-se visão, elaborada por autores vinculados à Comissão de Estudos de História da Igreja na América Latina (CEHILA), segundo a qual teria sido o bispo agente local do processo de “romanização” conduzido pelo Vaticano. Nessa chave, D. Viçoso surge como fiel seguidor das orientações do papa Pio IX. Tal abordagem encontra-se tanto em várias das publicações editadas pelo órgão, quanto nas páginas da Revista Eclesiástica Brasileira (REB).

Nas primeiras décadas do século XXI, por sua vez, despontaram perspectivas alternativas, gestadas no meio acadêmico, preocupadas em perceber menos a cega obediência dos padres reformadores brasileiros à Cúria Romana do que os tensos e pouco lineares processos por meio dos quais a agenda ultramontana foi apropriada pelo clero nacional. Por esse prisma, revelam-se motivações múltiplas sob as ações de D. Viçoso.

Nosso objetivo consistirá em mapear e discutir esses diversos pontos de vista aos quais deu ensejo a atuação do bispo de Mariana. Cremos que a tarefa será capaz de oferecer pistas para pensar as relações entre cosmopolitismo e localismo na cultura brasileira, questão geral subjacente ao projeto Minas Mundo.

Intelectuais e América Latina: Darcy Ribeiro e a interação do Brasil com América Latina

Helena Bomeny

Intelectuais e América Latina: Darcy Ribeiro e a interação do Brasil com América Latina

O projeto busca analisar a posição de Darcy no quadro geral de intelectuais de sua geração e cotejar sua interpretação com a defendida por Richard Morse a respeito das Américas, do Norte e do Sul. O ponto a ser realçado é a originalidade de Darcy com relação aos intelectuais brasileiros na conexão que cultivou com América Latina. Darcy se separava de sua geração em duas dimensões. A escrita mais literária – que o aproxima de Richard Morse –, o que abriu frente de embate com intelectuais empenhados na institucionalização das Ciências Sociais no Brasil; e a interlocução permanente com a América Latina que, como Morse, via em chave não negativa ou inferior, mas própria a exigir qualificação mais depurada. Esse posicionamento fez de Darcy Ribeiro um intelectual distinto da própria tradição de cientistas sociais de Minas Gerais, empenhados, em grande monta, com os processos de institucionalização das Ciências Sociais em moldes metodologicamente defendidos como mais “rigorosos”, mais afeitos à tradição norte-americana de desenvolvimento científico e acadêmico.

Transitando entre esferas: ação política e pensamento antiliberal em Francisco Campos

Gabriela Nunes Ferreira

Transitando entre esferas: ação política e pensamento antiliberal em Francisco Campos

A pesquisa proposta tem como objeto a trajetória e o pensamento político do jurista mineiro Francisco Campos (1891-1968) durante as décadas de 1920 e 1930. Formado em Direito na Faculdade Livre de Direito, em Belo Horizonte, em 1919 ingressou na política como deputado estadual nas fileiras do tradicional PRM, muito ligado ao então governador do estado, Artur Bernardes. Em seguida, como deputado federal durante a presidência de Artur Bernardes, esteve empenhado na aprovação de medidas que ampliassem os poderes do Executivo nacional contra ameaças à ordem, como por exemplo aquela representada pelo movimento tenentista. De 1926 a 1930, como secretário do Interior do governador Antônio Carlos, foi responsável por uma ampla reforma do ensino inspirada nos postulados da Escola Nova.  Esteve ligado ao Estado varguista desde o seu nascedouro, participando da conspiração para a Revolução de 1930 e, logo depois, assumindo o recém-criado Ministério da Educação e da Saúde Pública. Continuou tendo influência na política mineira – notadamente pela criação da Legião de Outubro, por meio da qual buscou minar as bases de seu antigo partido, o PRM. Muito erudito e admirador de pensadores e constitucionalistas antiliberais do exterior em voga, foi um dos principais articuladores da instituição do Estado Novo e, como ministro da Justiça, responsável pela redação da Constituição de 1937. No final do regime varguista, tornou-se crítico do regime e participou da conspiração que levaria à queda de Getúlio Vargas. Quase 20 anos depois, teria ainda participação na arquitetura institucional do regime de 1964, redigindo o Ato Institucional n.2.

Uma rápida olhada na trajetória de “Chico Ciência”, como era apelidado, deixa entrever aparentes contradições: com uma origem política ligada ao poder oligárquico mineiro, foi um dos principais ideólogos do regime que buscou sufocar o poder das oligarquias estaduais. Reformador do ensino inspirado nos princípios da Escola Nova, foi o responsável pelo fechamento da Universidade do Distrito Federal, criada por Anísio Teixeira, às vésperas da instituição do Estado Novo. Ideólogo do Estado Novo, conspirou pela sua derrubada quando o tempo dos regimes autoritários e totalitários parecia se esgotar.

Talvez o sentido dessas aparentes contradições fique mais claro se procurarmos apreender a racionalidade política de Francisco Campos a partir de uma característica de sua trajetória política e intelectual: o fato de ter sido construída no trânsito, e no entrecruzamento, entre três esferas de poder e influência – a local (mineira), a nacional e a internacional.  O objetivo da pesquisa será analisar aspectos do pensamento e da ação política de Francisco Campos à luz dessa característica.

Uma Minas mundo negra

Flávio dos Santos Gomes e Lilia Moritz Schwarcz

Uma Minas mundo negra

Este projeto pretende explorar uma hipótese em dois tempos: nos tempos da escravidão e nos tempos do pós-abolição. A hipótese é que, durante muito tempo, Minas tornou sua população negra invisível, como se fosse uma província e depois um estado basicamente “branco”. Ou melhor, não é correto dizer que Minas produziu uma representação branca, mas ela era, com certeza, “não negra”. Minas não era negra como a Bahia e o Nordeste, mas também não era branca como o Sul e o Sudeste da imigração europeia. Ao que tudo indica, em Minas aproveitou-se do crescimento da representação de uma “Bahia negra”. Paradoxalmente, a África no Brasil estaria demograficamente mais concentrada na Província das Minas Gerais, pelo menos durante os séculos XVIII e XIX. As paisagens mineiras da segunda metade do XVIII ficariam marcadas pelas grandes imigrações da década de 1740 a 1770, quando entram maciçamente africanos centrais e, pós 1769, do Sul de Angola. Esses dois grupos africanos, e as primeiras gerações de crioulos, filhos desses primeiros imigrantes já nascidos no Brasil, protagonizariam várias revoltas –1720, 1723, 1756 e 1790 – cujos planos foram descobertos, justamente, por conta das tensões entre grupos Minas, da África Setentrional, e Angolas, da África Central. Com a abertura de novas fronteiras econômicas de produção de alimentos e depois a entrada do café, percebe-se, já no século XIX, grande presença africana, inclusive advindas das regiões Orientais – os chamados Moçambiques. Enfim, a essas alturas, demograficamente falando, Minas era tanto ou mais africana que a Bahia, mas permaneceu descolorida nos imaginários nacionais do século XIX e do pós-abolição.
Essa população estaria presente nas fotografias de dois profissionais mineiros. Nos referimos a Chichico Alckmin (Diamantina, 1886-1978) e Assis Horta (Diamantina, 1918 – Belo Horizonte, 2018). Horta imortalizou o patrimônio arquitetônico e a sociedade de Diamantina. Mas sua carreira ganhou outro destino em 1943, com a consolidação das Leis do Trabalho. Ao tornar obrigatória a carteira profissional, com a foto 3X4, a medida teve como consequência levar a classe trabalhadora para dentro do estúdio fotográfico. Já Alckmin, fotografou indivíduos, grupos animados, todos negros, muitos bem apresentados com seus vestidos armados, ternos bem cortados e sapatos lustrados. Mais do que interioranos, eles se mostravam como cosmopolitas e conectados com outras elites negras. Esse processo de invisibilidade e visibilidade das populações negras mineiras é, pois, texto e pretexto desse projeto a quatro mãos.

Sociologia mineira e sua aposta na empiria

Celi Scalon, André Junqueira Caetano e Fernando Tavares Jr.

Sociologia mineira e sua aposta na empiria

Tanto sertaneja quanto cosmopolita, Minas se constituiu em entreposto de uma nação que se formava, com culturas migrantes de diferentes cantos de um país continental, integrando ciclos agrícolas, mineradores, industriais, comerciais, intelectuais e culturais. Assim foi também na sociologia. Para a sociologia das desigualdades e estratificação no Brasil, muito se desenvolveu nas, a partir das e com as Gerais. Se suas serras alterosas revelam contrastes, suas formações e transformações sociais os refletem. Um eixo relevante nessa formação é a contribuição da produção sociológica mineira para o desenvolvimento do diálogo de ensaios e teses acerca da formação do Brasil com uma nova pesquisa com raízes empíricas e largo uso de métodos quantitativos. A reflexão sobre o Brasil ganhava números, amparos estatísticos, dados robustos e um vasto lastro na observação de cotidianos contrastantes em larga escala. Devemos a Minas Gerais uma significativa contribuição para o desenvolvimento de pesquisas de surveys; investigações comparativas; modelos com inferência regional, nacional e internacional; ciências sociais aplicadas e a abertura do cenário brasileiro a novos métodos, técnicas e instrumentos empíricos.

Nesse diálogo, observa-se também o traço do cosmopolitismo mineiro ao se constatar que, ontologicamente, Minas revela-se como um resumo do Brasil e o Brasil se encontra, ou se redescobre, em Minas. Minas sempre acolheu grupos e fluxos migratórios de diferentes regiões, também por ocupar posição geográfica, política e econômica que tangia tais movimentos: do Nordeste ao Sudeste, da antiga capital à nova, da “República do café com leite” à “Nova República”. As múltiplas regiões de Minas refletem características de suas fronteiras. O Sul de Minas assemelha-se a São Paulo. O Norte, ao Nordeste do país. O Triângulo lembra o Centro-Oeste e o Sertão reflete a nova fronteira agrícola. Contrastes também em suas cidades, com centros densamente forjados, como a capital; muitas áreas rurais e pouco povoadas; além de várias importantes cidades de médio porte, que operam como “capitais regionais”. Somam-se desigualdades econômicas e sociais profundas, como o pobre Vale do Jequitinhonha, com indicadores entre os menos desenvolvidos do país, à afluência econômica agrícola do Triângulo, além de outras tantas cidades e microrregiões que estão entre aquelas com maior IDH do país. Estudar e compreender Minas Gerais permite vislumbrar sinteticamente processos em curso no conjunto do país, como migrações, diminuição/elevação de desigualdades, entre outros com relevância para políticas públicas.

Esse traço revela características da sociologia desenvolvida nesses contextos, baseada na mobilização de suporte empírico para, junto das tradições do pensamento social, desenvolver uma sociologia aplicada com relevância e destaque internacional. Assim ocorreu em áreas de pesquisa como violência, avaliação e gestão da educação, ciência política e pesquisas eleitorais, além da sociologia e economia rurais. Alguns dos mais importantes centros de pesquisa social no Brasil nasceram assim e se tornaram referência para o diálogo com a sociologia no mundo, como o CEDEPLAR, o CAEd, o CRISP, além dos centros e departamentos em Viçosa e Lavras, dedicados à sociologia rural, e outros núcleos que se internacionalizaram como porta-vozes de uma reflexão nacional, feita a partir de larga empiria e profundo conhecimento local.

A partir dessa reflexão, apresentamos duas propostas:

1) Análise quantitativa de dados socioeconômicos, populacionais e de comportamento político, que demonstrem como os resultados obtidos para o estado de Minas Gerais refletem aqueles esperados para o país, indicando, assim, que Minas Gerais pode ser vista como uma “proxy” do Brasil. Neste caso, propomos focar em alguns tópicos relativos à área de estratificação e desigualdades, como educação, padrão de vida, juventude, além de comportamento político. Para tanto, serão utilizados modelos estatísticos.

2) Pesquisa qualitativa com um grupo de sociólogos mineiros que tiveram formação nos EUA e foram responsáveis pela “sociologia empírica” – uma marca da sociologia praticada em Minas –, e que, ao migrarem para diversos estados, consolidaram um fazer sociológico em todo o país. Alguns nomes considerados neste momento são: Simon Schwartzman, Olavo Brasil de Lima Junior, Renato Boschi, Elisa Reis, Bolívar Lamounier e Vilmar Faria. Contemplaremos também a criação do Curso de Métodos Quantitativos, que se estabelece na UFMG sob a liderança de Neuma Aguiar e de dois sociólogos de outra geração que vieram do Recife para a UFMG: Daniele Cireno e Jorge Alexandre. A metodologia adotada será de entrevistas em profundidade diretamente com os pesquisadores citados. Para acessar informações sobre Vilmar Faria e Olavo Brasil de Lima Júnior, propomos entrevistar Fernando Henrique Cardoso e Renato Boschi, respectivamente. Os nomes não se esgotam nos apontados aqui, uma vez que a técnica de snowball permite que novos atores surjam no decorrer das entrevistas.