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Pessoas

O pensamento visual de Humberto Mauro

Anderson Ricardo Trevisan

O pensamento visual de Humberto Mauro

Esta pesquisa se propõe a analisar alguns filmes realizados pelo diretor mineiro Humberto Mauro dentro do Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE), criado em 1936 no Rio de Janeiro por Gustavo Capanema. Nesse espaço foram produzidos cerca de 400 filmes educativos, dos quais mais de 300 traziam a assinatura de Mauro sobre os mais variados temas, como ciência, educação rural, personagens históricos, músicas folclóricas, literatura etc. Nesse vasto universo temático, temos a um só tempo o olhar pitoresco, que nos remete à vida rural, e o olhar da ciência, que visava mostrar o progresso e a modernização tecnológica, valores caros às políticas do Estado Novo. Os filmes de Mauro oscilam entre a tradição e o moderno, algo não estranho ao movimento modernista de 1930, que era fomentado pelo Estado e vinculado à busca das “raízes” da nacionalidade brasileira. Em uma época em que artistas eram enviados para Minas Gerais à procura de tais raízes, Mauro já vinha pronto nesse sentido, e seus filmes podem ser reveladores dessa estrutura de sentimento. É apressado, porém, rotulá-lo de modernista, muito menos nos moldes do modernismo mineiro da Revista Verde. Isso porque o cinema produzido por Mauro é carregado de ambiguidade e complexidade, como se fosse o elo entre dois mundos distintos: o da tradição, marcado pelo mundo rural, e o moderno, vinculado ao progresso e à ciência. Talvez ele seja um bom representante desse modernismo dos anos 1930, também ele pleno de ambiguidades. No entanto, na base dessa ambiguidade está o interesse em construir visualmente uma nação, algo que também podia ser percebido, respeitadas as proporções, em diversos países da Europa e América do Norte que, na mesma época, viam no cinema educativo um modo de fortalecer o sentimento cívico e o nacionalismo. Concebidos a partir dessa ideia, os filmes de Mauro podem ser lidos como parte do pensamento social brasileiro, construídos em termos de um pensamento visual (para lembrar Pierre Francastel, A realidade figurativa), e é nessa chave que pretendo analisá-los. Para tanto, minha contribuição ao projeto coletivo será investigar o modo como se dá essa relação entre o tradicional e o moderno e, particularmente, a noção de progresso que se constrói a partir dos filmes de Mauro, especialmente os de divulgação científica e os de educação rural. Em tempos como o nosso, em que há uma negação da história e do conhecimento científico e uma fragilização da própria democracia, é relevante tentar compreender como, a partir das investidas de um Estado totalitário, isso era um valor.

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